Capítulo 18

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     O chá desce queimando minha garganta e eu quase derrubo a xícara de tanto que minhas mãos tremem. Ainda sinto o cheiro do sangue. Ainda ouço o som da lâmina cortando. Ainda vejo o ódio nos olhos daquele guarda.

     Bruxa.

     Não estou tão familiarizada com a palavra, mas sei o que ela significa e sei o que pode ter passado pela cabeça do homem quando me ouvir dizer que eu traria a magia de volta a Omem. O que eu desconheço, no entanto, é o motivo da histeria violenta dele. Quer dizer, o que poderia acontecer de tão horrível se a magia, há séculos afastada, retornasse ao nosso reino para nos defender de inimigos?

     Ou melhor, o que aconteceu para que a magia fosse banida?, pergunto a mim mesma.

     Estou cercada de criados e guardas e nenhum deles poderia me dar o tipo de esclarecimento que eu procuro, então chamo por Hallux - da maneira convencional, por mensageiro, para que ele não assuste ninguém com seus poderes de quase onipresença.

     - O curandeiro real já foi chamado, Majestade - diz uma criada, tirando a xícara vazia de minhas mãos trêmulas. - Ele já deve estar chegando.

     Sacudo a cabeça.

     - Não preciso. Mande o curandeiro até a cela do Quarto Conselheiro e faça com que ele cuide daquele ferimento - ordeno ao guarda mais próximo.

     - Sim, Majestade.

     - Você - olho para a criada.

     - Sim, Vossa Graça?

     Estendo a mão para ela.

     - Me ajude a levantar.

     Minhas pernas parecem líquidas e não me transmitem segurança nem quando eu apoio os pés no chão. Respiro fundo, lembrando a mim mesma de que estou bem, estou segura e ilesa e cercada por guardas leais. O pior poderia ter acontecido, mas não aconteceu. Não aconteceu.

     O capitão da guarda chega aos meus aposentos, que nunca estiveram tão lotados, e parece capaz de decapitar com sua espada recém-polida qualquer um que o contrariar. Os guardas sob sua autoridade abrem caminho para ele e ele para diante de mim.

     - Majestade - faz uma reverência com a cabeça, os olhos acesos por ódio puro -, o traidor foi capturado e será executado assim que o sol nascer, como dita a lei. Cuidarei de tudo pessoalmente.

     Engulo em seco, apoiando-me na criada que gentilmente me sustenta de pé.

     - Eu quero... quero interrogá-lo antes disso - digo. - Quero saber por que ele fez aquilo.

     O capitão franze as sobrancelhas alaranjadas.

     - Ele está fora de si, Majestade. Diz coisas absurdas sobre bruxaria e magia e sandices que não existem e arrumará qualquer desculpa para escapar da execução. Ouvi-lo é perda de tempo.

     Ouço alguns murmúrios e os guardas abrem caminho para uma nova figura que adentra meu quarto.

     - Seu capitão tem razão, querida.

     É minha mãe, séria e pálida. Vê-la faz alguma coisa louca com meus nervos e eu sinto uma vontade absurda de chorar de medo pelo que poderia ter acontecido para que ela, pela primeira vez em toda a minha vida, me abraçasse e me consolasse dizendo que está tudo bem. Porque, sinceramente, estou um pouco cansada de dizer isso a mim mesma.

     - Enxugue suas lágrimas, Majestade - sussurra minha mãe, tomando o lugar da criada ao meu lado -, e ordene uma execução imediata. Agora.

     Olho para ela, meio incrédula.

Dever e Fidelidade #2Onde histórias criam vida. Descubra agora