POV Flávia

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Flávia retornou da folga sem conseguir tirar a resposta dele da cabeça. O tempo a compensará... o quanto precisaria esperar até isso acontecer? Não tinha um bom histórico sobre esse assunto se os dezoito anos esperando por ele servissem de exemplo.

- Flávia!

Murilo a abordou com urgência.

- O que houve, Murilo? Não precisa se preocupar, foi até tranquila a conversa, apesar de curta.

- Não é isso. Ele está aqui!

- Ele está aqui? Ele quem?

- Sua paixão carrancuda.

- Mentira! Cadê?

- Na área das mesas. O que tinha naquele copo, Flávia? Ele nunca ocupou alguma mesa desde o primeiro dia que colocou os pés aqui.

Ela sacudiu os ombros de Murilo animada.

- Não disse que iria funcionar?

E olhando para as marcações de caneta no braço nu, dirigiu um olhar pidão ao amigo.

- Murilo, por tudo que há de mais sagrado, me empresta a sua camisa? Ele não pode ver nada disso.

Murilo prontamente tirou a camisa de manga longa e entregou para ela.

- Você não existe!

Vestiu e ajeitou as mangas, certificando-se que elas estavam bem fechadas. Colocou o avental e pegou o bloquinho de anotações. Abaixou-se por um segundo para conferir a aparência no reflexo do maquinário.

- Estou bonita?

- Sempre, Flávia.

- Deseje-me sorte!

E, assim, aproximou-se do homem que era sua paixonite.

- Boa tarde! Vejo que decidiu aproveitar uma de nossas mesas.

- Oi! Quero dizer... Boa tarde!

Ele começou a coçar a lateral da cabeça com o polegar. Flávia podia morrer com a fofura daquela cena. Riu brevemente e levantou o bloco e a caneta em seu campo de visão.

- Então, o que deseja?

Ele olhou as próprias mãos pensativo e, tomando uma decisão, ergueu o copo de café de mais cedo, colocou-o na mesa e girou-o até as palavras dela ficarem visíveis.

- Oi!

Flávia ficou vermelha e escondeu o rosto nas mãos enquanto soltava um grunhido. Não importava o que o outro lado dissesse, aquela frase realmente emanava desespero.

- Não, não, não precisa ficar envergonhada.

Ele movimentou os braços agitadamente até pousar nos dela, a incentivando a descê-los.

- Eu mesmo sou péssimo com essas coisas!

Ela abaixou as mãos e encontrou ele lhe olhando com um riso bobo e perdido. Estava certa, era maravilhoso experimentar aquele monumento de homem sorrindo.

- Oi!

Eles riram. Ele tornou a apontar para o copo, dizendo:

- Você é bem criativa.

- E, por um acaso, você leu todas as outras também?

Ele tornou a coçar a lateral da cabeça.

- Cada uma.

Antes que ela pudesse falar alguma coisa, o gerente a chamou. Lá estava a fila do principal horário da tarde.

- Essa fila tá gigantesca... Vou te deixar trabalhar.

- Desculpa... Mas, ei, nossa conversa não acaba aqui.

Ele sorriu. Flávia sentia que ia desmaiar.

- Certo.

- Vou cobrar! Bom fim de tarde!

E saiu correndo para auxiliar Murilo com a demanda exacerbada. O homem já tinha ido embora quando ela olhou para a mesa que ele estava.

Depois que o pior da multidão já tinha passado, Murilo deu início ao interrogatório.

- E aí? Como foi?

- Foi exatamente a cantada de hoje. Funcionou! Socorro, Murilo, o sorriso dele é lindo. E eu ainda consegui arrancar do homem até uma gargalhada! Quase desmaiei na hora.

Ela dava uns pulinhos animada ao contar.

- O que vocês falaram?

- Nem deu para falar muito mas eu deixei bem claro para ele que a nossa conversa não estava finalizada.

- E nosso homem misterioso, não mais tão carrancudo, tem nome?

Flávia soltou um gritinho.

- Esqueci de perguntar!

- Só você mesmo, Flávia...

- Ei, me deixa. Amanhã descobrirei.

Murilo se afastou para atender uma das mesas balançando a cabeça para a amiga. Flávia retirou a blusa e sorriu acariciando a última mensagem recebida. ELE estava certo, ela finalmente foi recompensada. Apesar de tudo, tinha sido tão bom receber esse apoio do outro lado. Pegando a caneta, escreveu:

'Você vai sumir de novo?'

Esperou que nem fazia quando mais nova, encarando a extensão de pele branca de seus braços. A decepção aumentava em seu âmago a cada segundo que se passava. Somente quando estava prestes a dormir, a resposta chegou.

'Não mais.'

Ela soltou o ar que não percebeu que estava prendendo e adormeceu com um sorriso grudado no rosto.

You All Over Me - FlaguiOnde histórias criam vida. Descubra agora