Quando o despertador tocou hoje às 6 da manhã eu já estava acordada a muito tempo. Poderia até dizer que não dormi, mas o pesadelo que tive era prova do contrário. Tinha ficado observando ice e fire dormindo durante horas, sabia que os kwamis odiariam a viagem tanto quanto eu.
Quando eles finalmente acordaram suas expressões estavam cabisbaixas e isso me quebrou um pouco mais, não queria fazer isso com eles, mas não tinha escolha, não podia deixar eles ali, e nem ficar. Não era uma viagem normal afinal, definitivamente não, hoje estaríamos voltando a Paris, depois de 2 anos longe eu finalmente estava voltando para casa.
Casa... não acho que eu possa chamar aquela cidade assim depois de ter abandonado ela. Se eu tivesse opção com certeza não iria, mas havia recebido uma ligação da minha mãe há uma semana avisando que tio Henry tinha falecido. Ele vinha lutando com problemas no coração desde que eu me lembro, vivia infartando, e fazendo piadas sobre ser imortal. Acabou que não era e agora eu teria que empacotar as coisas dele; não estava pronta para isso, muito menos para ser oficialmente a única guardiã. Desde que ele tinha me nomeado sua sucessora a 4 anos atrás eu fazia todo o trabalho de guardiã, mas ele sempre estava lá me auxiliando.
Antes das 9 da manhã já estava no aeroporto com meu pai, assim que ele terminou de despachar as malas foi até a loja onde eu estava esperando com 2 copos de milk-shake na mão. Meus pais se separaram quando eu tinha 10 anos e desde então ele morava em Nova York. Foi uma situação um pouco difícil, mas eu já imaginava que aconteceria, eles não estavam se dando muito bem a tempos e nunca tentaram esconder de mim, e sempre conversavam comigo sobre tudo, assim foi mais fácil de lidar.
- Como você está? - meu pai perguntou assim que se sentou
- Não sei - falei tentando diminuir um pouco a situação
Desde que eu tinha ido morar em Nova York ele sabia que eu não estava bem. Eu jamais teria abandonado a vida que tinha em Paris se estivesse. Mas meu pai nunca me forçou a falar nada, o que realmente foi bom, além de odiar estar sob pressão, sempre que eu tentava falar sobre o que aconteceu acabava trancada no quarto por horas chorando.
- Não sabe ou só não quer me preocupar? - ele disse me olhando. Continuei mexendo no meu meu milk-shake evitando ao máximo olhar para o meu pai. Ele não precisava de mais que isso então apenas suspirou - Vai ficar tudo bem ok?
Fiz que sim com a cabeça. Apesar de ultimamente as coisas só estarem piorando eu acreditava no meu pai, acho que ele diria se eu não tivesse mais chance. Passamos quase uma hora ali esperando o voo, ele até conseguiu me fazer rir com uma piada boba, mas o sorriso acabou quando entramos no avião. Eu não pisava num avião desde que fugi para Nova York, era como se de repente tudo ficasse mais real, a morte do meu tio, minha volta a Paris, e todo o resto que vinha junto. Não passou muito tempo desde que tinha sentado e ouvi sussurros vindo da minha bolsa.
- Ah não se preocupe, é tão terrível para nós quanto para você - a voz sempre impaciente de ice falou
- Ice, já passou pela sua cabeça ficar quieta quando não tem nada relevante a dizer? - fire respondeu
Os dois kwamis sempre foram bastante rudes, principalmente para falar um com o outro, afinal eram opostos. Mas fire sempre foi mais sentimental enquanto ice era mais fria. Apesar disso os dois eram incríveis, nós 3 tínhamos formado uma espécie de grupo de apoio depois que me mudei. Pelas regras eu deveria ter renunciado a eles antes de sair da cidade, mas tinha sentido na pele o que era estar com um miraculous quebrado e não deixaria eles passarem por isso nunca mais.
- E o que você quer que eu diga fire? Que está tudo bem? Estamos todos os 3 na mesma situação terrível aqui
- Concordo com fire - eu disse olhando pela janela - não tem necessidade de ficar nos lembrando o quanto a vida está ruim
Ice pareceu querer rebater, ou só me bater mesmo, mas ficou quieta. Em outros tempos ela teria dado um chilique, mas desde que eu estava com o miraculous da água tinha "educado" os kwamis, ou tentado. No geral estava dando certo, mas às vezes ainda aconteciam algumas brigas. Nos últimos 2 anos as coisas tinham saído bastante de controle, principalmente porque Ice me culpava por tudo que tinha acontecido, o que acabava gerando brigas. Meu pai estava ajudando demais com isso, ele mantinha os kwamis e a mim na linha quando as discussões ficavam mais fortes
- Então vocês finalmente cansaram de ficar na bolsa? - meu pai perguntou para ice e fire enquanto sentava ao meu lado recebendo uma virada de olho se cada um. Então virou para mim e disse - trouxe uma coisa para você
- Obrigada – eu disse tentando parecer feliz quando ele me deu um saquinho de balas de gelatina em formatos de monumentos famosos
A verdade é que eu amava aquelas balinhas, mas elas me traziam lembranças que eu realmente não queria agora, lembranças do que eu realmente tinha feito ao deixar Paris e do porque pedi a minha mãe que não falasse a ninguém que eu estava indo. Já era difícil o suficiente ir até lá, não queria ter que explicar o motivo de ter sumido, principalmente para um certo vizinho que era quase um irmão para mim.
Usei as quase 8 horas de viagem para continuar o texto no meu telefone, vinha fazendo isso desde que tinha conseguido ficar acordada sem chorar ou ficar com falta de ar. No início era horrível, eu não conseguia escrever uma frase sem passar mal, em uma semana eu tinha escrito 5 linhas e nenhuma delas fazia sentido, então eu apaguei tudo e fiquei sem escrever por 2 meses até que meu pai me convenceu a recomeçar. Nas primeiras semanas o resultado foi o mesmo, mas eu continuei tentando, ficava sempre lembrando do que meu pai tinha dito: “se você não fizer isso ninguém jamais vai saber o que aconteceu e você nunca mais vai ver o Zale”. Ele nem sequer sabia o que tinha acontecido, mas ouvir o nome do meu melhor amigo me fez continuar.
Desde então eu vinha escrevendo cada detalhe daqueles 3 dias que destruíram minha vida. Agora eu já conseguia escrever quase 1 página inteira sem passar mal. Exceto por uma palavra, o nome do desgraçado que causou tudo isso. Era como se meu cérebro tivesse bloqueado qualquer menção a esse nome, eu ainda lembrava quem era mas simplesmente não conseguia pronunciar e nem escrever. Tentei usar algumas referências a brincadeiras que fazia com Zale antes de descobrir a verdade para substituir o nome, torcia para que isso fosse suficiente. E principalmente para que eu tivesse coragem de entregar isso pra ele ler.
Depois de pouco mais de 4 horas, em que escrevi meia página, eu resolvi descansar um pouco, minha cabeça já estava doendo e girando. Sonhei com cenas aleatórias de lutas de quando eu e Zale começamos, nós tínhamos acabado de ganhar os miraculous e já nos consideravam os melhores portadores do século. Os outros portadores dessa época tinham renunciado pouco depois porque só nós 2 já éramos suficientes. Só acordei quando meu pai me chamou dizendo que o avião tinha pousado. Então era isso. Eu estava de volta a Paris.
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Miraculous da água
FanfictionÍsis sempre foi uma garota incrível, alguém que todos gostariam de ter por perto, alguém que não importava qual era a dificuldade sempre seguia em frente, e foi isso que fez com que seu tio a escolhesse como portadora do miraculous mais poderoso de...