Prólogo

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O barulho de meu corpo caindo é camuflado pela imensidão de neve ao meu redor.

Fecho os meus olhos tentando recuperar minha respiração, minhas costas doem e me mexo devagarinho no chão, quando abro meus olhos novamente percebo que estou no mundo humano, luzes de postes me cegam e a chuva de neve começa a me congelar, mas apesar de tudo sinto algo quente escorrer em meu rosto gelado, levo minha mão até minha bochecha direita e percebo que são lágrimas que caem, sem ao menos eu perceber.

Elas continuam a rolar, eu tento controla-las, mas não consigo, tudo parece assustador. Bem claro que deveria ser, é a primeira vez que me torno um anjo caído...

Eu sinto que não merecia ser expulsa...

Sinto-me perdida, sinto-me sozinha....

Por que? Por que isso está  acontecendo comigo?

Eu não era boa o suficiente? 

Agora eu me sinto como um daqueles demônios... um daqueles pecadores... nunca me senti tão irritada em minha vida como estou me sentindo agora.

Fecho minhas mãos na neve e levanto minhas costas lentamente, até que por fim eu esteja sentada, minhas costas doem, e quando olho ao meu redor vejo muito mais claramente o porquê. Minhas belas asas cortadas, sangue espalhado pelo chão, as penas caem lentamente dela, eu fico ali, inclino minha cabeça para o lado e mais lágrimas escorrem em meu rosto, minha alma estava desaparecendo... levanto minhas mãos e tento segurar firmemente minhas asas, a neve cai sobre ela e sobre meu sangue, não consigo fazer nada.

Então eu encho meus pulmões e grito, grito tão alto que meus ouvidos doem, mas nada disso é capaz de amenizar a dor que sinto agora, nem mesmo lágrimas, nem mesmo gritos, nem mesmo súplicas impedem minhas asas de começarem a desaparecer lentamente.

É como se eu tivesse morrido pela segunda vez, meu coração acelera, minha respiração fica fora de controle, não há nada mais a se fazer, não há... a última coisa que faço é vê-la desaparecer por completo bem diante de meus olhos, e por fim virarem cinzas, cinzas que derretem a neve onde estou sentada.

Levanto-me, o desespero toma conta de mim, meus cabelos castanhos voam com a forte onda de vento que vem em minha direção, eu clamo pelo Todo-poderoso, mas ele não me ouve...

- Por favor, me aceite novamente! Eu não aguento essa dor! - digo com meus braços acima de minha cabeça, mas a única resposta que ganho é uma tempestade de neve.

Abraço-me e lentamente começo a caminhar, meus pés descalços congelam ao sentirem com mais clareza a neve. Meus braços congelam assim como o sangue que há neles, minhas costas doem assim como meu peito, meus olhos secam, e meu rosto congela, minha túnica branca está coberta de sangue, e tudo que posso fazer por agora é caminhar...

Com dificuldade eu ergo minha cabeça, meus olhos com dificuldade começam a decifrar muitas cores, caminho com dificuldade, um pé depois outro, apesar de ter perdido minha alma, minha vontade de viver ainda consegue me motivar a chegar em uma espécie de cassino. Nunca ouvi falar, por que os humanos possuem isso?- Eu me pergunto mentalmente.

Não há ninguém na porta, agora que não possuo mais meus poderes celestiais, me ver não é complicado, quando eu entro no salão, uma forte onda de poder me abala, minha visão fica turva e só consigo ouvir uma bela música clássica tocar em um piano, a música preenche os meus ouvidos e sinto-me um pouco mais calma, caminho lentamente me segurando nas paredes, meus pés me levam até a música que está sendo tocada, a melodia descreve perfeitamente como eu me sinto neste momento, mas logo a melodia é atrapalhada por sons de vozes humanas, todas ás vozes parecem surpresas e com abominação, todos parecem estar com medo... de mim...

- Droga!- ouço uma voz grossa bufar e então sinto uma mão grande segurar meu braço esquerdo e esquenta-lo instantaneamente.

-Por que a música parou?- pergunto intrigada.

- Tola... como parou aqui?- a voz perguntava com raiva, não conseguia enxergar nada, exceto a cor do cabelo do homem que segurava meus braços. Seus cabelos são pretos, eu vejo sua boca abrir e fechar rapidamente, escuto palavras que agora se tornam nada mais que silêncio.

// Continua //




Anjos caídosOnde histórias criam vida. Descubra agora