O meu alarme tocou.
Quando coloquei meus pés no chão, senti um leve choque. Alguma coisa me dizia que aquele dia marcaria minha vida para sempre.
Calço-me e caminho em direção ao banheiro. Pego minha escova e dentes e, de repente, me olho no espelho. A imagem refletida mostrava meus cabelos jogados para todos os lados, remelas, olheiras. Aquela noite não havia sido um das melhores.
Foi uma noite estranha. Havia sonhado com um quarto escuro, onde vozes diziam atrás das sombras: "Siga o caminho da direita". Outras vozes diziam "Siga o caminho da esquerda". Não conseguia ver quem estava falando, e isso me deixou acuado. O que elas queriam comigo? Não sabia que caminho seguir. Simplesmente não queria ficar ali. Então decido dar meia volta e correr. Correr do quê? Não sabia. "Volte aqui! Não seja covarde. Ou sofrerá as consequências adequadas", disse uma voz no meu ouvido.
Volto à realidade em um movimento brusco, que me faz desequilibrar.
Logo após essa sessão de lembranças, contínuo a me lavar. Assim que termino, ouço uma voz me chamando da cozinha.
- Léo? Já se levantou querido? – ela gritava – Vamos logo, não vai querer perder a primeira aula, não é?
- Já estou descendo mãe – respondi, tentando tirar minha camiseta – Só vou trocar de roupa!
Volto ao meu quarto, e o cheiro da comida invade o cômodo, fazendo meu estomago roncar. Estava mesmo com fome, então me troquei o mais rápido que pude, e desci os lances de escada.
Minha mãe estava me esperando, segurando uma xícara de café, sentada sobre a mesa de mármore.
- Bom dia Léo – seus cabelos loiros caíram sobre seus ombros - Como passou a noite?
Tive receio de contar o que havia acontecido. Sentia-me um covarde, então resolvi mentir.
- Foi ótima – abri um sorriso falso – Acho que nunca dormir tão bem na minha vida – como eu mentia mal, pensei.
Pego uma xícara e a encho de café, tentando manter meus pensamentos distraídos. Tinha que manter o foco em outras coisas. Bárbara, minha mãe, terminou seu café, apoiando sua xícara na mesa.
- Vou chamar seu pai para que ele te leve à escola – ela me deu um beijo na testa, saindo para o quarto dela em seguida.
Enfim, sozinho. Tentei não pensar no sonho. "Faça a escolha, ou sofrerá as consequências adequadas". O que aquelas vozes queriam dizer com isso? É tudo um sonho, digo a mim mesmo. Sonhos não são reais. Sonhos não podem ser reais! Ou podem?
Fico tão envolvido em pensamentos que nem percebo meus pais chegando na cozinha:
- Bom dia filho – meu pai acenou com a cabeça – O que tanto pensa aí?
- Coisas de escola pai – não gostava de mentir, odiava esconder coisas dos meus pais, mas agora era necessário.
Ele abriu um sorriso, e se sentou à mesa.
- As pessoas precisam parar de pensar tanto, e começarem a agir mais. Do que adianta um sonho, se não é colocado em prática? – Thomas, meu pai, tentava fazer as pessoas pensarem mais no futuro, a terem uma motivação. Minha mãe é uma pessoa que sempre diz para darmos mais valor às coisas enquanto as temos. Nós só percebemos o valor de algo quando a perdemos. Meus pais são os melhores pais do mundo – Vamos filho, termine seu café. Vou te levar à escola.
Esvaziei meu copo em um único gole, seco, e o deixo em cima da mesa. Subo a escada, e entro no meu quarto. Pego minha mochila, e volto pra cozinha. Meu pai já estava com as chaves do carro na mão.
- Pronto filho? – assenti – Então diga tchau à sua mãe, e vamos!
Viro-me a ela, e dou-lhe um abraço aperto. Um daqueles abraços que te deixava em segurança, algo que não deveria acabar nunca mais.... mas acaba, quando sinto seu corpo descolando do meu. Um último ato de afeto, um último beijo na testa.
Entrei no carro, coloquei o cinto, e tive a impressão, queria eu que fosse somente impressão, de que aquela seria a última vez que veria minha família feliz. A última vez que eu teria uma vida feliz.