É como eu te veria... Se não houvesse escuridão
Perante a fome e o livro rabiscado que estava segurando, eu pensava com a agitação que tanto trabalhei para extinguir. Uma coisa era certa: tinha algo perigoso acontecendo. E eu estava decidido a descobrir o que era.
Depois do ataque inesperado, eu não havia trocado uma palavra com Sofia. Me recusei a olhar em seus olhos e a ignorei durante todo o percurso, rejeitando terminantemente a ideia de dar respostas para as suas perguntas, que eram feitas como se aquele fosse um dia normal e nada tivesse acontecido. Não que ignorá-la tenha sido difícil, já que Sofia não insistiu na conversa e apenas fez alguns poucos comentários sobre a minha visível e "repentina" estranheza com ela.
Quando terminamos a trilha, não fui para casa antes de enviar à Ana, Raquel e Gui a seguinte mensagem: "Nós precisamos conversar."
Desde que éramos menores, o dormitório de Raquel era o nosso ponto de encontro. Era quase que uma tradição ir para lá depois da escola, e naquele dia não foi diferente.
Dentre os quatro, a casa de Raquel era a mais próxima da minha. Ela ficava em um bairro afastado da cidade e humilde, onde se encontravam várias pequenas casas também.
O chão do quarto da garota era de madeira e se estendia até as paredes claras. Havia um armário escuro, que não era muito grande e nem muito pequeno, mas encostado na parede esquerda e em frente à porta ocupava um espaço considerável e parecia ser maior do que realmente era. Ao lado dele, um amontoado de botas e tênis sujos eram situados, ao mesmo tempo que, do outro lado, uma janela acompanhada de cortinas brancas se expandiam. Na parede direita, havia uma escrivaninha branca e bagunçada por vários papéis coloridos, tinta e lápis de cor, além de dezenas de fotos, posters e desenhos, que abrangiam na parede até o final da cama. Ela era feita de madeira clara e preenchida com um colchão, um cobertor vermelho e um travesseiro combinando com o mesmo. Ali havia também, em lugares aleatórios, algumas blusas ou agasalhos que se penduravam em um canto ou outro.
"Ben, tem certeza que você não precisa de atendimento médico?", perguntou Raquel, enquanto me olhava com preocupação.
"Não!", exclamei, andando de um lado para o outro em seu quarto, "Eu não estou doido, aquela garota que é estranha."
Ana suspirou e mudou de posição, deitando de barriga para baixo e balançando ambas as pernas que estavam estendidas no ar. Havia uma caneta em sua boca, que era mordiscada enquanto a garota pensava. Como de costume, seus olhos viajavam pelo quarto e pareciam ver além do que eu poderia descrever aqui.
De repente, a campainha emitiu um barulho alto e horrível, mas rápido.
"Já volto", disse Raquel saindo do quarto, mas logo voltou e olhou entre mim e Ana pensativa. Ela parecia estar em um impasse no qual se perguntava qual de nós explodiria o quarto primeiro, "Não se matem", falou, semicerrando os olhos e fechando a porta.
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Se Histórias Fossem Para Sempre
Krótkie OpowiadaniaBen Wagner é um garoto de 16 anos que perdeu a mãe ao mesmo tempo que perdeu a inocência. Sem suas histórias de dormir e a tranquilidade ao acordar, ele foi se prendendo em uma prisão na qual a coerção de ser o melhor foi a única coisa que restou...