1° Olhos brilhantes

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De repente, mais uma visão.
Algo ou alguém, saindo de um lugar cuja escuridão era tão densa que não se via nada além de seus olhos. Olhos azuis brilhantes, deixando um rastro de brilho azulado pelos cantos enquanto cambaleava de um lado para o outro, como se após ter sofrido um ferimento grave, vindo em minha direção
Acordei.

Precisava avisar Noah Leewis, meu melhor amigo, sobre a visão que acabara de ter, o que a esse ponto já era algo esperado. Vivemos em orfanato, ou melhor; orfanatos, essa coisa de olhos brilhantes nos persegue, mas sempre que está perto de me encontrar eu de alguma forma.. vejo, e então, nós fugimos. Nas minhas visões, sempre que deixo Noah pra trás, a coisa o encontra e então acaba com ele, mas sempre que sou eu a ser pego minha visão simplesmente termina, tenho medo do que isso possa significar.

Levanto da cama, ainda parece ser bem cedo, quase todos os órfãos ainda estão dormindo, com exceção de alguns poucos. Noah não era um deles, podia ouvir seu ronco profundo a três beliches de distância.
Vou até a sua e subo a escada

-Noah, acorde.
Noah se debate na cama.

-Ainda não, mãe, não quero ir pra escola hoje. - Respondeu ele

Dou um golpe de quebrar tijolos na cabeça dele.

-Você é órfão cacete, e já foi expulso da escola. Levanta logo.
Então ele levanta, esfregando rápido as mãos na cabeça

-Caramba, precisava esculaxar? - Reclamou ele

-Tive outra visão, ele está vindo de novo, temos que ir. - Contei eu

-Fez sopa de mão? Quem está viado de novo? Isso não é meio homofóbico? E pra onde temos que ir? - Perguntou ele, confuso.

Percebi que ainda estava lerdo de sono.

Dei um soco na barriga dele.

-Arrume suas coisas, saímos quando anoitecer
Seguimos nosso dia como normalmente; almoçamos, rodamos a cidade em busca de informações que nos levassem até um outro lugar temporariamente seguro, quebramos vidros de casas chiques, voltamos, terminamos de arrumar nossas coisas, e então a noite caiu.
Noah ainda vestia o uniforme alaranjado do orfanato, uma calça jeans meio suja, um tênis branco e preto comum meio surrado, com meias de cores diferentes, uma azul marinho e a outra amarela, não sei se por estilo ou falta de opção, seu cabelo castanho escuro comprido estava bagunçado como sempre, o deixando com uma cara um pouco mais velha, apesar de ter só 14 anos. Um sorriso exalando em seu rosto. Não podia julgar ele em relação a estilo, meu cabelo era grande e ainda mais bagunçado, também escuro, ia até o pescoço, e a franja batia nos olhos, me deixava parecendo um pervertido de 20 anos, apesar de ter só 15. Usava também o uniforme do orfanato, de calça jeans suja e tênis preto surrado assim como os dele.

Estavamos prontos, nossas bolsas já estavam cheias de coisas roubadas da cozinha do orfanato, mas decidimos jantar antes de ir só pra garantir. Normalmente minhas visões avisavam sobre tudo com um dia de antecedência, então estávamos seguros de que teríamos tempo, sem contar que comida nunca é demais. Mal sabia eu que aquele não só seria meu último jantar normal em muito tempo, quanto também a última vez em que veria meu melhor amigo.
Terminamos, recolhemos nossas coisas e nos preparamos pra sair

De repente, outra visão, mais uma vez.
Era bem raro acontecer enquanto estava acordado, só ocorria quando a tal coisa estava próxima de acontecer, o que me deixou ainda mais preocupado.
Me vi correndo de 5 criaturas de quatro patas, como pitbulls, só que do tamanho de cavalos, ardendo em chamas, e literalmente esqueléticos. Um dos cachorros gigantes pulou em mim, então minha visão mudou. Vi a coisa de olhos azuis brilhantes, seu corpo inteiro ainda era nada mais que escuridão, tinha uma silhueta humana agora, estava segurando Noah pelo braço esquerdo, verificando a marca de dois cortes se cruzando em vermelho em seu braço, era algo estranho que tínhamos em comum, que também foi o que nos aproximou a primeira vez que nos vimos, ele no braço esquerdo, eu no direito, a dele tinha cor vermelha morta, quase vinho, o meu azul como tinta guache vencida, as criaturas que antes me perseguiam estavam agora de frente para a coisa de olhos azuis, a marca de Noah de repente começa a brilhar em vermelho sangue, meu braço aparece em minha frente enquanto minha cabeça abaixava sozinha, com minha marca agora brilhando em azul mais claro que os olhos de quem tanto me caçava.
De repente ouço um barulho alto seguido de um gemido de dor, minha cabeça se levanta e então vejo, a mão oposta da que segurava Noah agora está atravessada sobre seu peito, com algo pulsando sobre a silhueta escura de uma mão saída por suas costas, logo percebi, o coração do meu melhor amigo havia sido arrancado friamente de seu corpo.

A visão acaba e eu caio de joelhos no chão, tudo que vi se passou em questão de segundos, para Noah eu tinha simplesmente tropeçado e caído vergonhosamente no chão.

Ele começa a rir, até que percebe o desespero que se instalava em minha face.

-V-você tem que ficar. - Disse eu, tentando voltar a normalidade

-O que? Por quê? -Perguntou Noah

-Ele nos-. - Percebi que se contasse a ele que seríamos encontrados ele teria feito de tudo pra que arrumassemos outro plano, em que os dois continuassem juntos, sabia que não funcionaria, não podia deixar meu melhor amigo morrer. A coisa estava inicialmente atrás de mim, ele já me perseguia antes de que eu conhecesse Noah, depois que nos conhecemos ele começou aparecer nas minhas visões caçando nós dois, a culpa era minha dele ser tão perseguido, não podia deixar que também morresse graças a mim, se eu fugisse sozinho para onde seríamos encontrados talvez Noah não fosse pego junto comigo
Minha feição então mudou, estava sério agora

-Ele te encontrou, a verdade é que ele sempre esteve atrás de você, o destino sabia que iríamos nos encontrar, por isso eu fui tão perseguido, a culpa é.. toda sua, você é uma pedra no meu sapato, suma.
Noah travou, seu rosto transmitia espanto. - Tudo que eu disse não passava de mentira, mas precisava que ele acreditasse, sabia que morreria assim que saísse do orfanato, não podia deixar que acontecesse o mesmo com ele, preferia ser odiado.

-Do que está falando? nós somos amigos, melhores amigos, eu estive com você e você comigo desde quase sempre, nós combinamos, não lembra? se fosse pra morrer, morremos juntos! - Disse Noah enquanto fungava feito uma criança, lágrimas escorriam sobre seu rosto enquanto falava

-Não enche, realmente acreditou nesse papo de que eu morreria por você? Só precisava de alguém pra morrer no meu lugar, você sempre foi um plano B, desapareça. - Eu comecei a odiar a mim e toda minha existência por cada palavra que havia dito, é claro que eu morreria por ele, mas não podia deixar que morresse por mim, eu precisava que ele repugnasse a minha existência tanto quanto eu estava repugnando-a agora, só assim poderia mantê-lo seguro, e isso acabou comigo.
Noah parou de falar, começou olhar fixamente para o chão, e então se virou de costas pra mim

- Eu espero que você morra lentamente, Adam, espero que sofra por todos que você manipulou, você é sujo. - Após isso começou apertar seus punhos com força, virou e me acertou um soco no rosto.

-Eu te odeio.. - Ele virou novamente e então foi embora, pulando uma janela no lado contrário da qual iríamos sair juntos

Eu estava acabado.. mas ao menos, ele estava salvo agora, me joguei novamente de joelhos no chão, as lágrimas se recusavam a parar de cair. Peguei novamente minha bolsa, pulei a janela, e então comecei a correr, torcendo pra que minha morte fosse dolorosa assim como Noah pediu, até eu achava que merecia isso agora.
Continua no próximo capítulo...

Adam Sloan: O selo quebrado ("Livro" um)Onde histórias criam vida. Descubra agora