Someone Like You

Capítulo 2.

- É... em 2006 quando visitava um hospital na intenção de fazer com que a alegria se tornasse presente apenas por, quem sabe, uns minutos na vida de algumas crianças eu encontrei a minha alegria. Nos olhos do meu pequeno anjinho, que estavam marejados, eu encontrei a minha felicidade mas essa foi diferente. Não durou por minutos, ela me acompanhou a cada instante. A cada sorriso, a cada melhora, a cada fala, a cada vez que ele me chamava de pai. E me acompanha até hoje mesmo que o meu coração esteja inundado em dor e mal consiga me expressar do jeito que ele merece. O que falar de Davi? ele era muito bom para esse mundo. Eu nunca conheci alguém que estivesse vendo o mundo desabar sobre as suas costas, rodeado de amargura, que tivesse TUDO para reclamar, e ainda assim dizer que está tudo bem com um sorriso largo e tão calmo como ele. Sempre lhe disse que esse era o seu traço que mais me admirava. E a memória que quero guardar dessa pessoa tão linda que já esteve entre nós, é exatamente sua calma e esperança enorme em meio a más situações. Assim quero que meu filho seja lembrado porque assim lembrarei dele para sempre - na primeira fila assisto o discurso que Michael fez na cerimônia de homenagem para Davi. Essa cerimônia também foi usada para dar visibilidade ao Instituto do câncer que receberia doações. A voz dele está embargada, ele está tentando segurar o choro. Sei que vai se julgar por muito tempo e que vai demorar para estar 100% novamente. Sei bem que acho que nunca mais estaremos 100% novamente, nunca mais.

Ele não consegue completar o discurso, me olha e me encara durante um longo tempo, eu subo no palco e entrelaço meus dedos aos seus tomando o lugar de fala - Infelizmente doenças terríveis estão por todos os cantos. Eu, como médica, já acompanhei vários casos onde as pessoas não tinham dinheiro para pagar o tratamento. Sabemos que em casos de doenças graves o tratamento é urgente e a demora é fatal. Quando conhecemos Davi sabíamos da doença e que teria sido deixado no hospital por os pais não terem condições de pagar o tratamento. Conosco ele estava seguro e tinha acompanhamento mas já era tarde. Ele era feliz, muito feliz apesar de isso me surpreender, a sua maior felicidade era ver as pessoas andando por o corredor. Eu não consigo descrever o quanto também fui muito feliz durante o tempo que tive a sua companhia, eu fui a pessoa mais feliz desse mundo - Michal olha distante e põe as mãos em frente aos olhos, abaixando a cabeça. Ô meu Deus, era terrível vê-lo assim. Ponho a mão nos seus ombros e o aproximo do meu ombro.

- e nós dois não tínhamos a menor condição psicológica para estar aqui, tudo que queríamos era lamentar sem tempo para parar. Mas estamos em cima desse palco honrando e realizando aquilo que a nós foi pedido. Um dia Davi virou-se em nossa direção e pediu para fazer por outras pessoas o mesmo que fizemos por ele - passo o microfone para Thiago - em nome do Sr Jackson e da sua esposa Mariah D'Auvergne, a fundação Heal The Kids tem como objetivo fazer o melhor para quem nós dará um futuro melhor. A Heal The Kids pretende sanar as necessidades médicas de nossas crianças e agora está alinhada também ao Instituto do câncer de Santa Bárbara e Londres - aceno positivamente para ele que me entrega o microfone - eu sei que será impossível ajudar todo mundo, mas estou disposta a tentar. Vai ser uma honra trabalhar para um mundo onde todos tenham condições de cuidar, ao menos, de algo tão importante como a saúde. Aliás não só eu, Michael ou Thiago que devemos olhar para essas causas sociais. É o dever de todos nós trabalhar para um futuro melhor, para uma sociedade com igualdade. Você quer finalizar?

Pergunto para Michael que agora parece mais calmo e tranquilo - por favor - seco as lágrimas que escorriam do seu rosto de forma que não chegasse a borrar a maquiagem e ele pega o microfone - eu queria pedir desculpas por não ter conseguido terminar e agradecer a Mariah que sempre está quando preciso. Eu creio que a Heal The Kids fará diferença na vida de muitas pessoas. Quero dizer que estamos aqui tentando cumprir o que você nos pediu e esperamos que esteja de acordo, nós te amaremos para todo sempre. Você nunca será esquecido meu pequeno - ele diz com os olhos fechados. Me sinto aliviada, tudo que mais quero nesse momento é abraçá-lo - ele está perto de nós, ele sempre estará por perto - sussuro em seu ouvido, ele abre os olhos e me olha com um sorriso de canto - eu também sinto isso - encosta o seu rosto no meu e faz o que tanto queria, me abraça. Eu estou feliz em saber da Heal The Kids, eu sinto que é uma maneira de o sentir por perto - você é um pai incrível.

⠀⠀⠀⠀Estamos passando por os portões, chegando em casa depois de um longo dia. Michael está tão exausto que dormiu durante todo o trajeto de volta. Preferi ficar no teatro assim que terminou a cerimônia, não queria acompanhar o que iria acontecer depois.

Michael foi mas segundos depois ficou comigo, ele não conseguiu. Penso que é algo muito forte. A imagem que quero guardar de Davi é dele em vida. Não entendo o motivo das pessoas gostarem de guardar memória ruins. É triste.

- você vai tomar um banho e descansar assim que chegarmos lá - digo enquanto caminhamos para a casa - a cada tempo que passa tenho mais certeza ainda do quanto eu te amo.

- não quero que se sinta tão sobrecarregado, sei o que acontece quando você está assim. Entende que está sendo horrível para todos nós, você não deve se culpar jamais por isso, meu amor.

Nós chegamos a sala principal onde estava Alice e Helena sentadas no tapete brincando. Elas levantam o olhar e nos dão um sorrisinho - oi princesinhas, chegamos - digo em tom baixo para elas - que saudade! - Alice exclama e abraça as minhas pernas, eu a pego no colo enquanto Michael se sentava ao lado de Helena.

- vocês estão combinando -toca o tecido da minha roupa que era todo em uma única cor - ô Alice... você está desde que chegou com o uniforme da escola? olha isso, está todo sujo!

Ela pula do meu colo antes que continue a brigar e sai correndo para a cozinha, quando volta está puxando a mão de Valen. Levando-a para o segundo andar. Por aqui, tudo normal na medida do possível - Michael pode ir descansar, eu fico com as crianças - digo para ele que toca a cabeça de Helena e se levanta - estou indo, se precisar me chama imediatamente.

Ele me dá um beijo e caminha para a suíte do segundo andar. Meu Deus! Essa casa nunca esteve tão silenciosa - você quer me acompanhar até o estúdio, pequena? - há tempos não tocava em pincéis ou tintas. E eu amava há tempos atrás... quando tinha 22 anos era o meu passatempo favorito. Quando nos mudamos para o rancho em um dos meus aniversários Michael me deu uma "galeria".

Era onde tinha prateleiras e prateleiras de tintas e muitos pincéis. Um paraíso para os amantes da arte. Aos poucos essa minha parte foi ficando de lado. Por viagens em excesso, meu trabalho e a minha filha que na época tinha apenas quatro anos. Helena a acendeu novamente. Ela ama muito passar horas colorindo as telas, eu fico admirada - mamãe - sussura - eu acabei indo quando você não estava aqui - abaixa a cabeça com o rosto triste. Talvez estivesse pensando que iria brigar - se você não tiver bagunçado...

- vamos lá ver - me dá um sorriso e segura em minha mão. Me levando até a galeria que ficava acoplada a casa do rancho. Ao chegar estava tudo no mesmo lugar ou até mais organizado. Tinha cinco quadros encostados na parede, todos em tom de azul. Azul bebê, azul escuro, azul capri, azul Caribe... - você quem pintou? eu vou ter que tira-los daqui e deixar de expor por estar mais bonitos do que os que eu pintei, Helena - digo ironicamente para ela que dá risada - obrigada mamãe.