Capítulo Único

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O sol estava se pondo, desaparecendo no horizonte por trás da silhueta de altas árvores, e banhando tudo que sua luz ainda alcançava em um bonito tom de alaranjado.

Em meio as árvores, havia uma pequena vila, com pequenas e simples casas de madeira, que se erguiam ao redor de um grande círculo de concreto cravado na terra. Sobre o círculo havia uma garota, que não deveria ser mais velha do que 12 anos, com longos cabelos ondulados tão negros quanto a própria escuridão, de pele bronzeada e olhos brancos luminosos, com pequenos chifres escuros e uma longa cauda que se findava com um ferrão de escorpião vermelho.

Ela vagava pela área de concreto, ocasionalmente chutando algumas pequenas pedras soltas e girando enquanto levantava a barra do longo vestido branco que usava. Ela parecia estar matando tempo ali, esperando por algo que viria a acontecer mais tarde.

Sem muita demora, a porta de uma das casas se abriu, e correndo dela veio um garoto. Ele aparentava ter a mesma idade que a menina, com cabelos lisos castanho escuros que chegavam até os ombros e olhos completamente negros. Assim como ela, o garoto tinha um par de chifres, mas esses eram um pouco maiores, já começando a se encurvar nas laterais de sua cabeça, e uma longa cauda, que tinha a ponta em formato de flecha.

Eles sorriram um para o outro, se cumprimentando animadamente, e de forma rápida engajaram em uma brincadeira de pega-pega, que foi aumentando de número conforme mais crianças saiam de suas casas.

Quando a vila toda estava mergulhada na escuridão, os adultos finalmente apareceram, carregando tochas de fogo azulado que usaram para acender grandes piras ao redor do circulo de concreto. As crianças foram chamadas, assistindo maravilhadas ao lado de seus pais enquanto um homem com longas vestes brancas começava a dançar no centro do círculo, acompanhando a melodia de palmas e cântico em uníssono que a vila inteira entoava.

Quando a dança chegou ao fim, uma adaga foi passada ao homem, com cabo dourado e uma lâmina esbranquiçada, quase transparente. Com o item em mãos, ele fez cortes em ambos os braços, usando o sangue para desenhar um símbolo no chão enquanto suas roupas lentamente se tornavam vermelhas. Mas antes que o desenho fosse terminado, um som veio do meio das árvores, alto e estrondoso, assustando a todos.

Do lado da garota de cabelos negros um adulto caiu, sangue manchando as roupas brancas e olhos sem brilho, sem vida. A menina gritou, sendo acompanhada por outros, adultos e crianças, e então tudo era caos.

Mais um estouro ecoou de entre as árvores e o dançarino, que tentava apressadamente terminar o símbolo, caiu, suas vestes terminando de ser manchadas em vermelho.

Adultos corriam, puxando e pegando crianças no colo, mas cada vez mais estouros vinham, e então mais crianças acabavam sozinhas no meio da bagunça.

A menina de cabelos negros também corria, sem saber para onde ir ou o que fazer, dando voltas ao redor das casas e tentando se esconder do que quer que houvesse escondido na escuridão das árvores. Mas ao ver o garoto de cabelos castanhos carregando um menino bem menor e puxando uma outra pequena garota pela mão, ela decidiu ajudar, mesmo que isso colocasse a própria vida em risco.

Ela correu em direção a eles, mas a poucos passos de distância um braço se enlaçou em sua cintura, suspendendo-a no ar e prendendo-a contra um corpo muito maior. Ela gritou, tentando usar o ferrão de escorpião e morder, mas a pessoa usava roupas negras muito resistentes, e ela acabou apenas podendo espernear e empurrar com todas as forças que tinha. Mas seus esforços foram em vão quando, no final, tanto ela quanto as outras três crianças acabaram sendo pegas, levados com sacos de pano obstruindo suas visões e mãos atadas atrás das costas.

Quando finalmente soltaram-na e ela podia ver novamente, a menina se encontrava em uma comprida sala de metal, com beliches lotando as paredes, e as outras três crianças ali, tão assustadas e confusas quanto ela. O garoto mais pequeno, que não devia ter mais do que três anos, rapidamente começou a chorar, seus gritos altos ecoando pelo local metálico e deixando a outra pequena garota também a ponto de chorar.

A menina mais velha mordeu o lábio inferior, olhando ao redor enquanto sentia o coração bater tão forte que quase a ensurdecia. Não havia nada na sala, nada que ela pudesse usar para abrir a única porta do local, apenas camas. Mas de repente uma ideia surgiu em sua cabeça, flashes do homem de branco dançando, em várias ocasiões diferentes, com vários símbolos diferentes sendo desenhados no final surgindo em sua mente.

Ela olhou para a pequena garota. A pele negra estava arranhada em alguns lugares, os cabelos escuros antes presos em marias-chiquinhas agora desgrenhados e rastros de lágrimas nas bochechas enquanto ela fechava as pequenas mãos com força.

- Taylor. – A mais velha chamou, quase em um sussurro. – Vai ficar tudo bem, ok? Eu vou tirar a gente daqui, mas eu preciso que você me ajude com uma coisa. – Vendo a garotinha concordar com a cabeça, ela continuou, forçando um pequeno sorriso. – Eu preciso que você acalme o Lucian e dê um abraço bem apertado nele, ok?

Taylor concordou com a cabeça mais uma vez, indo em direção ao garotinho enquanto fungava. A menina mais velha então se virou para o outro garoto na sala. Ele apenas encarava uma das paredes, sem expressão alguma, com alguns fios castanhos caindo sobre o rosto. Ela colocou as mãos nos ombros dele, olhando nos fundos dos olhos negros, e o balançou.

- James. – Ela tentou, mas o garoto apenas encarava de volta, sua mente em outro lugar. – James!

O menino olhou para ela assustado, lágrimas se formando nos cantos dos olhos.

- James, foca em mim, ok? – Ela começou e ele lentamente concordou com a cabeça. – Eu vou tirar a gente daqui, mas eu preciso da sua ajuda, entendeu?

Mais uma vez ele concordou com a cabeça e ela sorriu para ele, pegando-o pela mão e levando até uma parte da sala onde havia mais espaço entre as camas.

- Se eu não conseguir, então eu vou precisar que você termine o símbolo por mim, ok? – A mais velha perguntou retoricamente, já enrolando uma das mangas do vestido.

James abriu a boca para questionar, mas antes que qualquer som saísse, ele foi interrompido pelo grito abafado e dolorido que a menina mais velha soltou. Ela tinha cravado os dentes afiados no próprio braço, o sangue escorrendo pelo mesmo e pelo queixo dela.

Com respirações curtas e profundas, ela afastou a boca do local sangrento, levando a outra mão e sujando os dedos no sangue, para então se ajoelhar sobre o chão metálico e começar a desenhar um símbolo. Ela não tinha a menor ideia do que estava desenhando, misturando partes dos símbolos que lembrava em um amalgamado que parecesse minimamente certo.

Quando a última linha foi conectada, as luzes da sala piscaram e um cheiro ruim tomou conta do lugar. As sombras das camas começaram a se mexer, se soltando de seus lugares e se transformando em fumaça negra, que viajou pelo quarto até alcançar o centro do símbolo, se condensando em uma silhueta gigantesca. Era como a sombra de um enorme cão, com orelhas pontudas e cauda fina, seu olhos sendo apenas dois pontos vermelhos brilhantes.

A menina encarou boquiaberta a grande criatura, totalmente congelada no lugar por alguns segundos, até que os olhos do animal se focaram nela e uma pergunta se formou no fundo de sua mente. Ela levantou, encarando o cão nos olhos tão fortemente quanto ele a encarava, e mexeu os lábios em uma resposta sussurrada inaudível.

O cão negro rosnou, o som saindo abafado de dentro de seu peito, e bufou, fumaça vermelha saindo de onde seria seu focinho e se dissipando rapidamente no ar.

O pacto estava selado.

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⏰ Última atualização: Feb 16, 2022 ⏰

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