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Por onde começar?! Acho que posso começar me apresentando.
Bom, meu nome é Emma, tenho 15 anos e sou a capitã das líderes de torcida do colégio... Não, estou brincando, meu nome não é Emma, mas pode me chamar como preferir, tenho 15 anos mesmo, mas ao contrário do que disse, não sou e nem pretendo ser capitã das líderes de torcida. Esse livro não vai ser um daqueles em que a mocinha conhece um cara e gato e misterioso no colégio ou coisa do tipo, pode até ser, mas como em toda vida tem reviravoltas, essa não é diferente.
Vou começar a contar desde o primeiro dia de aula, então sente que lá vem história!
Tudo começou numa segunda feira, se me recordo bem, primeiro dia na escola nova, apesar de não ser o início das aulas.
Até que fui bem, levando em conta que só ganhei um apelido. Entrei na sala e sentei no fundo, mais fácil das pessoas não me notarem e os professores não me chamarem, os veteranos sentam em grupo, então fiquei de fora. Ah, claro, me esqueci de dizer como sou. Tenho olhos castanhos, cabelo não tão comprido, um pouco abaixo do ombro, não sou alta, na verdade, não chego nem a altura do pessoal da minha sala, uso óculos e sempre estou acompanhada por um livro. E acho que é isso. Voltando para sala...
Sentei na fileira da parede, assim era mais fácil de ninguém me incomodar, na minha frente sentou uma garota, aquelas em que só ficam falando na viagem cara que fez nas férias, e do meu lado sentou um garoto, nem era tão bonito assim, mas me chamou a atenção. Olhos azuis, óculos um pouco grandes, cabelos negros molhados caindo sobre as sobrancelhas. A princípio não o notei muito, mas aos poucos fui reparando os pequenos detalhes, fiquei mexendo na página do meu livro, quando notei que ele estava me olhando, nos encaramos por um tempo, até um dos professores, receio eu que era o de matemática, me tirar do momento observadora.
- Temos uma aluna nova, quer se apresentar à sala? - Ele se dirigiu à mim.
- Não, obrigada. - A sala deu uma risada controlada e eu dei um sorriso tentando ser gentil.
- Tudo bem então. - O professor falou e voltou para o seu discurso de "como as coisas são diferentes nesses últimos anos de aula". Quando olhei de volta para minha mesa, meu livro não estava lá.
- É um ótimo livro, um dos meus preferidos. - Ah, só pode ser brincadeira! O carinha de olhos azuis falando comigo? Deixa eu me beliscar para ter certeza que não é sonho. - Ah, desculpa. - Ele estendeu a mão. - Me chamo Patrick, mas pode me chamar de Pat se quiser, contanto que não me chame de quatro olhos está tudo bem. - Ele deu um sorriso, e não é que fiquei sem palavras? - E você é... ?! - Ele arqueou as sobrancelhas e me devolveu o livro, cruzando os braços em seguida.
- Hum... É... - Achou que eu iria falar meu nome, não é?! Pobre de você, caro leitor. - Pode me chamar de Emma. Prazer em conhecê-lo, Patrick. - Peguei o livro de volta e desviei o olhar. - E é claro que não vou chamá-lo de quatro olhos, esse já é meu apelido. - Dei um sorriso de lado.
- Desc...
- Tudo bem, deixa pra lá. - Arrumei os óculos e voltei a olhar para ele. - Falou que esse é um dos seus livros preferidos, suponho que deva ler bastante então.
- É, um pouco, sou eu quem tomo conta da biblioteca aqui da escola, é até bom me isolar lá, o pessoal daqui não gosta muito de mim.
- Deixe pra lá, as pessoas são julgadas para daí sim reconhecerem seu valor. Já acostumei com isso, então para mim é até normal.
- É, você tem uma autoestima boa.
- Obrigada, é loucura dizer isso, mas você é realmente muito lindo!
Haha! Achou que era verdade? Imaginei, a verdade é que passei o dia todo de olho no Patrick, e pelo que pude perceber, ele não tem amigos e passa o tempo livre na biblioteca, alguns meninos da sala o provocam, mas ele não reage...
Assim que acabou o horário das aulas eu fui à biblioteca, e só havia dois motivos para eu estar lá:
Primeiro: Livros
Segundo: Motivo com nome, endereço, telefone e olhos maravilhosamente azuis.
Caminhei devagar até o fundo sem que ele me notasse, mas falhei.
- Oi. - Ele falou abaixando o livro e me olhando pela parte de cima dos óculos.
- Oi. - Falei olhando para baixo.
- Ei, você está na minha sala, não é?
- Hum... Sim.
- Sou Patrick. - Ele colocou o livro na mesa e sorriu.
- Sou a Emma.
- Parece que vou vê-la bastante aqui na biblioteca, senhorita Emma. - Ele apontou para o livro em minha mão.
- Provavelmente.
- Sendo assim, fique à vontade, se preferir tem uma mesa nos fundos, eu costumava ficar lá, mas agora acostumei a ficar aqui. Enfim, se quiser a sala é toda sua, não dê valor a minha existência, finja que não estou aqui.
- Só queria pegar um livro, mas tudo bem, obrigada.
Como não dar valor à existência desse ser?
Peguei alguns livros e fui para os fundos, por fim me sentei e comecei a ler um livro de ficção que já estava na mesa, mas depois de meia hora lendo e rodando o celular na mesa, percebi que conseguia ver o reflexo do Patrick pela tela do celular. Olhei por um tempo, mas acho que ele notou, porque assim que parei de olhar ele apareceu na minha frente.
- Tudo bem, Emma. Preciso fechar a biblioteca agora. - Ele falou sussurrando.
- Okay, Patrick, mas por que estamos sussurrando mesmo? - Respondi por outro sussurro.
- Não tenho ideia. - Ele começou a rir, e o acompanhei na risada que ecoava pela biblioteca e a deixava com um ar mais vazio. - Mas tenho que fechar aqui, de verdade, desculpa te atrapalhar.
- Não, tudo bem, só estava passando um pouco do tempo. Bom, de qualquer forma, tchau, até amanhã
- Até...
Saí da biblioteca e esperei um pouco até olhar para ele de novo, e quando resolvi virar, dei de cara com o Patrick e os livros que ele estava segurando caíram no chão.
- Desculpa. - Abaixei para ajudá-lo, mas batemos com a testa um no outro. - Desculpa. - Não contive o riso e arrumei os óculos.
- Me desculpa, não queria ter te machucado. - Ele levantou com alguns livros debaixo do braço.
- Estou bem, mas está tudo bem? - Olhei para a testa dele que estava um pouco vermelha.
- Sim...
- Mas...
- Está tudo bem, Emma. - Ele arqueou uma sobrancelha e riu. - Obrigado pela preocupação.
- Não por isso. Ah, os livros. - Entreguei os livros que havia apanhado, ele agradeceu enquanto eu abaixava a cabeça e saia.
Mais cedo minha mãe havia dito para eu não voltar a pé para casa, mas fui mesmo assim, coloquei os fones de ouvido e comecei a andar, minha casa não era longe, estão cheguei rápido. Quando parei na porta para procurar a chave na mochila, um dos meus fones caiu e pude ouvir uma respiração ofegante perto de mim. Virei-me devagar já com um frio na espinha.
- Meus Deuses, Patrick! O que faz aqui?
- Eu... Depois que você saiu... Você deixou o livro na mesa, achei melhor devolver hoje do que só amanhã. - Ele tirou os óculos, ainda ofegante, e secou o suor da testa com as costas da mão.
- Nossa, bom, obrigada. - Tentei não parecer assustada e surpresa ao mesmo tempo. - Você... Hum... Quer entrar? Digo, tomar um copo d'água talvez? - Um dos meus principais problemas quando estou em situações desse tipo, eu fico nervosa, mas o problema maior não é o nervosismo, mas sim que eu começo a tremer. Tentei destrancar a porta, mas não conseguia manter o controle sob minhas mãos. Acho que minha mãe ouviu o barulho das chaves na porta, porque assim que demorei mais de meio minuto para encaixar a chave na fechadura ela apareceu.
- Emma...
- Oi... Mãe, esse é o Patrick. - Olhei para ela como quem diz "não conte minha vida para ele"
- Oi, Patrick, prazer. Vamos entrando?
- O prazer é todo meu senh... - Balancei a cabeça para ele negativamente enquanto minha mãe pegava a água e nós sentávamos no sofá.
- Sem senhorita ou senhora, aqui só usamos nossos nomes mesmo. Mellany. - Minha mãe sorriu e entregou o copo com água ao Patrick.
- Tudo bem, me desculpe. - Ele disse pegando o copo e dando um gole. - Eu tenho que ir para casa agora, obrigado e prazer.
- Tudo bem, Patrick, qualquer coisa que precisar estamos aqui. - Minha mãe repousou a mão no ombro dele fazendo aquela cara de "mãe simpática" que todas fazem.
- Obrigado mais uma vez.
- A Emma te leva até a porta.
Caminhamos até a porta e nos despedimos, assim que me virei, minha mãe estava debruçada na bancada me olhando.
- Como vocês se conheceram?
- Mãe...
- Diga logo! - Ela começou a rir.
- Ele só é da minha sala.
Subi para meu quarto e me joguei na cama.
- Droga de nervosismo, droga, droga! - Falei batendo no travesseiro.
O resto da tarde foi bom, tomei um bom banho e mais anoite eu e minha mãe fomos em um restaurante próximo de casa, cheguei exausta e dormi rápido. De manhã acordei com a luz do Sol no meu rosto, então não demorei para levantar. Desci até a cozinha com o sono estampado no rosto.
- Nossa, Emma, vou pedir para os produtores de The Walking Dead te contratarem, o que acha?
- É uma ótima ideia! Assim não preciso mais ver o Patrick depois da vergonha de ontem.
- Eu não acredito que você está preocupada com isso.
- Claro que sim, foi um desastre ontem, e esse só foi o primeiro dia.
- Emma, minha filha, você tem o resto do ano todo com ele, aos poucos você se acostuma, agora vá se arrumar antes que chegue atrasada.
Subi de volta para o quarto e me arrumei, menos arrumada que de costume, só de uniforme, blusa com touca e não podemos deixar o all star fora do conjunto, prendi o cabelo em um rabo de cavalo deixando algumas mechas soltas na lateral do rosto. Desci as escadas em direção à porta, onde encontrei minha mãe de braços cruzados em um dos degraus.
- Você não vai assim
- Por que não!?
- Emma, não é porque você não queira ver o Patrick, que ele não queira te ver. Agora, por favor, se arrume, e logo porque está atrasada.
E lá fomos nós para o quarto mais uma vez, me arrumei e desci.
- Agora você está apresentável. - Minha mãe falou e deu uma risadinha.
- Vamos?
- Vamos.
Fomos o caminho conversando sobre o que faríamos no próximo final de semana, e por fim decidimos ir ao cinema.
- Emy, por que não chama o Patrick para ir também?
- Oi?
- Seria divertido.
- Mãe...
- Pense e depois me fale.
- Conversamos quando eu voltar, pode ser? - Tirei o cinto, a beijei no rosto e saí.
Dei alguns passos e senti alguém ao meu lado me olhando. Andei um pouco mais rápido e ouvi a risada do Patrick.
- Eu sei que não sou a melhor pessoa do mundo, mas não precisa fugir de mim.
- Ah, é você... Me assustou.
- Desculpa. - Ele olhava para os tênis enquanto íamos conversando.
- E você não precisa ter vergonha de mim, bom, sei que ontem não foi um dos meus melhores dias, e peço desculpa por isso, então...
- É que não costumo falar com muitas pessoas, e ainda mais com garotas. - Ele deu um sorriso tímido e voltou a olhar para baixo.
- Sabe? Eu também não sou muito boa com as pessoas.
- É, acho que daqui pra frente vamos aprender muito um com o outro.
- Creio que sim. - O silêncio chegou. Tentei quebrá-lo. - Acho que vou passar na biblioteca antes de entrar na sala.
- Tudo bem... Até depois então?
- Até depois, Patrick. - Olhei ele se afastar e respirei fundo. Uma voz falou atrás de mim:
- Devia chamá-lo para sair.
- O quê? - Me virei para onde estava uma garota, um pouco mais alta que eu (como se isso fosse novidade), cabelos negros com as pontas em roxo.
- Meu nome é Beatrice, não falo muito com o Patrick, mas é bem provável que ele esteja gostando de você.
- Emma. - Estendi a mão para comprimentá-la. - A propósito, realmente não temos a mesma opinião. - Quando me virei de gostas ela voltou a falar.
- Emma? Não tem muito a ver com seu nome, mas se quiser que eu a chame assim, sem problemas.
- Como você sabe meu nome?
- Estamos juntas em algumas aulas, e como entrei agora na escola, achei que seria bom ter uma amiga, então olhei na lista de nomes e você era uma das alunas novas, olhei o número do seu armário para quando você fosse guardar o material, eu falar contigo. Ontem passei o dia te procurando e não achei.
- Se for assim, pode ficar por perto, e como você sabe o nome do Patrick?
- Éramos do mesmo cólegio antes de vir para cá, ele nunca falou comigo, mas gostava de observá-lo. A propósito, achei uma coisa que talvez lhe interesse.
- O quê?
- Eu tomo conta da biblioteca nas aulas de leitura, antes do Patrick, e eu estava arrumando os livros que às vezes ele deixa na mesa e esquece-se de guardar, quando peguei um deles, caiu um papel. - Ela me entregou um papel, creio que uma folha de caderno, dobrado, na qual um dos lados estava escrito em caneta azul:
"Para Lupe"
- Lupe é o amigo dele que se mudou para fora faz um tempo, mas eles ainda mantêm contato, e parece que esse era um rascunho para mais uma carta. Bom, mas deixe-me ir, estou atrasada.
- Ei, espere, não posso pegar o papel assim do nada, não é meu, e talvez o Patrick esteja procurando.
Ela se virou para mim.
- Se quiser eu fico com ele, ou jogo fora, por mim não faz diferença.
Suspirei e olhei o papel em minha mão.
- Tudo bem então, eu fico com ele.
Andamos em silêncio até a sala e não conversamos mais.
Na saída eu tirei a folha do bolso mas não deu tempo nem para desdobrar e o Patrick já estava ao meu lado. Guardei a folha com pressa.
- Oi
- Oi, Patrick. - Olhei para ele. - Ei, o que houve com os óculos? - Apontei para uma das lentes que estavam trincadas.
- Ah, nada, só os meninos da escola, não gostam muito de mim.
Reparei que as mãos dele estavam enfaixadas.
- Patrick, você deveria falar com alguém...
- Já tentei, mas o castigo que eles me dão por isso é bem pior. - Ele suspirou e tirou os óculos. - Ah, droga, mais um óculos. - Ele o guardou no bolso. - Emma?
- Oi. - Olhei para ele.
- Posso perguntar uma coisa?
- Pode, claro. - Meu coração acelerou.
- Você quer ficar comigo?
- Eu... - Perdi a fala.
- Digo, tomando conta da biblioteca?
- Eu...
- Por favor.
- Eu fico. - Olhei para frente e a Beatrice estava me chamando. - Já volto.
- Chamou?
- Chamou o quê?
- Ele para sair, mas que pergunta!
- Nãoooo.
- Deveria.
- Eu...
- Emma! - O Patrick me chamou.
- Tenho que ir, nos vemos amanhã.
- Até amanhã então.
Corri até o Patrick e continuei o seguindo até a porta da biblioteca sem trocarmos nenhuma palavra.
- Bem vinda ao paraíso. - Ele abriu as portas da biblioteca e fez jesto para que eu entrasse. - Bom, já conhece aqui, fique à vontade. - Ele sorriu.
- Acho que vou ficar por aqui desta vez. Posso?
- Mas é claro.
Senti o celular vibrar no bolso da blusa. Minha mãe.
- Oi mãe, estou na escola ainda, o Patrick pediu para que eu ficasse com ele aqui na biblioteca. Acho que não chego tarde.
- Tudo bem, não esqueça de falar com ele sobre sábado.
- Tchau, mãe.
Desliguei e comecei a andar por entre os corredores da biblioteca.
- Qual gênero é seu preferido?
- Acho que os de ficção.
- Terceiro corredor.
- Patrick? - O chamei enquanto olhava atenta para as prateleiras.
- Oi?
- Entrou no colégio quando?
- Se não me engano esse deve ser o terceiro ano que estudo aqui.
- E você sempre tomou conta daqui?
- Sim, gosto do silêncio daqui, gosto da companhia dos livros... Droga!
- Ei, o que foi? - Voltei para onde ele estava.
- Esqueci de pegar mais faixas lá na enfermaria.
- Eu vou com você.
- Não, deixa.
- Deixa eu ver isso. - Desenfaixei as mãos dele com cuidado, e estavam muito ruins. - Como eles fizeram isso?
- Não sei, acho que usaram alguns materiais do laboratório, Emma, isso está ardendo muito.
- Patrick venha aqui, não vou deixar você assim. - Puxei ele pelo corredor até a enfermaria. Abri a porta, e entramos numa sala onde a enfermeira estava sentada conversando com uma professora.
- Desculpa, podem nos ajudar?
- O que aconteceu?
- Os meninos daqui da es...
- Emma, não.
- Da escola, acho que usaram alguns materiais do laboratório.
- Deixa eu ver isso. - A enfermeira pediu para que o Patrick mostrasse as mãos. Olhei para ela esperando uma resposta.
- Não tenho o que fazer, desculpa, o máximo que posso fazer é limpar isso e enfaixar, você deveria ter passado aqui assim que aconteceu. - Ela olhou severa e refez o curativo.
- Tudo bem. - Ele suspirou.
- Acho que um pouco menos de um mês já cicatriza, se você cuidar.
- Tudo bem então, obrigado mesmo assim.
Saímos da sala e andamos um pouco, ele parou e sentou no chão apoiando as costas na parede perto dos armários.
- Patrick? Você está bem? - Ajoelhei na frente dele.
- Desculpa Emma, fazer você perder seu tempo comigo.
Ah não, ele só pode estar brincando né!
- Não fala assim, não é perder tempo, queria te ajudar, mas infelizmente não posso fazer nada, nem a enfermeira pôde.
- Emma, eu não aguento mais esses meninos, não aguento mais eles ficarem fazendo isso comigo todo dia.
- Mas por que eles fazem isso?
- Essa é a pergunta que me faço todos os dias. - Olhei para ele e suspirei.
- Só um minuto. - Me levantei e fui em direção à biblioteca, entrei e peguei nossas coisas.
- Vamos indo, te levo para minha casa e lá minha mãe vê o que faz contigo.
- Não, não precisa, Emma.
- Patrick.
- De verdade.
- Vamos logo.
- Não...
- Então fique aí sozinho. - Joguei as mochilas no chão e comecei a andar em direção à porta.
Senti ele correndo em minha direção. E quando se aproximou me puxou pelo braço.
- Não vou deixar você sair sozinha.
- Patrick...
- Emma, olha, nunca tive uma amizade assim, e o único amigo que eu tive, hoje mora fora do país. Sei que é cedo, muito cedo para dizer o que sinto, até porque nos falamos uma vez só, mas não consigo parar de pensar em tudo o que aconteceu ontem.
- Patrick, acho que nunca é cedo ou tarde demais, a vida é uma história, em histórias não se tem tempo certo para nada, as coisas apenas acontecem do jeito que tem de acontecer. Mas você dizia?
- Ontem pode não ter sido um dos meus melhores momentos, mas o dia foi bom, e gostei de passar a seu lado, nem que fosse por pouco tempo, mas foi bom...
- Ei, vocês dois, não se esqueçam de trancar a biblioteca quando saírem. - Era a professora saindo pelo corredor.
- Tudo bem. - Eu disse a ela. - Desculpa, Patrick, continue.
- Não, desculpa, não devia ter dito nada, estou com vergonha agora.
- Olha. - Falei olhando para ele. - Vamos voltar para a biblioteca, e lá conversamos.
- Tudo bem.
Fomos andando sem falar nada. Entramos de volta para a biblioteca, sentei na mesa com os pés pendurados. - Ei, do que você tem medo? - Também não sei porque perguntei isso. Mas perguntei enquanto folheava uns livros que estavam do meu lado.
- Medo? Ah, acho que eu tenho medo de não poder ter alguém que me ame, tudo bem, é besteira, mas eu não consigo ficar perto de casais. Não tenho nada contra, mas não me vejo com alguém, porque não sei se vou ter alguém. Bom, mas e você?
- Eu? Medos.... vamos ver, medo de escuro. - Comecei a rir. - Bom, com isso você tira a conclusão de que tenho medo de tudo. Isso não é medo, mas sabe, às vezes tenho medo do mundo e quero sair correndo para tentar fugir de tudo. Pena que minha mãe não deixa eu sair assim.
- Por que ela não deixa?
- Por que ela acha que eu fico melhor em casa, por conta dos meus problemas.
- Que problemas? - Ele me olhou confuso.
Puxei as mangas da blusa e mostrei os pulsos.
- Depressão.
- Você também?
- Como assim eu também?
Ele tirou a blusa xadrez e mostrou os braços, todos marcados por cicatrizes.
- Nível?
- Quase último e o seu?
- Segundo.
- Motivo?
- Morte da minha melhor e única amiga.
- Motivo?
- Morte do meu pai, mudança do único amigo.
- Sinto muito. - Falamos ao mesmo tempo. Ele me olhou e perguntou:
- Emma?
- Sim?!
- Quer correr? Vamos fugir disso juntos?
- Mas correr por onde?
- Não pergute, mas venha cá.
Ele me pegou e me tirou da mesa.
- Quando sairmos pela porta quero que corra em qualquer direção.
- Tudo bem.
Fomos andando até as portas do colégio, e então ele abriu as duas portas ao mesmo tempo. E comecei a correr, como se a cada passo que eu desse os problemas ficassem para trás, acho que me empolguei demais porque lembro de ter soltado um "uhul" aos berros. Quando não aguentei mais dar nenhum passo eu me joguei na grama da praça que estava ao meu lado. Olhei para o céu que ameaçava chover, fechei os olhos e senti alguém ao meu lado.
- Patrick?
- Emma...
- Obrigada
- Não por isso.
Abri os olhos e olhei para ele, que estava sentado na grama ao meu lado com a cabeça apoiada nos joelhos.
- Preciso te responder.
- O quê?
- Que você não estará sozinho, que terá alguém que te ama.
- Tudo bem, Emma, obrigado pelo apoio, mas dúvido.
- Dizer que dúvida disso é dizer que dúvida de mim.
- Por quê?
- Porque Patrick parece loucura, mas parece que nos conhecemos à muito tempo, e quando estamos juntos eu... Eu me sinto diferente, me sinto livre, como se os pensamentos ruins fossem se esvaindo a cada palavra que troco com você.
- Emma, me desculpa, mas não posso passar mais um minuto sem fazer isso...
Ele se deitou ao meu lado, e enquanto eu olhava para ele, ele se aproximou e me beijou.
- Patrick, eu...
- Não precisa dizer nada, desculpa...
Ele se levantou e começou a andar, e por uma momento achei que tivesse visto algumas lágrimas rolarem.
- Patrick! - Me levantei e fui atrás dele. - Tenho que responder.
- O quê?
- Que apesar de tudo, eu te amo e não quero que ninguém te magoe. - Beijei ele.
E as nuvens que antes estavam apenas ameaçando chover agora estavam agindo. A chuva começou fraca, mas aos poucos foi aumentando o ritmo.
Senti as mãos do Patrick no meu rosto. Paramos de nos beijar e o abracei.
- Não quero que ninguém no mundo faça você se machucar de novo.
Ele beijou minha testa, e as gotas de chuva que escorriam de seu cabelo caíam sob meu rosto.
- Acho melhor nós voltarmos.
Fomos andando de volta para a escola.
Pegamos nossas coisas e fomos para minha casa. Quando chegamos nem me arrisquei a abrir a porta, só dei algumas batidas com as costas da mão esperando que minha mãe atendesse, mas ela não estava em casa.
- Droga!
- O que houve?
- Esqueci que hoje ela está fazendo plantão no hospital.
Peguei minha chave e tentei abrir a porta... Já sabe o que aconteceu, não é?
Quando desisti e sentei do lado da porta o Patrick abaixou ao meu lado:
- Ei, ei, não fica assim Emy, me empresta aqui, deixa que eu abro.
Ele pegou a chave da minha mão e abriu a porta.
- Não precisa ficar nervosa, só piora. Eu já passei disso, mas comigo era pior.
- Obrigada.
Entrei em casa e joguei as coisas no sofá.
- Eu vou indo, eu posso ficar sem dar notícias, mas se eu não voltar para jantar minha mãe chama até a CIA para me achar.
-Tudo bem, Patrick. Até amanhã então?
- Até amanhã, Emma.
Ele saiu e fechou a porta atrás de si.
Enquanto eu caminhava em direção ao banheiro ia tirando a camiseta ensopada.
Assim que entrei no chuveiro deixei a água cair sob mim enquanto ia refletindo sobre tudo que havia acontecido.
Não sei, talvez eu estivesse precipitada em questão ao que eu sentia. Mas a cada dia que passava parecia que sentia algo novo, algo que me fazia sentir aquilo de "quero descobrir mais". Apenas o tempo diria. Me troquei com essa frase ecoando na minha cabeça.
O resto da noite passei deitada pensando. Até lembrar de uma coisa no meu bolso da calça. A carta do Patrick ao amigo...
A peguei no bolso e comecei a lê-la.

" 15/8                 
               Oi, Lu,
Como vão as coisas? Espero que bem. E a Jen? Bom, você pediu que eu contasse caso tivesse algo novo. Na verdade tem, mas estou meio inseguro. As aulas voltaram faz um tempo, mas hoje apareceu uma garota nova na minha classe de Matemática. Ela não é muito como as garotas dos meus sonhos, mas confesso que tem algo diferente nela, talvez o jeito de me olhar pelo canto dos olhos, ou o jeito como sorri ironicamente. Não sei, mas ela é perfeita. Trocamos algumas palavras na biblioteca, mas você já me conhece! Também já conheci a mãe dela. Na verdade acabei de voltar da casa dela, não, não aconteceu o que você está pensando. Eu só fui até  lá devolver o celular que ela acabou esquecendo na mesa da biblioteca. Não queria ter tanta vergonha, queria que ela soubesse quem eu sou por trás das poucas palavras e das bochechas vermelhas. Bom, mas vou indo, estou começando a ficar um pouco nervoso, então, já sabe como eu fico. Queria escrever mais, mas o coração acelerou, talvez amanhã eu mande notícias."
Minha reação? Se eu disser que cai da cama você acreditaria? Aposto que não.
Minhas mãos estavam suando, e não era pouco, porque aos poucos a tinta da caneta na folha escrita ia perdendo cor.
Tentei ficar calma, mas quanto mais eu fazia isso mais meu coração batia descontroladamente. Não era possível que todos aqueles elogios fossem para mim. Não conseguia acreditar.
Deixei a folha sob a cama ao meu lado e me virei para a parede, puxei o lápis que prendia meu cabelo e comecei a desenhar, na verdade, apenas continuar o desenho que eu tinha começado. Era um Anjo, e em pelo menos metade da parede já haviam meus traços  formando Anjos em um lado e na parede da frente alguns rascunhos de duendes e fadas.
Eu estava apenas finalizando a asa, que precisava de atenção por conta dos detalhes e tive de  ficar em pé na cama para alcançar o topo e finalmente desenhar a última pena.
Dei alguns passos para trás para ter uma visão geral e ver se precisaria de mais algum retoque. Quando voltei para perto da parede ouvi a porta da frente bater. Minha mãe.
- Emy?
- Eu! - Gritei da porta.
- Desce aqui.
- Estou indo, calma.
Desci as escadas até a sala e a abracei.
- Como passou a tarde?
- Foi boa até...
- Percebi esse suspiro... Me conta... - Ela me olhou de braços cruzados e riu.
- Não aconteceu nada...
- Eu sei que alguma hora você vai contar...
- Mãe, amanhã conversamos, pode ser? Estou cansada, mesmo.
- Okay Emy, boa noite.
-Boa noite. - Comecei a subir as escadas em um ânimo que contagiava... Talvez eu pensasse mesmo na ideia de participar de The Walking Dead.
- Ah, Emy, vem aqui.
- Diga...
- Amanhã quando você sair do colégio vamos à um lugar.
- Tá... Não, espera... Que lugar? - Olhei para ela confusa.
- Amanhã você vai saber.
- Mãe, não quero psicólogo de novo. - Olhei para ela e tirei o cabelo do rosto enquanto ia sentar no sofá..
- Melody... - Bom, alguma hora você teria de saber meu nome. Minha mãe se aproximou e pegou minha mão.
- Mãe eu não quero... Psicólogos não são legais, eles me deixam desconfortável.
- Mas ajudam, não é?
- Só um me ajudou até agora, mas sofreu um acidente depois, parece que todo mundo que me conhece ou se afasta ou acontece algo, não gosto disso.
- Emy...
- Não quero, mãe... - Ela me abraçou enquanto eu sentia as lágrimas rolarem.
- Emy, está tudo bem, amor...
- Não, não está...
- Mas ficará. Quer fazer algo?
- Estou mesmo cansada, Mami.
- Tudo bem. - Ela me abraçou e beijou minha testa. - Sabe que faço isso para seu bem, não é?!
- Sei, é só que eu quero tentar não pensar na depressão nem nada, queria esquecer pelo menos um pouco.
- Tudo bem. Te amo. Boa noite.
E subi para o meu quarto, de verdade, não sei por que minha mãe ainda insiste, eu não gosto disso, não entra na minha cabeça como uma pessoa pode contar a vida inteira para outra que nem conhece!
Sentei na ponta da cama e bati o olho na carta ao meu lado. Era mesmo verdade? Ou foi a Beatrice quem escreveu a carta?
Assim que me deitei na cama com intuito de lê-la novamente, o telefone que estava no criado mudo ao lado da cama tocou. Caramba, eu não recebia nenhuma ligação desde o acidente da Emma. Então não esperava coisa boa vindo daquele telefone. Deixei tocar.
- Emy! Não vai atender? - Era minha mãe gritando da cozinha.
- Deixo por sua conta.
Voltei ao silêncio de antes.
- Emy!
- Fala, mãe..
- É para você.
- Quem é? - Perguntei à minha mãe e também me perguntei.
- O Patrick!

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⏰ Última atualização: Oct 03, 2015 ⏰

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