Capítulo 1: Início do fim.

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Se o fundo do poço fosse um lugar real, e não somente uma metáfora, sem dúvidas esse lugar seria no Rio de Janeiro, mais especificamente na Av. Atlântica Prédio 1001 elevador parado no 13º andar decorado por desespero e uma depressiva mini árvore de natal. A decoração combinava perfeitamente com o humor de Gabriela Abelho naquele momento, não me entenda mal, Gabriela não era nem um tipo de monstro que odiasse o natal como o Grinch. O que ela odiava, era aquele dia específico, mas para entender isso precisamos voltar um pouco no tempo.

Amanda usou sua mão livre para chamar o elevador, enquanto equilibrava o celular, chaves e um copo de café gelado na outra mão. 


-Então quais são as expectativas para o dia de hoje?


-São 7:00 da manhã, Amanda. Muito cedo para criar expectativas. -Respondi bebericando um pouco do café gelado que Amanda havia me presenteado poucos minutos atrás, na minha opnião café gelado era um crime contra a história do povo brasileiro mas o calor de 40 graus do Rio de Janeiro não deixava que café quente fosse uma opção para qualquer pessoa sã.


-Na verdade, são quase 8 horas, e nós vamos fingir que você não passou a semana olhando apartamentos que você e Otávio poderiam financiar com seu novo salário? 


Não respondi, apenas continuei assistindo os números dos andares passarem até as portas do elevador abrirem em nossa frente. Entrei e apertei o botão para o 17º andar, mais duas pessoas nos acompanharam, tive que me segurar para não revirar os olhos quando o cheiro de maresia preencheu minhas narinas. Alexander Harris, comentarista de esportes radicais para a TV aberta, deu uma piscadela acompanhada por um sorriso de lado ao se esgueirar ao meu lado para apertar o botão do andar de esporte. Harris era péssimo, e todos o amavam, inclusive Amanda que fez uma careta quando a flagrei retribuindo a piscadela. 


-Ok. Eu começo então.-Disse continuando o assunto das expectativas. - Hoje, as minhas expectativas são de conseguir o orçamento para aquela matéria sobre modas relâmpago, acho que posso encaixar algo relacionado aos feriados de fim de ano. "Por que comprar roupas que estão em alta como presente de natal é um desperdício de dinheiro." Renderia clicks, a revista ficaria feliz e eu poderia sugerir a ideia de ter minha própria coluna de moda no próximo semestre. Todo mundo sai vencendo, agora é sua vez.
  Amanda começou a trabalhar para a revista no mesmo dia que fui aceita no estágio do jornal, 4 anos atrás, e desde então somos melhores amigas. Ela é uma mulher jovem e gorda, e seu maior desafio era que sua chefe que se auto declarava odiar padrões de beleza, mesmo depois de cinco cirurgias plásticas, deixasse ela escrever alguma coisa além de "10 looks para garotas grandes", "como o pretinho básico pode ajudar a esconder seu culote'. Assim como meu desafio no jornal era fazer o editor chefe entender que não é porque sou uma mulher negra falando de política que todas as minhas manchetes precisam ser sobre racismo. 


-Recebi uma mensagem ontem do Rafael dizendo que precisava conversar comigo urgentemente, então vou aproveitar para tentar mostrar as ideias que tive para a coluna de política. -Esse era o único motivo que as 8:00 da manhã de 24 de dezembro eu estava dentro de um elevador no prédio 1001- Depois vou jantar com a família de Otávio, e ele disse ter uma surpresa então comprei um vestido novo.-A boca de Amanda fez um O perfeito. -Se tudo correr como planejado até o dia 31 de dezembro terei um emprego novo, um apartamento duas vezes maior do que aquele "apertamento" e..


-Um anel com uma pedra enorme no dedo! -A voz de Amanda saiu mais estridente que o normal, revirei os olhos como se não concordasse. Mas é claro que Otávio estava planejando me pedir em casamento, na virada de ano vamos completar 5 anos de namoro. Por qual outra razão ele diria que eu teria uma surpresa hoje a noite?


 Amanda prosseguiu em planejar todo o meu casamento em dez segundos, incluindo lírios, luzes do filme da rapunzel e robôs gigantes que soltam fumaça colorida -me perdi nessa parte-uma leve risada seguida pelo som de algúem limpando a garganta me fez olhar pelo reflexo das portas espelhadas e encontrar os olhos de Alexander Harris me encarando com um sorriso idiota no rosto. As portas do elevador abriram e ele passou entre Amanda e eu, negando com a cabeça como se tivesse ouvido a piada do século. E é por isso que afirmava com toda a certeza que Harris é a pessoa mais desprezível de todo o Rio de Janeiro.
O 13º andar estava vazio, exceto por dois pobres estagiários que pareciam mais zumbis, todos estavam em casa aproveitando a véspera de natal com a família e amigos.  Caminhei até a minha mesa, o barulho do salto batendo no chão parecia duas vezes mais alto agora que não estava sendo abafado pelas conversas do ambiente.  Não pude deixar de dar uma rápida olhada para a sala do editor chefe, as paredes de vidro mostravam que a sala estava vazia e meus planos teriam que esperar mais um pouco, o relógio sobre minha mesa marcava poucos minutos após as oito, o que significava que Rafael já deveria estar aqui.
Duas horas se passaram, estava terminando de editar a publicação da próxima semana quando Ellen me chamou para tomar um café na cozinha. Ellen é provavelmente minha única amiga no andar e não digo só hoje que o andar está vazio, ambas deixamos Minas Gerais para correr atrás do sonho do jornalismo, e já tinha me confessado antes que eu também sou uma das únicas amigas dela no andar, embora achasse minha falta de colegas de trabalho um pouco patético.

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⏰ Última atualização: Jul 28, 2022 ⏰

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