Capítulo 1
- Você deveria ir para a faculdade, Alice – profere pela milésima vez só naquela uma hora em que estava na minha casa.
Respiro fundo mais uma vez, de novo.
- Não, eu não deveria ir Geo. Sabe que não quero sair de casa e o motivo, me recuso a viver novamente. Pelo menos por enquanto.
- Mas Alice... Já se passaram mais de 6 meses, pensei que tinha começado pelo menos a aceitar – fala com uma voz baixa, talvez pensando no que poderia falar para me convencer a sair.
- Quando sua família e seu namorado forem mortos na sua frente, aí sim você poderá palpitar em algo ok? Apenas cale a maldita boca e me deixe em paz!
6 meses... 6 meses que me tranquei em casa, com medo de tudo que está a minha volta. Medo do conhecido e desconhecido.
Me lembro de suas caras e caretas, suas risadas escandalosas e... Dos seus gritos de dor quando aquele homem entrou em minha casa. Ele não tinha vindo para roubar e sim matar.
Matar por dinheiro.
Meu pai era dono de uma empresa, sendo passada pra ele por minha avó. Ele a assumiu quando se aposentou, um policial velho entediado, eu diria. Minha mãe era a sua secretária nas horas vagas, mas antes de tudo era uma artesã incrível.
Todos meus colares, brincos e caixas dentro do meu antigo quarto foram feitos por ela. Uma verdadeira artista.
Sinto falta dos dois. Os abraços inesperados eram os melhores, a comida feita por ambos era simplesmente divina. A lembrança deles dançando lentamente na cozinha me enche novamente de saudades e bons sentimentos.
Mas a sensação não dura muito, a tragédia ainda é fresca em minha mente.
Depois da minha conversa com Geo, fui tomar um banho sem me preocupar dele ir embora ou não. Ele quem cuidava de mim depois daquele dia, um policial - amigo do meu pai que quis me ajudar -, mas sempre estou complicando as coisas para seu lado.
É injusto, eu sei.
No banheiro, olho para o reflexo no grande espelho. Meus fios platinados estão bagunçados de maneira vergonhosa, como se eu tivesse acabado de acordar. São mais de meio dia e estou acordada faz horas. A insônia virou aquela inquilina indesejada.
- Alice, por favor me ajude com isso, você é uma mulher forte, sabe disso, vamos caminhar um pouco sim? Tomar um sorvete naquela sorveteria do outro lado da rua? – Ele realmente é um homem com muita força de vontade.
Geo está atrás da porta tentando me tirar de casa, pela terceira vez em dois dias. Homem teimoso.
- Me deixe tomar um banho, quero ir a um lugar depois. - Estou cansada de olhar pras mesmas paredes.
- Vamos Lice, você precisa tomar um... Como? Você vai sair? – Um tom mais alto é usado por conta de sua surpresa.
Adorável.
O ameacei com gritos para sair do meu apartamento e me esperar na recepção, antes que eu lançasse uma toalha em seu rosto meio redondinho. Ele era uma graça.
Depois do banho, me arrumei com um vestido simples azul claro. Parei na frente de George e o observei.
Ele era alto, uns 1,85. Seus cabelos estavam tingidos de roxo escuro, resultado de uma aposta que fez entre seus colegas. Olhos cinzentos, uma boca cheia, várias pintas espalhadas pelo rosto e pescoço, uma cicatriz no nariz que parecia de mentira de tão falsa e 'bem feita' - que ele jura ser real, aliás -, a tatuagem de cobras brancas e pretas em seu braço esquerdo me deixavam com vontade de fazer uma igual, seus traços finos e bem feitos faziam meus olhos brilharem.
Estava sem o uniforme, apenas uma calça moletom preta e uma blusa vermelha com flores. Ele realmente era bonito, mas por qual motivo o desgraçado estava solteiro ainda?!
Saí do meu mundinho e subi na BMW preta, fomos para a sorveteria e pedi para George me levar a um lugar que queria ir antes mesmo de tudo desandar.
- Um pet shop? – me pergunta com uma certa descrença e um maldito sorrisinho de lado.
- Sim, um pet shop. Volto daqui alguns minutos Geo, então fique sentadinho aí, meu lindinho.
Não esperei resposta e entrei logo no lugar atrás de um animal que chamasse minha atenção. Chega de silêncio e solidão no meu apartamento. Estou farta disso.
Meus olhos passaram por todos os lugares e pedi para uma funcionária me levar até os animais que estavam ali para serem adotados. Comprar uma vida não é do meu apreço.
Me deparei com cachorros de raça e vira latas, pássaros grandes e pequenos, uma cobra residia ali também, mas apenas para ser admirada. Quem diabos iria adotar ela afinal?
Ok... talvez eu seja essa pessoa.
Eu quero a cobra agora.
Ela era toda em um cinza escuro, mas brilhava quando a luz batia em suas escamas. Eu apenas quero uma cobra agora. Obrigada, pet shop.
Nada me chamava atenção o suficiente, até que me deparei com olhos verdes vibrantes. Um gato um pouco pequeno, provavelmente filhote.
- Um gato?
Apenas o olhei com uma cara de "Sério que você realmente vai ficar fazendo isso?". Ele se calou, mas abriu um sorriso ao ver que eu abraçava o bichano com carinho. Eu ainda morro de nervoso ou de fofura por esse homem enorme.
Pedi para George andar sem rumo pela cidade, não olhava a minha volta a tanto tempo, preciso ver as ruas depois de tanto tempo. O gatinho resolveu dar uma de alpinista e me escalar, se aninhou em meu pescoço e ali ficou até seguirmos para casa.
Eu não chorei ouvindo-o ronronar, definitivamente não.
Cheguei em casa com o gato, ainda sem nome, umas sacolas com as coisas necessárias para ter um animalzinho de estimação e uma garrafa térmica enfeitada com glitter azul e vermelho.
O que?
Eu gosto dessas coisas.
O coloquei na minha cama e fiquei de frente para ele, pensando em um nome bom o suficiente para aquela bolinha alaranjada.
-Sun... Seu nome será Sun, porque você é agora o sol em minha vida, quem me tirará da solidão que me forcei a ficar. Conto com você para me fazer sorrir, garotinho.
Ele miou em resposta e balançou o rabo.
Deitei e dormi com Sun ao meu lado, ronronando mais uma vez ao pé do meu ouvido, colocando um fim naquele silêncio mortal que minha casa tinha.
Espero conseguir voltar a viver logo. Quem sabe se me esforçar de verdade dessa vez, eu consiga voltar a faculdade como o Geo quer.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Alice & Liz
RomanceUm romance estranho, garotas com passados tristes ficando juntas e seus gatos de estimação;