Um único dígito.
Esta havia sido a necessária coincidência para que, às 8:47 da manhã de uma quarta-feira carregada por nuvens acinzentadas, o celular de Mark começasse a vibrar gentilmente contra o seu bolso traseiro enquanto este pedalava contra a neblina fria a caminho do seu estágio. Por curiosidade, confiou em suas habilidades motoras ao firmar apenas uma de suas mãos sob o guidão do veículo, seguindo no ritmo constante de suas pedaladas ao longo dos quarteirões seguintes. Assim, realizou o desbloqueio do telefone com o reconhecimento facial, sendo direcionado a uma imagem que carregava lentamente por conta de sua péssima cobertura de internet.
Quem era aquela pessoa, afinal? Não se recordava de ter visto aquela foto de perfil sequer uma única vez em toda sua vida, onde o rosto alheio estaria encoberto em maior parte por uma máscara descartável, cobrindo seus lábios e todo o nariz, além de parte dos seus olhos, escondidos ali por trás da viseira de um boné preto que se inclinava na direção da câmera, restando apenas alguns traços da tez beijada pelo sol. Mark poderia imaginar que se tratava de uma pessoa muito bonita, porém, a resposta para aquele dilema tão pouco importou no instante em que seus olhos fixaram em uma foto íntima que este não teve a menor pretensão em receber. Aquela notificação havia sido como um Kinder Ovo para adolescentes com altos níveis hormonais. O brinde da vez? Uma nude traseira.
No que o suor escorria por seus dedos longos, a confiança que havia colocado em sua destra se tornava cada vez mais questionável, mas sem uma reação para todos aqueles eventos, apenas o baque das rodas contra o meio-fio pudera trazer o garoto para a realidade, mas já era tarde demais. O impacto daquele imenso par de nádegas em sua tela havia causado um estrago ainda maior que os futuros hematomas em seus joelhos, ignorando o ardor que sentia ao longo dos cortes abertos em suas pernas por medo de que a abstinência lhe consumiria, pois o vício de seus olhos já haviam se tornado grandes demais com a imagem fixada em seus pensamentos, agora corrompidos por tamanha depravação em forma de uma primeira impressão.
Número desconhecido.
(08:47) Como você fez um trabalho incrível ontem, considere isso como uma 'pequena recompensa', querido leãozinho. O seu garoto já está com saudades.
(08:47) [Anexo: Imagem].
Por mais que, no calor do momento, estivesse sentindo os seus dedos queimarem de ansiedade para tomar uma atitude, questionando a figura de tamanha audácia sobre o quão estúpido este poderia ser. Quem em sã consciência enviaria uma mensagem como aquela sem mesmo averiguar os números que discou antes de salvar o contato?! Será que, para ele, números de telefone seriam como manifestações atiradas ao universo? Algo que criasse uma conexão mágica com o remetente de seu interesse? Céus, Mark nem estava usando uma foto de perfil naquele momento, e talvez esse tenha sido o grande risco que o desconhecido de pernas torneadas havia assumido em um impulso tão repentino quanto aquele. Não havia nada demais em jogo, apenas a reputação de um completo desconhecido.
— Garoto, você está bem? Quer que eu ligue para os seus pais? — O olhar desconfiado de uma senhora de cachos grisalhos, cujos fios se assimilaram em tom as nuvens que passavam por trás de seu rosto enrugado, agora se voltaria a cena do acidente, como quem procurava algum motivo para chamar a polícia diante aos fatos ocorridos naquela fatídica manhã. A sombra de sua pequena estatura deixaria o jovem ainda mais desconfortável, evitando o contato visual com a figura a sua frente no que se ergueu do chão, averiguando o estado de suas roupas e ferimentos após a queda, o que lhe daria um motivo bom o suficiente para se praguejar. Uma pequena mancha de terra em seus jeans novos, aquilo sim era um motivo para arruinar completamente o seu dia.
— Tá tudo bem, senhora! Não precisa se preocupar! Até porque eu preciso correr para o trabalho, ou posso acabar me atrasando... Não estou com moral suficiente pra perder o horário, entende? Tenha um bom dia! — O tom gentil do mais novo tão pouco havia se afetado mesmo em tais circunstâncias, sendo capaz de elaborar uma resposta breve no que se ajeitou novamente em sua bicicleta e partindo dali com alguns neurônios a menos, feridas abertas no lado em que havia caído sob o asfalto, além de um completo enigma em mãos, ocupando o primeiro, segundo e demais planos de seu subconsciente ao que o coração palpitava forte, ou mesmo... droga, havia outro ali que pulsava tanto quanto em seu peito. Mark, você deveria ser estudado como o maior pervertido de todos os tempos.
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777 - Odds of Love
FanfictionMark Lee é um jovem de 20 anos preso a um estágio medíocre na biblioteca de sua cidade, justamente para que pudesse pagar por sua graduação em música na universidade comunitária que frequentava. Porém, em um dia de outono qualquer, a sua ida ao trab...