𝐃𝐎𝐈𝐒

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CAPÍTULO 02
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Inglaterra, 1831

[Lady Torrington]

As luzes entravam tímidas pelas cortinas grossas do meu quarto e a escuridão, tão convidativa, fora deixada para trás, no momento que minhas pálpebras abriram e me deparei com aquele feixe de luz irradiando o calor de um sol que, para mim, não era o que eu queria. Revirei meu corpo cansado nos lençóis pesados — mesmo com o suposto sol caloroso lá fora, o inverno chegava e com ele a urgência do aquecimento até da alma.

Respirei profundamente sentindo os músculos das costas doloridos, depois de tantos apertos dos espartilhos e corsets. Minhas costelas também estavam suplicando por um descanso, mas esse não seria possível dados os recentes acontecimentos e minha mais nova posição dentro da casa. Meu pai, Duque de Torrington havia falecido a alguns dias e agora eu seria a única carregando um título — Lady Torrington — até que casasse e um novo Duque assumisse.

O casamento era uma coisa impensável para mim, dada a minha promessa ao único, verdadeiro e sempre eterno amor. Yuji Itadori. Agora com vinte anos, eu já devia ter desposado de um rico e intitulado rapaz, mas eu preferia tentar ao máximo negar as idas aos bailes da capital. Permanecia sempre no campo com falsas desculpas de doenças mirabolantes, que faziam meu pai questionar a minha sanidade constantemente e assim não me obrigava a frequentar tais recepções e frivolidades típicas de uma debutante.

Diferente das donzelas, que haviam feito aulas e aulas para estarem lindas e preparadas para a vida de esposa, eu amava o campo e constantemente dava trabalho a Utahime, escondendo-me e esgueirando das lições de uma lady. De nada preocupava-me em ser achada, afinal, o único que sempre me encontrava e me rendia em suas paixões era o dono de olhos castanhos calorosos e meigos. Nessas horas de lembrança, meu peito apertava e uma lágrima ousada insistia em deixar meus olhos marejados, perdendo-se em um emaranhado dos meus fios de cabelos e nos travesseiros de penas que eu abraçava durante a noite.

Ouvi um barulho vindo da porta e levantei a face "amassada" do sono para os olhos castanhos de Utahime, que me sorria gentil.

— Pronta para o dia, milady?

— Eu bem que gostaria de dizer que nasci pronta, mas hoje... eu estou só assustada.

Vi a moça alguns anos mais velha do que eu vir até onde estava e, me ajudando a levantar, rodeou os braços envolvendo meu corpo em um abraço caloroso.

— Eu não vou a lugar algum, eu sempre vou estar ao seu lado.

— A última pessoa que disse isso, partiu e nunca mais voltou, Hime...

— Yuji teve de ir, minha querida, mas ele pode um dia voltar.

— Não tente me dar esperanças, eu já deixei de alimentá-las há anos e estou bem assim.

Larguei do abraço e fui a frente do grande espelho que adornava meu quarto, uma enorme tina de banho estava ali presente pronta para as higienes matinais. Com um comando de Utahime, algumas aias entraram trazendo água morna e toalhas secas, enchendo o compartimento e saindo em seguida me deixando sozinha para que eu me despisse. O fiz e assim que entrei na grande banheira de madeira, senti toda a tensão dos momentos anteriores ser deixada para trás e as águas perfumadas inundaram a minha pele numa carícia sedosa e tranquila.

Encharquei o corpo e vi pelo reflexo, meu semblante cansado, relaxar. Respirei fundo mais uma vez, mas agora não tive o corpo dominado por dores e sim minha mente. Não era dor, era saudade dele, da pele, do calor, da maciez do toque das mãos ásperas e dos beijos em cada pequena parte do meu rosto. Da voz, eu sentia falta do timbre calmo e sutil que ele me chamava, raras vezes pelo nome — ele insistia em dizer que milady era mais bonito, mas acabava por não conseguir pronunciar quando criança e ficava apenas insistindo em me chamar por adjetivos, o mais comum deles era "teimosa", o que eu era e sou, realmente.

𝐈𝐃𝐈𝐋𝐈𝐎, 𝐘𝐮𝐣𝐢 ℮ 𝐒𝐮𝐤𝐮𝐧𝐚Onde histórias criam vida. Descubra agora