SÉRGIO
Eu definitivamente ia cortar as sobremesas do Will. Esquecer de contar que foi atacado por Dionísio e nos deixar tentar invocar ele e, pior, colocando a Mynara em risco? No fim dessa missão, eu juro que ele pagará caro.
Me voltei para o homem alto e loiro sentado confortavelmente no puff e apontei a adaga de bronze para ele.
— Pelos deuses, quem é você e o que fez com ela? — apertei com força o corpo inerte da minha irmã no meu colo.
— Não sei como minha mãe gosta de você... Lhe falta cortesia para tratar sua família divina... E sobre a sacerdotisa... Ela usou muito poder para me trazer, ela deve ficar bem após algum descanso. Agora... quem eu sou? Sou o tenente e filho de Dionísio, Estáfilo.
Will estalou a língua e falou com um tom de deboche:
— O que o menino de recados do nosso querido papai veio fazer aqui? O velho gorducho está ocupado demais para descer do troninho dele e vir dar as caras, para eu arrebentar ele?
Os olhos do deus faiscaram e a taça na mão sumiu, dando lugar a uma bola de chamas roxas. Um tom duro e frio surgiu na voz.
— Cuidado, moleque. Mesmo que seja necessário para a missão, você pode acabar sofrendo bastante em minhas mãos... Agradeça que seja eu a estar aqui... Se fosse nosso pai agora, no estado em que ele está...
Eu precisava mudar o rumo da conversa. Sabia que o Will era habilidoso em irritar os deuses. Limpei a garganta e cortei a discussão:
— Respostas, você veio trazer respostas sobre nossa missão, certo, Lorde Estáfilo?
Ele me olhou e o brilho assassino diminuiu, a bola de fogo voltou a ser a taça de vinho e a postura do deus relaxou.
— Exatamente. Por meios tradicionais, eu não poderia dar informações nem conselhos, mas já que vocês me invocaram e aceitei o tributo, posso fazer algumas coisas.
Ele virou a taça em sua boca e a desfez no ar. Puxou do bolso um artefato preto reluzente, que lembrava um celular, fez alguns gestos e, como se fizesse uma lista de afazeres, murmurava para si algumas frases rápidas em grego antigo. Ao fim, guardou o iPhone de volta no bolso e, com um sorriso largo, disse:
— Bom, sua missão vai começar e, como me pediram informações, as darei: 1°) vão ao museu de história natural, achem o tirso de nosso pai e o roubem. 2º) recuperem a coroa de vinhas e não morram pelos acólitos temporais. 3º) acaso conseguirem continuar vivos... Não destruam o mundo deixando o bastardo egípcio pegar o cálice de Dionísio.
Ele disse isso e nem tive tempo de processar as informações quando a névoa roxa que afundara no chão parecia estar voltando. O deus olhou para o chão e disse:
— Meu tempo está acabando, ainda tenho um presente para o irmão revoltado e para a sacerdotisa... — ele ia puxar algo do bolso novamente, mas parou e inclinou a cabeça como se ouvisse uma voz e deu uma risada. — Semideuses sortudos, além dos presentes, ainda terão carona? Na minha época de semideus, não era tão fácil...
Will reagiu primeiro.
— Espera aí, explique melhor o que raios são esses alcoólicos e que carona é essa...
O deus apenas sorriu e moveu a mão. Will, que avançava para ele, foi dissolvido em uma nuvem roxa. Eu quis gritar, mas a garganta travou e, com a Mynara no colo, não pude sequer levantar, só pude observar e ouvir o deus falar enquanto movia a mão:
— Espero que tenha sucesso na missão, para o bem de nosso pai e do mundo.
Então a minha visão se tornou inteiramente roxa e meu corpo perdeu a sensação de peso enquanto minha consciência se esvaía.
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Contos de Natal no Acampamento Meio-Sangue
FantasiO natal está se aproximando e coisas estranhas começam a acontecer no Acampamento Meio-Sangue. Os morangos estão morrendo, apesar das condições controladas de temperatura e clima, e nem os poderes dos filhos de Deméter e Dionísio conseguem salvá-los...