Noites frias de junho
Manhãs calorosas
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Detestava o frio. Seus dedos ficavam gélidos e precisava pensar duas vezes antes de tirá-los dos bolsos. O cheiro de naftalina dos casacos, às pressas arrancados do fundo do armário, embrulhava seu estômago. Sentia-se sufocada com o pescoço enrolado em um cachecol que penicava, e suas botas faziam os pés doerem o tempo todo. Odiava os longos dias de inverno e contava cada segundo para que chegassem ao fim, pois, diferente das tardes frias, nas noites havia calor.
E após um longo dia frio, quando, finalmente, pode voltar para casa e vestir seu pijama surrado, enfiou-se embaixo da coberta e aguardou. Ele entrou no quarto trajando apenas uma calça fina, o peito nu ignorando o indolente clima. Apenas com o rosto para fora do seu casulo felpudo, ela sorriu ao vê-lo aproximar-se da cama. O ar frio que adentrou pela coberta ao ser erguida logo foi compensado pela calidez do outro corpo ao abraçá-la. O calor que ansiara.
Ele era quente, naturalmente quente, o que a fez questionar, ainda no começo da relação, se não vivia em um estado febril. E o dia em que ele deixara, com sorriso brincalhão, que enfiasse o termômetro por debaixo de sua axila, apenas para constatar sua saudável condição física, ficou marcado na memória de ambos. Ele era abrasador e aninhar seu corpo ao dele ao fim do dia, após ser flagelada pelo frio, acalentava sua alma.
Com a cabeça repousando em seu peito, inspirou profundamente. O cheiro familiar de sabonete que sua pele exalava complementava seu prazer de tê-lo, enquanto suas costas eram levemente afagadas pelos dedos masculinos. Ali, debaixo de um leve cobertor, abraçada ao homem que amava, estava aquecida e protegida do vento cortante, do céu cinza e da chuva fina. Ele era calor, conforto e carinho.
Logo a manhã se fez, com a fraca luz solar a bater na janela, e ela precisou de muito esforço para arrastar-se para fora do seu recanto de aconchego. Calçando suas pantufas forradas, foi para a cozinha. Sempre que o inverno chegava repetia o ritual matutino de preparar chocolate quente, sem a bebida doce seu dia seria muito mais difícil. Ao salpicar a segunda xícara com cacau, ouviu a cadeira ser arrastada atrás de si.
- Sabe o que faz amar o inverno? - ele perguntou, acomodando-se à mesa, a voz levemente rouca - O seu chocolate quente!
A declaração a pegou desprevenida, mas o sorriso espontâneo que surgiu em seu rosto revelou o verdadeiro sentimento que a tomou naquele instante. Entregou a grande caneca de chocolate a ele, observando atentamente enquanto bebericava feliz o líquido cremoso e escuro. Talvez o inverno não fosse de todo mau e houvesse mais sobre a estação a agradar-lhe do que imaginava.
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Noites frias de junho
RomanceDetestava o frio. Quando o inverno chegava contava cada instante para que fosse logo embora. Porém, havia algo sobre o clima hostil do qual gostava: ser aquecida pelo abraço que a envolvida durante as noites de junho. Conto | Romance | Inverno