Naquela manhã o sol brilava insesantemente, completamente diferente de algumas horas atrás, a única evidência da chuva que caiu na madrugada era a umidade presente nas ruas e sentida no ar. Mesmo sendo 5:30 horas da manhã a moça acordou, a contra gosto, graças a uma minúscula fresta entre as persianas da janela que permitia que o cômodo fosse iluminado por um fio de luz, coincidentemente seu rosto estava posicionado estrategicamente para receber a única fonte de luz que iluminava o quarto. Abriu os olhos sentindo então o seu corpo e o ambiente em sua volta, rolou na cama na tentativa de despertar completamente e se livrar da claridade inconveniente. Se desfez do cobertor com dificuldade, tentando se livrar com certa dificuldade, já que uma parte do tecido estava sob um peso imóvel no exato momento.
O corpo do rapaz parecia estar petrificado, mesmo com os esforços da menor para se livrar das amarras que o tecido fez em volta do seu corpo, ele não mexeu nem sequer um fio de cabelo. Quando se viu livre, conseguiu andar pelo cômodo pequeno, catando todas as suas roupas que estavam largadas de qualquer maneira naquele espaço, parando na frente do seu amigo, que dormia serenamente de bruços. O leve e único tecido que cobria o seu corpo, da cintura até a altura dos joelhos, revelava a sua silhueta um tanto musculosa, mas sem muito exagero, seus ombros largos e costas bem definidas despertavam até debates entre os amigos, como poderia ter o corpo atlético sendo sedentário. Porém todos os tipos de conversas que circulavam entre o grupo de amigos de ambos sobre o corpo um tanto esbelto do rapaz, pareciam não importar para a mais nova. Estranhamente achava-o perfeitamente atraente, mas tentava ao máximo evitar que esse tipo de pensamento vagasse na sua mente por muito tempo.
Depois de poucos segundos admirando o homem dormindo serenamente em sua cama, suas memórias mais recentes viram como fleshs em sua mente. Lembrou da noite que acabara de ter com seu amigo, e por Deus, mesmo já tendo feito aquilo diversas vezes, ela nunca se acostumaria com a tempestade de emoções que batiam logo em seguida. Não sabia ao certo o que sentia, só estava ali firme e forte (ou pelo menos tentando) para ver como essa história iria terminar. Talvez com um final infeliz mas para a moça aquilo seria algo de se esperar, não botava muita fé ou expectativa em algo que realmente não teria certeza de como acabaria. Estava deixando a vida lhe levar.
Balançou a cabeça alguns segundos preguiçosamente apenas para se certificar que estava no mundo real. E enfim cutuou sem o menor carinho a cabeça do amigo. Uma, duas, três vezes e ele sequer se mexeu. Então apertou entre os dedos onde sabia que era o ponto fraco do rapaz, o calcanhar , conseguindo faze-lo se mexer o suficiente para se certificar que ele ainda respirava.
- Dá pra acordar braca de neve ? tá babando na minha cama. - Cutucou o rapaz mais três vezes, até finalmente chegar ao seu objetivo. Reclamando de forma incompreensível o rapaz levantou, ainda com os olhos fechados, condenando a garota em todos os idiomas existentes, ou que poderiam existir. - Você já deveria estar acostumado, sabe que se pegarem você aqui eu posso até perder minha bolsa, se apressa e vai embora.
Ele não falou nada, não porque não queria mas sim por que sua voz simplesmente não saia, precisava tomar algumas chicaras de café pra realizar tal ato. Olhou pra garota como rotineiramente faz, ela já sabia bem do que se tratava aquela expressão de súplica, sempre tentava ignorar o fato de que isso o deixava fofo.
- Só vou fazer isso porque também quero, lava esse rosto, e não demora muito, cuidado ao sair daqui. - As mesmas advertências de sempre.
Assim que se vestiu, saiu do cubículo deixando o rapaz ainda acordando. Desceu os dois lances da escada estreita do dormitório feminino da Universidade, até a área comum para preparar o café para ambos. O prédio estava no mais completo silêncio, como a casa feminina era dentro do campus, a facilidade para chegar em todos os centros era muita, e mesmo tendo cursos matinais aquele horário não havia ainda uma alma viva (acordada) nos corredores. A jovem se preocupava com razão, uma vez que a entrada de meninos no alojamento feminino era estritamente proibido, mas algumas sempre burlavam esses tipos de enquadramentos da universidade. Quando chegou a área da cozinha, se pôs logo a preparar o café, com os ingredientes que estavam organizados em prateleiras com o seu nome adesivado, mesmo sendo um lugar de boa convivência, uma vez ou outra aconteciam enganos em relação a isso, por isso a ideia de etiquetar partes dos armários e das geladeiras.
Em poucos minutos o café já estava pronto e os dois agora sentados lado a lado tomavam o singelo café da manhã preparado pela garota, algumas bolachas industrializadas e o pote de requeijão que ja estava pra se vencer na geladeira.
- Vai ter que aulas hoje ? - o rapaz finalmente falou naquela manhã, se servindo pela primeira vez.
- Parasitologia e Analises laboratoriais, tentei deixar a segunda-feira mais leve então tirei algumas cadeiras obrigatórias. - respondeu enquanto assoprava levemente o café fazendo seus óculos ficarem embaçados.
Num ato rápido e corriqueiro, o maior tomou os óculos da jovem e os limpou com a barra da camisa. Colocando-os sobre a mesa, falou mais uma vez ainda encarando de lado a amiga.
- A gente se esbarra por lá, vou ter aula o dia inteiro praticamente, a gente pode almoçar perto da biblioteca central, a tapioca de lá é muito boa e ainda é barata. - a garota sorriu levemente, era tipico do rapaz esta em uma refeição já pessando no que vai comer no futuro bem próximo.
- Ta bom, quando tiver por lá me manda mensagem. - Soprou o café mais uma vez antes de dar um longo gole no liquido meio forte meio amargo.
- Já falei que adoro o seu café ?
- Todos os dias quando me suborna. - sorriram juntos. - Termina isso logo, daqui a pouco os guardas começam a fazer a ronda, nessa parte do campus.
- Quase 6 horas, vou meter o pé. - Falou tomando um longo gole do café, terminando tudo de uma vez só, passou mais uma certa quantidade de requeijão na bolacha, dando uma mordida considerável. - Mais tarde te mando mensagem. - antes de sair limpou a boca, deu a volta no balcão central, lavando rapidamente a xícara que havia sujado. -- Se cuida. deixou um beijo estralado no topo da cabeça da menor, que apenas sorriu e o viu saindo pelas portas de vidro do Hall principal da área de convivência.
Viu o corpo do rapaz sair das suas vistas, e se pegou mais uma vez pensando na relação que estabeleceram até chegarem ali naquele ponto. Quem vê de fora, não daria nada e rotularia como dois jovens namorados.
Triste realidade. Um acordo estabelecido entre dois jovens universitários, bêbados e frustrados na vida amorosa, acadêmica e financeira.
"Vamos apenas se curtir, dessestresar e esquecer os problemas, sem exigências, sem rinchas, sem satisfações ou cobranças, apenas sexo e diversão."
Sabia que não deveria ter entrado nessa, mas sua queda (um crush quase platônico) pelo maior fez seu coração agir mais rápido que o seu cérebro, e quando deu por si acordou nua, em uma cama e quarto desconhecidos, deitada sobre um peitoral levemente musculoso. A partir daí, suas melhores noites tem sido na presença do amigo, odiava admitir para si mesmo, mas gostava de tudo isso no final, se sentia viva por alguns minutos. E agora a 5 meses, se encontram aleatoriamente para suas "sessões terapêuticas" com o amigo. Ela gostava dele, desde sempre, desde que o viu pela primeira vez no centro em que seus cursos são comuns. Era apaixonada não podia negar, mesmo que tentasse, sua mente ansiosa lhe constatava que se talvez ele soubesse desse fato acabaria com o acordo. Temia de que forma toda essa história poderia terminar.O jovem por sua vez, gostava da garota, afinal se não gostasse não teria esse tipo de contato. Para ele tudo era 8 ou 80, quando gostava de alguém ou de algo, bom, faria de tudo pra manter a amizade e o clima amistoso, mas quando não gostava de algo, era uma caso perdido, nem conseguia disfarçar. A forma sutil e vagarosa que a menina entrou na sua vida, fez com quem a sua presença fosse cada vez mais diária, tornando difícil desassociar sua imagem, de lugares ou informações compartilhadas em alguma roda de diálogo. Ela se tornou parte da sua vida, da sua rotina, e estranhamente se sentia bem com aquilo. Em um momento de frustração decidiu propor a amiga que fizessem um acordo, mesmo a vendo de forma comum, era homem, não podia reprimir seus instintos naturais, a achava atraente. Não lembra bem o que e como as coisas aconteceram naquela noite, mas algo dentro de si havia gostado e depois de mais duas vezes, percebeu que queria continuar, no fundo achava que era a coisa certa a se fazer.
Sentiu que poderia proteger a garota, poderia lhe acolher e claro os dois se beneficiariam nessa história.
Por algum motivo sentia muito, só de pensar que em qualquer momento as coisas poderiam mudar e da mesma forma que a garota entrou na sua vida poderia simplesmente sair. Estava acostumado a ter uma rotina com ela, não saberia o que fazer se a perdesse. Sentia que ela poderia escorrer a qualquer momento das suas mãos da mesma forma que amigos passados.
Continua ? ....