Danmachi: O Campeão Coelho

Capítulo 23: O grito da serpente azul

A quanto tempo foi que isso aconteceu? Apenas alguns dias depois de Bell ir pra Orario pelo que o garoto se lembrava, apesar de não desejar lembrar.

Era noite, mas as nuvens escuras impediam completamente a passagem de qualquer luz.

A chuva caía com tanta força que era impossível acender uma tocha, mas ainda assim dezenas de pessoas estavam fora de suas casas segurando em suas mãos suas ferramentas de agricultores em uma cena que lembrava a perseguição ao monstro Frankenstein nos filmes clássicos.

Aquelas pessoas, pobres e frágeis aldeões, se reuniram em volta de uma gigantesca pilha de cadáveres que estava no meio de sua vila.

O sangue se misturava com a água da chuva e se tornava indistinguível da lama negra que sujava os pés das pessoas.

No meio daquela pilha de cadáveres, havia alguém se movendo como se inplorasse por ajuda, mas foi impiedosamente morto por um aldeão.

Um relâmpago cruzou o céu e revelou o rosto da vítima: uma criatura humanóide bizarra com rosto de hiena.

Toda aquela pilha de monstros era feita disso: monstros horripilantes com feições de hienas, os chamados gnolls.

Eles se aproveitaram da chuva, invadiram a vila no meio da noite e começaram a destruir as casas e matar as pessoas, mas foram mortos e empilhados por uma única pessoa, um garoto de 14 anos que havia entrado em fúria e conseguiu se sobrepor ao número absurdo de inimigos.

E lá estava ele, de pé em cima da montanha de cadáveres, com as roupas em farrapos e os vários cortes de garras decorando seu corpo sendo lavados pela chuva.

Naquele breu noturno, pouco mais era visto de sua imagem que uma sombra negra, mas os aldeões ainda tinham certeza de quem ele era, eles gritavam seu nome e o chamavam de herói.
Apesar de balançarem suas ferramentas como soldados se erguendo para a guerra, aquilo nada mais era do que um gesto humilde de pessoas que tentavam expressar sua gratidão.

Mas o garoto estava alheio à esses gritos. Os olhos azuis escuros se direcionando para o céu negro enquanto via um relâmpago após o outro cortando as nuvens.

O relâmpago que sumia não voltava a correr. O único sinal de que ele cruzou o céu era o trovão que vinha algum tempo depois, mas o próprio trovão também desaparecia, e mesmo que alguém tenha temido aquele som grave, logo esqueceram que ele existiu. Logo ele se tornaria indistinguível de outros trovões, bem como o relâmpago dourado que cruzava o céu se tornaria indistinguível de vários outros raios de várias outras cores.

Assim era a natureza. E assim era a vida humana. O que ditava o valor de uma vida era só um número limitado de pessoas que se importava com ela.
O garoto finalmente entendeu isso.

Após ver aquela que ele chamou de mãe caída no chão sem vida, o menino finalmente entendeu o quão pouco valia a vida humana. Ele percebeu que, fora ele, ninguém se importava de verdade com ela, ninguém sentiria de verdade a perda dela.

Talvez desse pra ele mudar isso... Não, não dava. O tempo não deixava.
Ele poderia dizer a si mesmo que poderia ter sido diferente, mas só existiria alguma diferença mesmo se ele pudesse voltar no tempo para tentar mudar o jeito dela, para tentar tornar ela alguém importante.

Talvez ele pudesse salvar ela? Não, também não teria como. De novo o tempo não deixava.
O tempo foi tão cruel naquela hora. Mesmo a criança que sua mãe morreu tentando proteger foi despedaçada pelos gnolls antes que Ball tivesse a chance de chegar. O sacrifício de sua mãe foi inútil.

Ele poderia se lamentar por ser fraco, e como poderia, mas não havia sentido em chorar por uma força que ele não tinha como obter.

Se os lobos choravam por não conseguir tocar a lua, Ball estava satisfeito ao crescer rastejando no chão.