único

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talvez tenha um final feliz.

Heloísa sentiu o corpo tensionar na medida em que Matias se aproximava de Olívia, os passos dele, o joelho que insistia em travar e as pernas que andavam lentamente até a menina de cabelos castanhos, o corpo de Olívia apertou o móvel branco e ela precisou sentir a madeira fincando em seus dedos quando percebeu que estava prensada contra o móvel de madeira e Matias, Heloísa se viu naquela mesma situação anos atrás. Era diferente, Violeta estava ao lado dele, talvez Violeta acalmasse Olívia já que ela largou o móvel branco e Matias recuou.

— Essa é a Olívia, Matias. – a irmã disse cautelosa, sorrindo para agora então, sobrinha. — A filha perdida da Heloísa, você lembra?

— A menina que ninguém queria. – a voz dele saiu arrastada, Heloísa apertou o tecido do vestido até que sentisse os nós dos dedos ficarem brancos. — É ela.

Violeta deu um sorriso triste para Olívia que apenas assentiu, Matias deu outro passo para trás e logo após Olívia deu um passo para o lado, saindo da frente de Matias. Quando Leônidas apertou o ombro de Heloísa ela soltou o ar que prendia no pulmão, quando Olívia andou em passos rápidos até a mãe, que apertou a mão dela a deixando entre ela e Tenório. A barriga era um pouco visível, a angústia era maior ainda pelas três. Leônidas puxou Matias para o quarto e Violeta não entendeu quando Heloísa a abraçou, mas sorriu retribuindo.

Olívia sentou-se no sofá buscando por ar, o tecido da almofada era macio, mas nada naquela casa era confortável com a presença de Matias.

•••

Heloísa sentia o corpo doendo, a boca seca e a cabeça explodindo na medida em que tentava se mover. Leônidas parecia aéreo, ela percebeu isso quando ele respirou fundo e o corpo dele se remexeu desconfortável, os dois encararam o berço vazio, aquele que deveria ser ocupado pelo bebê deles que lhes foram arrancados logo no nascimento.

Úrsula.

Heloísa já havia passado por isso, mas era diferente, ele estava passando pela dor junto com ela. Agora ela tinha Clara, sua Olívia, mas havia perdido seu bebê da maneira mais cruel possível. Úrsula era um perigo, ela via aquilo há tempos, ela sentiu. Ela soube quando viu o berço vazio, pensou que Matias poderia ter feito algo mas naquela altura ele estava morto. – E ela agradecia a Deus por isso.

Heloísa não comia, não bebia água, não fazia nada, a não ser tomar um banho obrigada por Leônidas e Violeta, Olívia tentava empurrar a comida na sua direção mas era sempre em vão quando ela virava o rosto. Requer paciência, cuidar de quem não quer ser cuidado, requer muita paciência e Heloísa sabia, afinal foram meses cuidando do Coronel Afonso que recusava os cuidados dela mas que era obrigado a aceitar quando ela engrossava a voz e a ameaçava vender aquele Engenho velho. Mas para ela era diferente, eram cuidados diferentes de dores diferentes. O Coronel tinha a dor do remorso, a dor da morte, Heloísa tinha a dor da perda, a dor física e mental que se instala no seu corpo.

Leônidas reagia diferente, ele não conseguia parar, rodeava essa fazenda com Barbada, vez ou outra ia na vila comprar alguma coisa para suprir a falta da pequena criança que lhe foi arrancada. Violeta o flagrou chorando na varanda, os soluços se intensificaram quando a cunhada lhe abraçou, permitindo que chorasse. Eugênio estava com Heloísa no momento em que isso acontecia.

Aliás, Eugênio se mostrou um ótimo amigo e um ótimo cunhado, sempre estava lá por Heloísa e a ajudava sempre que ela precisava. Assim como fazia com Leônidas, que naquele ponto já havia saído do quarto por um chamado de Olívia.

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