Kevin correu até o interfone e atendeu quando o ouviu tocar, certo de que se tratava de Lorena:
— Oi, tia!
"Bom dia, Kevin. Tudo bem?" perguntou a loira lá embaixo, na portaria.
— Não tá tudo bem não, tia — respondeu o pequenino um pouco abatido.
"Não? Por quê? O que aconteceu?"
— O Raul tá passando mal.
Kevin se virou e olhou na direção da escada que levava ao segundo andar do apartamento, temeroso.
"Eu já estou subindo."
— Tá bom. Não demora, tia.
"Já estou chegando aí".
O garotinho desligou o interfone e subiu correndo, indo até o banheiro do quarto de Raul, encontrando-o curvado sobre o vaso sanitário.
— A Lorena já tá subindo, Raul — avisou Kevin em um tom abatido.
Mas o jovem rapaz não pôde dizer nada, pois não tinha forças.
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Lorena saltou do elevador no vigésimo andar e, sem pensar em privacidades, tirou a chave reserva do apartamento da bolsa e destrancou a porta. Mesmo estando no primeiro andar do duplex, ela foi capaz de ouvir, assim que entrou, o barulho de Raul vomitando. De maneira que ela jogou sua bolsa no sofá e subiu praticamente correndo, fazendo o som do seu salto chocando com o chão ecoar por toda parte.
Kevin, ouvindo a loira se aproximar, saiu no corredor e foi de encontro à ela, segurando-a pelo punho e puxando-a até o quarto, por onde ambos passaram até alcançar o banheiro.
— Raul... Meu Deus! Está tudo bem? — exclamou Lorena se abaixando ao lado do jovem rapaz e colocando uma mão em suas costas.
— Tá... — ele reuniu forças e murmurou com a voz falha, dando descarga e se erguendo.
— Você não me parece bem.
— Eu estou — Raul afirmou indo até a pia a fim de escovar os dentes.
— Se não estiver bem, eu te levo ao hospital.
O jovem rapaz balançou a mão, gesticulando um "não", e cuspiu na pia, apenas para dizer com a voz serena e com um meio sorriso:
— É nervosismo. Eu vomito quando estou nervoso.
Lorena o encarou sem acreditar e o viu enxugar a boca em uma toalha de rosto. Então, quando o viu se dirigindo à porta, deu um passo para trás e saiu primeiro, colocando as mãos sobre os ombrinhos de Kevin, que assistia a tudo com atenção.
— Está nervoso com o primeiro dia de trabalho? — ela perguntou, risonha.
— Só um pouco.
Riram juntos e ficaram parados na porta do banheiro, até que Lorena brincou:
— Se com um pouco de nervosismo você já vomitou, imagina com muito.
— Eu nunca trabalhei assim, em uma empresa — confessou o jovem rapaz olhando para os próprios dedos.
Lorena, que o olhava com um misto de sentimentos, desceu o olhar, enquanto Raul tinha a cabeça baixa, e observou o traje social que ela mesma havia lhe entregado no dia anterior. Quando, porém, ela subiu o olhar novamente, notou a gola da camisa um pouco desajeitada.
— A gola da sua...
— O quê?
Raul levou as mãos até a gola da camisa, mas não conseguiu desvirá-la.
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O Malabarista - Concluído
SpiritualeRaul é um morador de rua que perdeu sua mãe e, desde então, vive debaixo de um viaduto com o seu irmão mais novo chamado Kevin, de apenas 7 anos. Ele vive sem muita esperança de ter a sua sorte mudada, embora esteja sempre consolando o seu irmão, di...