07. A receptora

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- Amor... Do que tá falando? Como assim "espécime"... Você precisa me explicar algumas coisas... O que foi aquilo...

A toalha que a envolvia foi ao chão. Caminhou com uma firmeza quase teatral em direção ao rapaz confuso. Sentado sobre a beira do colchão, ele apenas moveu o olhar a acompanhá-la. As íris castanhas não estavam mais da mesma forma que ele tanto admirava. Chocou-se com o forte tom alaranjado, quase inumano, ameaçando-o de volta através daquele olhar carregado de ódio.

- Amor... Que isso nos seus...?

Ele sentiu a mão suave sobre seu rosto. Até um passado recente, aqueles dedos sempre se mostraram afáveis, mas o toque envolveu sua face com uma força nunca presenciada. A palma colou-se em seus lábios. O rapaz esboçou um movimento lento e trêmulo para remover a pressão, porém seu antebraço foi contido.

- Pelo visto, terei de educá-lo antes de extrair utilidade de sua carne fétida.

Os olhos do homem se esbugalharam sob as sobrancelhas apavoradas.

- Sim, eu personifico algo que faz parte do conjunto de sentimentos que vocês definem. Contudo, esse sentimento não é o que utiliza para nomear esta humana que habito...

Os dedos pressionaram mais forte sobre seu rosto, cravando as unhas bem cuidadas nos cinco pontos em que alcançavam. O alaranjado dos olhos se tornou mais vivo e intenso.

- Não sou esse tal "amor"...

- Serviço de quarto! - interrompeu uma voz abafada, acompanhada de três batidas na porta.

Aparentemente inerte ao aviso que veio de fora, manteve o olhar intenso direcionado contra a face do homem.

- Parece que temos mais um espécime disponível... - sussurrou ironicamente, referindo-se ao som que vinha da porta.

A pressão dos dedos sobre o rosto se intensificou, tendo gemidos abafados como resposta. Ele levou as mãos ao rosto para tentar se desvencilhar. Forçou o anelar utilizando a mão esquerda e o polegar com a mão direita, mas sem sucesso. Sua força não surtia efeito contra a mulher dominadora. As unhas cravaram-se mais na face, denotando que o formato e o tamanho delas iniciaram uma mutação lenta. As pontas começaram a perfurar a pele. O tom alaranjado dos olhos brilhou feito uma chama.

Novamente, uma voz abafada veio da porta, mas dessa vez se mostrou acompanhada.

- Acho que o quarto tá vazio...

- Tá nada! A porta tá destrancada! Abre isso aí...

- Vou bater de novo...

- Abre logo essa merda...

As perfurações no rosto se alargaram e as unhas começaram a raspar o osso do crânio. Os gemidos abafados se tornaram urros desesperados. Começou a socar o braço e o tronco da mulher com intensidade, mas sem efeito.

- Parece que você ainda não entendeu, espécime... Não há o que possa fazer!

O braço da algoz o ergueu, forçando o sujeito a se levantar.

- Tá ouvindo isso? Tem um barulho estranho vindo lá de dentro...

- Eu disse que tem alguém...

O homem se viu com apenas as pontas dos pés coladas ao chão. Tentou sustentar seu peso enquanto era erguido pela face. Seu rosto se deformava cada vez mais enquanto os dedos invadiam os rasgos desferidos em sua face. Deixou de socar a opressora e voltou a tentar remover a mão de sua cabeça.

- Tem algo de errado lá dentro...

- Sai da frente! Deixa eu entrar...

- Espera! Escuta isso...

A protegida e o demônioOnde histórias criam vida. Descubra agora