I - Uma surpresa

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Era uma agradável tarde de sábado na Capsule Corporation, no início de uma primavera modorrenta e cálida. Fazia um tempo excelente para um passeio em família, aproveitar o sol e descontrair de uma longa semana de afazeres costumeiros, mas a família não se decidira por uma incursão no exterior. Reunia-se, o que era coisa rara, pois nunca estavam todos juntos a partilhar qualquer coisa, nem que fosse o mesmo espaço, no grande salão do complexo.

O enorme ecrã da televisão de última tecnologia dominava o compartimento, abarcando uma enorme porção de parede. Estava a ser transmitido um programa de variedades, música e divertimento com muita guincharia pelo meio, letras coloridas coladas aos cantos superiores ou dançando ao sabor da melodia, o par de apresentadores trajados de azul e verde a fazerem malabarismos com o microfone e com a voz, quando anunciavam os próximos convidados.

Esparramado no sofá, Vegeta assistia ao programa com o controlo remoto numa mão. Depois de ter percorrido vários canais, tinha-se detido naquele, pois ali se exibia a estupidez da raça humana em todo o seu esplendor. Contemplava as idiotices desempenhadas pelos apresentadores e convidados com uma expressão indiferente, olhos semicerrados, mergulhado num aborrecimento gigantesco. Mas naquela tarde de sábado não lhe apetecia fazer nada mais do que vegetar diante da televisão.

Sentada no mesmo sofá, perna trocada, costas muito direitas, ligeiramente afastada, mas perto o suficiente para que o saiyajin sentisse o perfume caro dela, estava Bulma. Via uma revista enquanto fumava um cigarro, que prendia entre dois dedos da mão direita, cotovelo apoiado na coxa tapada pela minissaia do vestido verde curto. Desfolhava as páginas com a mão esquerda. Era uma daquelas publicações fúteis sobre moda feminina que ela costumava comprar amiúde, que lia depressa – ler era uma forma de expressão, pois o que Bulma fazia, na realidade, era passar os olhos pelos figurinos. Nem sequer leria os grandes títulos e muito menos as colunas pejadas de letras diminutas que orlavam cada página. Revista que depois descartava sem cerimónias em qualquer canto da casa. Havia exemplares daqueles aos pontapés, literalmente, pois se o saiyajin não atentasse onde pisava, haveria de afastar as revistas com os pés. Enquanto se entretinha com a publicação, ignorava pomposamente o programa de variedades da televisão.

Vegeta sentiu fortemente a fumaça do cigarro indo para o seu lado, em direção às suas narinas apuradas, tirou os olhos vagarosamente da televisão e olhou a mulher, ainda folheando a revista.

- Não dá para fumar essa porcaria em outro canto? – perguntou, fungando e torcendo o nariz.

- Não vai começar a implicar, Vegeta.

- Sabe que eu odeio o cheiro dessa coisa, se for para ficar aqui, ao menos fique sem parecer uma Maria Fumaça – reclamou, voltando o olhar a grande televisão.

Bulma não queria uma discussão desnecessária, até porque aqueles vestidos exibidos glamorosamente pelas modelos em cada folha da revista valiam muito mais a pena do que uma troca azeda de palavras com o saiyajin. E apagou o cigarro.

No grande tapete felpudo diante do sofá, entre este e a televisão, Trunks, o filho do casal que tinha completado recentemente cinco anos, sentava-se entretido com jogos de construções. Tinha descoberto esse novo brinquedo depois da festa de aniversário, pois a prenda da mãe, do pai – que o pai não tinha verdadeiramente comprado, nunca tinha tempo para essas inutilidades – do avô e da avó tinha sido um conjunto impressionante de caixas recheadas de peças coloridas. Trunks já tinha misturado as caixas e ignorado as instruções que acompanhava cada conjunto. Compunha as suas próprias máquinas e veículos, auxiliado pela sua prodigiosa imaginação e pela sua incrível destreza, inventando e desfazendo, preparando talvez o futuro tecnológico da humanidade. Mas os seus esforços eram ostensivamente ignorados pelo pai que via televisão e pela mãe que desfolhava a revista.

Tempestade de PrimaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora