Capítulo 01 | Lar doce lar

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    É estranho estar aqui de novo.

    O ar não parece mais o mesmo. Ou sou eu que estou o inalando diferente de antes.

    Já faz uma semana que estou enjaulada por paredes em tom de verde musgo. E admito que não queria minha liberdade desta vez. Porque eu sei o que vou encontrar lá fora.

    E sei que vou me arrepender de ter voltado.

    Encaro o espelho enquanto escovo o cabelo castanho e rebelde que faz cócegas em minha barriga desnuda.

    A garota que vejo não está nenhum pouco empolgada. Mas a idiota ainda não se convenceu de que está a minutos de cometer mais um erro.

    — Vicky? — ela se aproxima da porta fechada. — Está pronta?

    — Quase — digo pegando minha camisa cinza.

    — Posso entrar?

    — Pode — permito após estar totalmente vestida.

    Minha mãe abre a porta, mas fica parada lá por alguns instantes.

    — O que foi?

    — Ficou ainda mais linda — elogia vindo até mim. — Ele cresceu mais, como isso é possível? — pergunta acariciando minhas mechas onduladas.

    — É só não cortar.

    — Rabugenta — alfineta rindo. Ela parece distante ao deslizar a mão por meu cabelo. — Senti tanto sua falta... — sussurra ao me abraçar.

    Inspiro fundo.

    Também senti falta disso.

    Esse cheiro de flor de laranjeira. O clima familiar e tranquilo. Os braços que estão sempre dispostos a me confortarem. Senti falta até das panquecas queimadas do papai. Mas é óbvio que ele não precisa saber disso.

    — Me deseje sorte.

    Ela sorriu triste.

    — Tem certeza disso?

    — Não.

    — Então por que, amor?

    Minha boca nem se abre.

    O que eu diria? Que fui praticamente expulsa de Seattle?

    Não. Ela não precisa saber.

    Encaro seus olhos azuis, e me sinto angustiada. Sim, ela precisa saber. Mas não posso dizer como de fato tem sido minha vida nos últimos anos.

    Ela suspirou assentindo.

    — Tudo bem. Se você tem força o bastante pra vir até aqui, vai ter pra superar — assinto em concordância. — Mas me prometa, que se não conseguir mudar as coisas ou se adaptar a isso... vai embora.

    — Prometo. Se der tudo errado. Eu sumo daqui e só venho no natal, como antes.

    Ela me abraçou novamente, como se não quisesse me deixar partir jamais.

    Só que eu tinha que ir.

    Então peguei minha bolsa e me despedi com um beijo.

    Cheguei aqui há sete dias, mas só meus pais tem essa informação. Isso porque vim em uma madrugada chuvosa, e com um ótimo capuz sobre a cabeça.

    Entrei em meu carro determinada a ir para a guerra que eu mesma comecei. Dessa vez estou indo para decretar a paz que poucos querem aceitar de mim.

Condenada a ViverOnde histórias criam vida. Descubra agora