A Mulher-Fogueira

Já te contaram da mulher-fogueira? Aconteceu a alguns anos atrás, na cidade de um amigo de um amigo meu. Ela simplesmente surgiu no meio da rua, caminhando com seu passo arrastado e mãos erguidas como uma pessoa tímida pedindo um abraço.
Era uma mulher, isso é certeza, mas qualquer tentativa de decifrar sua identidade caia por terra pois, veja bem, ela estava em chamas. Uma silhueta cadavérica e incompleta, cuja carne e os ossos eram constantemente mas lentamente consumidos pelo fogo que a envolvia. Ela continuava se movendo mesmo devendo estar morta, vagando pelas ruas em busca de alguma coisa ou alguém.

No começo as pessoas agiram conforme o instinto e gritaram "fogo!" a primeira vista. Muitos vieram correndo para ver - alguns poucos fizeram algo para tentar ajudar como trazer baldes de água e ligar para os bombeiros... Mas acontece que quanto maior a proximidade, maior era o efeito do calor infernal que ela emanava. Imaginem, por um momento, as primeiras pessoas a correrem até a mulher com extintores e baldes em mãos - rapidamente entrando em combustão. Esses mal tiveram tempo de gritar por suas vidas. Simplesmente explodiram.

Mas ainda ficaria pior. A verdade é que mesmo as pessoas que ficaram de longe, cuja curiosidade falou mais alto que o altruísmo, por algum motivo misterioso, também se viram andando até a mulher. Vagarosamente e sem entender, eles foram até ela, seus olhos fixos nas chamas que dançavam no corpo dela. Esses sofreram mais. Primeiro, sentiram o metal dos relógios e jóias cozinhar suas peles. Depois os pelos do corpo tostando em um segundo e as roupas queimando em seus corpos enquanto eles ainda insistiam em caminhar diretamente para a morte. Quando finalmente estavam perto o suficiente para olhar a mulher nos olhos, a pele já tinha derretido e a carne borbulhava. Eles se jogavam contra ela, curiosamente tentando dar o abraço que ela parecia procurar. E eram completamente consumidos.

A mulher continuou andando, carbonizando o asfalto onde pisava e causando mais destruição pela cidade. Eu gostaria de dizer que só aquelas primeiras pessoas morreram nesse dia, mas nós somos atraídos pela desgraça e temos uma curiosidade aguda e mórbida.

 E assim que ela passava, as pessoas trancadas em suas casas não resistiam - e olhavam.
Fascinadas pelo fogo, elas agiam contra toda a lógica e começavam a vagar até a mulher e o fogo.

Alguns tentaram se conter, se amarrar a algum lugar para conseguir olhar sem ceder.
Mãos foram decepadas. Nenhuma amarra resistiu.
Nada impedia a marcha de quem olhava para as chamas da mulher-fogueira.

Alguns acreditam que só aqueles que conseguissem conter sua curiosidade de olhar a desgraça da mulher queimando teriam escapado.

Não houve sobreviventes.