LAR

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O sol brilhava lá fora quando Irene finalmente abriu os olhos. Ela rolou na cama e levou a mão até o celular que estava repousado na cabeceira ao seu lado. Ainda com sono, se esforçou para ler uma única mensagem, enviada por sua mãe no dia anterior.

"Boa noite, querida, como está? Não nos vemos há muito tempo e estava pensando em fazer uma visita ao seu lar. Podemos agendar um dia que fique bom para você?"

Ela pensou se devia responder, mas finalmente resolveu ignorar e deixou o aparelho de lado. Estava exausta desde a noite passada, que havia sido intensa. Apesar disso, sentia-se pouco satisfeita, apesar de achar que tinha sido divertido. Algo a estava incomodando e ela não conseguia perceber o que. Sentia um vazio, um incômodo.

Levantou-se e foi tomar um banho para mais um dia de trabalho. Antes de sair de casa, pegou sua bolsa e certificou-se que estava tudo ali. Só carregava o essencial: sua carteira, o smartphone, um estojo de maquiagem, uma faca retrátil e um revólver. Ponderou se precisava de mais munição, apesar de que esperava não precisar usá-lo hoje. Novamente concluiu que seria muito mais prático se a realidade pudesse lhe dar munição infinita.

Com tudo pronto, Irene deixou sua casa. Trabalhava a poucos quarteirões dali, então sempre ia para o trabalho caminhando. Porém, ao sair pelo portão, travou no meio da calçada. Bem em frente dela, acenava e sorria uma pessoa que ela pensava que não veria mais. Seu colega de trabalho, Renato, que ela tinha certeza que estava morto.

- Que ótimo dia, minha linda. - Ele disse, sorridente. - Estava indo ao trabalho e resolvi te esperar para irmos juntos.

De repente, o humor de Irene desabou. Com um rosto emburrado, passou pelo homem em silêncio. Ele seguiu-a.

Irene tinha certeza que Renato estava morto. Afinal, na noite passada ela drogou-o, torturou-o, esquartejou-o, colocou seu corpo dentro do carro e o jogou no rio. Agora, vendo aquele rosto novamente à sua frente, seu dia estava arruinado.

- Estava pensando, que tal se depois do trabalho a gente sair para nos divertirmos? - ele falou. Irene soube então que nada da última noite restava na memória daquele homem.

Quando chegaram em frente a um vão entre dois grandes prédios, Irene puxou o homem pelo braço. No espaço escuro onde a luz do sol não alcançava, ela empurrou o homem contra a parede do prédio oposto, tirou a faca da bolsa, revelou sua lâmina e correu-a pela garganta dele. Seu pescoço tingiu-se de vermelho com o sangue e, com os olhos ainda abertos, seu corpo escorreu desfalecido para o chão.

Irene encarou o cadáver à sua frente e olhou para si própria. Apesar de tentar ficar afastada do homem ao realizar o ato, sua camisa tinha sido manchada com o sangue. Ela deixou escapar um suspiro cansado.

- Olha o que você fez. - Ela falou, apontando a lâmina para o cadáver no chão. - Não posso ir trabalhar assim, posso? Por sua culpa, vou ter que voltar, trocar de roupa e chegar atrasada.

Ela voltou para casa, trocou de roupa, limpou a faca e voltou para a calçada. Lá estava Renato novamente, sorrindo e acenando como se nada tivesse acontecido.

- Que ótimo dia, minha...

Antes que ele pudesse terminar, Irene já tinha passado por ele.

- Estamos atrasados, idiota.

***

Irene trabalhava como colunista para uma revista com público alvo jovem. Uma de suas funções era responder e-mails de leitores. Naquele dia, ela resolveu responder alguns que haviam sido selecionados.

"Olá, Irene. Eu acompanho a revista desde seu lançamento e sou seu maior fã. Você tem uma sensibilidade muito humana respondendo as pessoas. Está claro que é uma pessoa muito empática e conhece com profundidade o coração do próximo. Gostaria de pedir ajuda em um dilema que me encontro. Esses dias conheci uma garota incrível e, nunca pensei que falaria isso, mas gostaria de viver uma vida com ela. Eu acho que seríamos muito felizes juntos e não consigo deixar de pensar nisso. Mas nos dias de hoje, todos estamos conectados quase o tempo todo. Eu queria me declarar, pedir para viver junto dela, mas preciso pedir para ela desconectar para que isso ocorra. Você acha que eu devo seguir em frente?"

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