O ódio

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Era uma manhã silenciosa, Fyodor estava praticando tiro ao alvo como sempre, era um exercício de relaxamento para si especialmente após um dia exaustivo como fora o anterior. A correria de ter que cuidar de uma universidade tão grande era cansativa, mas até que era algo bom, ele era muito bom no que fazia, um homem meticuloso, prático e pontual. Infelizmente tinha um ser que fazia questão de bagunçar toda a sua rotina perfeita, este ser que apenas o fato de existir já lhe irritava, era incrível como Liert Poubel existia apenas para infernizar a vida perfeita de Fyodor. Então precisava de momentos como aquele para relaxar um pouco. O alvo era uma foto de Liert enquanto sorria mostrando o maldito canino, estava distraído e seus cabelos rubros estavam em movimento e contrastava com os olhos dourados, era uma bela imagem, parecia angelical, tipo Lúcifer, fora uma das fotos que confiscou de seus alunos que não perdiam a chance de tirar fotografias dos professores e mais ainda de Liert, já havia uma coleção em seu quarto com tantas fotos e agora as usava para praticar, mirou a arma e acertou bem no meio do nariz reto daquela figura ridícula e que lhe atiçava.

Organizar a recepção dos alunos não foi difícil, estava acostumado. Agora ter que ceder a mais um capricho de Liert para fazer uma festa, isso sim era ridículo, claro que não poderia negar, era um dos melhores profissionais daquele lugar, não negava o mérito. Iria ajeitar tudo, entregaria um evento de primeira categoria, ficaria lá por meia hora fumando e bebendo e depois sairia de fininho, isso se nada acontecesse. O que é claro que aconteceria.

-x-

Enquanto Fyodor pensava nos preparativos da festa, Lucas passava por ali e vira o administrador descontando seu ódio no alvo. Estava cansado do desentendimento dos dois adultos, cada vez mais Liert fazia pedidos excêntricos e cada vez mais Fyodor ficava puto. Era mais que óbvio que aquele sentimento era tesão acumulado, Fyodor não tratava todos daquela maneira e Lucas já tinha observado a maneira como o ruivo ficava encantado quando Fyodor lhe dava todas as atenções do mundo mesmo contrariado. Precisava de um jeito para consertar aquilo, mas como?

Mas antes precisava conversar com Fyodor. Então durante o almoço Lucas o convidou para comerem juntos na expectativa de que pudesse entender pelo menos um pouco dos sentimentos dele em relação ao professor ruivo. Se encontraram na sala de descanso dos professores, que no momento estava um pouco vazia, então o ambiente era silencioso e quieto, poderiam comer lá e discutir sem serem incomodados. 

Tinha uma mesa grande e desocupada em uma parte mais isolada, ambos se sentaram e arrumaram os alimentos que trouxeram, especialmente Lucas que trazia uma cesta imensa tão exagerada quanto ele repleta de comidas aleatórias, parecia que ia fazer um piquenique alegre, quando na verdade almocaria com o carrancudo Fyodor. Era incrível como alguém no auge dos 28 anos possuía linhas de expressões apenas por franzir a testa e sobrancelhas com tanta frequência.

- Então, você viu o Liert hoje? – começou Lucas, mas logo fora interrompido.

- Pare. Eu sei o que você vai dizer, eu sei o que você está pensando. Isso é ridículo. – disse Fyodor enquanto arrumava o guardanapo sobre o colo. – Aquele indivíduo é um inconsequente, faz de tudo para me tirar do sério e eu sequer posso negar. Só vamos deixar as coisas como estão, estou bem dessa forma.

- Sus expressões me dizem o contrário. Seus punhos fechados também. Acha mesmo isso ridículo? – dizia Lucas arqueando a sobrancelha direita e sorrindo mostrando a covinha. – Eu sei que você está louco para bater nele e marcá-lo até ele implorar por mais.

O olhar que Fyodor lançou a Lucas fora mortal, os dois se encararam por um momento, a tensão sexual evidente ali também, mas era como se estivesse incompleto, algo faltava para que eles se soltassem. Comeram em silêncio por um momento até que terminassem, logo Lucas se levantou e guardou os utensilhos agora vazios na cesta. Parecia adorável um homem de 1,90 de altura com a alça da cesta em seu braço, a contradição entre a aparência e a atitude era imensa.

- Eu entendo a negação, deve ser difícil estar em sua posição e eu sei que eu também não sou fácil de lidar. Mas fico feliz que você esteja aqui. – disse sorrindo e os dentes perfeitamente alinhados aparecendo.  – E suponho que Liert também se sinta assim. – se aproximou mais e deu um leve beijo nos lábios de Fyodor e já estava saindo quando fora puxado. 

Fyodor puxou os cabelos longos que estavam em rabo de cavalo com força e dessa vez deu um beijo de verdade, as línguas se entrelaçaram em uma dança sem ritmo, apesar de ser o mais baixo, Fyodor não sentiu dificuldade em domar o bibliotecário naqueles poucos segundos, este que estava quase cedendo em seus braços. O beijo fora finalizado com uma mordida no lábio inferior de Lucas, no local da mordida saiu uma gota de sangue e Lucas já ia limpar, mas foi impedido.

- Deixe aí. – Fyodor ordenou em voz grave. – E quanto a Liert, vou deixar que você o traga para mim. E não me olhe desse jeito, você pode ter esse rostinho, mas eu te conheço o suficiente para saber que você está louco para colocar as mãos naquele escroto. Você também não vale nada.

- Ah, é um dom. – disse Lucas enquanto saía já planejando em como capturar Liert. – E provavelmente um requisito para trabalhar aqui... 

Lucas já havia saído da sala, agora Fyodor se encontrava sozinho e seus pensamentos estavam muito turbulentos. Poderia concluir que aquele plano era deveras prazeroso antes mesmo de colocá-lo em prática. Aquilo lhe atordoou pelo resto do dia; a pobre mente fértil trabalhava insaciavelmente, impedindo que o administrador realizasse suas tarefas por completo devidamente. De fato, no fundo, almejava ter o prazer de visualizar Liert em uma outra situação fora de todo aquele clima educativo que os rondavam e, finalmente, teria a chance de vê-lo da forma na qual idealizava. Sabia que era o principal alvo das olhadas de Liert, sentia os olhos famintos queimar em sua carne nesses momentos. Tais miradas causavam uma irritação inexplicável para Fyodor, este que se segurava para não intimidar o ruivo em um ambiente qualquer da universidade. Além disso, não era o único que sentia o desejo de ter o mais velho na palma da mão, Lucas incluía-se na lista, apesar da personalidade amável era considerado a "má influência" da dupla, suspeito de instigar e persuadir Fyodor a concordar com todo aquele plano, o qual finalmente colocariam em ação após longos anos de ódio reprimido. Sentia-se ansioso e excitado na mesma medida. 

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