Capítulo 7

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Pelo aspecto roto e poeirento, aquele posto estava ali há anos. De todo modo, Eriksson arriscou chamar por ajuda. Não falava alto, apenas ia de tenda em tenda e as espiava e lançava um tímido 'Olá?'. Seria incrível encontrar outras pessoas como ele, poder conversar e descobrir mais do que acontecia ou mesmo onde estavam, mas só o que viu fora mais desolação. Corpos por toda parte, alguns intactos e ressequidos, outros apenas ossos e espalhados como se tivessem sofrido um grande massacre.

Esqueletos naqueles uniformes verdes esfrangalhados dividiam espaço com seis ou sete outros em agasalhos e jalecos brancos manchados de sangue seco.

O explorador perdeu as esperanças na metade da busca.

Tais visões trouxeram com um choque à memória de Eriksson lampejos do que acontecera ao seu próprio grupo: uma comoção sem igual o despertara num salto que o fizera rasgar o saco de dormir; algo os atacava na madrugada, havia correria, gritos de desespero, companheiros sendo reduzido a pedaços por coisas horríveis e furiosas, tão assustadas quanto eles. Tudo soava muito turvo e sem sentido.

Lake e Mills lutando, outros procurando às escuras por armas ou pelos lança-chamas, urros de pavor e agonia, sons molhados de carne sendo rasgada. Homens se refugiavam em tendas que ameaçavam desabar ante a furiosa tempestade de neve que assolava o acampamento, mas eram arrastados para fora, desaparecendo no vendaval.

Nos canis, os cães uivavam como loucos, sua algaravia espalhando-se pelo véu de branquidão que cobria a tudo enquanto escapavam, estraçalhando o alambrado à dentadas e também sendo atacados. Um cenário de caos e pesadelo.

Eriksson lembrou-se das últimas coisas que viu e de seus pensamentos finais: ajudava a Watkins, Fowler e Boudreau lutarem com pás contra um daqueles malditos espécimes decrépitos que deveriam estar mortos há eras quando Fowler fora agarrado por trás, aos berros, por braços longos e repletos de ramificações grotescas e, de forma tão natural quanto alguém poderia descascar uma banana, tivera sua pele arrancada numa cascata de sangue.

Isso não deveria estar acontecendo... Estavam mortas! Como é possí...?

Os gritos estrangulados de Boudreau soaram de algum lugar na tenda em que enfrentavam as criaturas, um barulho medonho, o pânico de um homem vendo a vida lhe ser tomada por algum demônio saído de lendas. Logo o gorgolejo cessara. Não se consegue gritar sem a cabeça estar ligada ao corpo.

"— Watkins!" — começara a dizer Eriksson, pronto para ir até o colega e tentar livrá-lo de um total desmembramento, mas não houvera tempo.

Uma daquelas garras repulsivas surgira sem que Eriksson visse de onde e o calor de seu sangue fluíra imediatamente pelo pijama que usava. Sentira o peito sendo rasgado e em seguida uma comichão junto ao pescoço; não era exatamente dor, ele havia lido em algum lugar que a morte, dependendo do modo que viesse, não doía; era mais um misto de formigamento e a estupefação da surpresa do golpe.

Barulho nenhum mais viera, visão nenhuma, pois suas vistas escureceram e o mundo, por mais insano que se apresentasse naquele instante, perdera toda sua importância. Estava morrendo e aquilo era o mais apavorante, pois sentira que nada o aguardava – não o Céu, a Luz ou alguma deidade que sua mãe temente a Deus dizia esperar por todos – somente um grande vazio.

Não tinha ideia de quanto tempo passara no infinito nada até reviver apavorado dentro daquele odioso tubo de vidro, sentindo o universo tremer, trazendo-o de volta a... Bem, ainda continuava sem saber a quê.

Lamentou o destino incerto de seus companheiros e também daqueles coitados ali, mas viu algo de relance em uma das tendas que o fez se concentrar outra vez em sua própria situação. Um movimento. A necessidade de descobrir se estariam seguros falou mais alto que o medo; Eriksson estudou melhor cada canto do abrigo e o que achou ser alguma ameaça, acabou se revelando uma maravilha que havia esquecido existir: o reflexo de sua imagem. Tinha encontrado nada mais que um espelho.

Renascido para a LoucuraOnde histórias criam vida. Descubra agora