Sanatório das Máscaras

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Capítulo Um – O Pesadelo

    O brilho fraco da Lua traz uma camada de luz para a escura cidade. É cerca de meia noite, as ruas estão vazias. Mas não pelo horário. Elas estão tomadas pelo medo e pelo terror. Ninguém se arriscaria a sair de casa depois das últimas notícias. Mas afinal, o que tanto assusta essa população?

    Adão acorda num pulo, sentando-se na cama, ofegante. Tivera um pesadelo.

    Poucos segundos após acordar, não se lembrava mais com o que tinha sonhado. Porém, vestígios desse pesadelo pavoroso estavam presentes em sua pele. Sua testa escorria um suor frio; suas mãos estavam úmidas e geladas; sua respiração ainda tinha dificuldade para retornar ao padrão; e suas roupas, que estavam encharcadas de ainda mais suor.

    O rapaz passa a mão no rosto, na tentativa de se acalmar. Seus olhos, ainda acostumados com a escuridão, viam um quarto simples e pequeno. O quarto do próprio Adão. Afinal, onde mais ele poderia estar?

    O jovem de altura média e pouco peso pega o celular embaixo do travesseiro, no lugar onde ele sempre deixa carregando. Verifica as horas, 00:27 de uma segunda-feira. Junto das diversas notificações presentes na tela, uma chama sua atenção:

"Jornal da Cidade

Mais uma pessoa é dada como desaparecida nesse domingo. No total, somam-se 20 desaparecimentos nos últimos 15 dias, e 102 desaparecimentos só nesse ano.

Seja quem for que esteja cometendo esses crimes, está mais ativo do que nunca. Fiquem em casa, tranquem as portas e se protejam..."

    Adão arrasta o dedo para o lado, excluindo a notificação antes mesmo de ler tudo. Ver sobre os desaparecimentos dava frio na barriga do rapaz. Como um estalo, ele percebeu que seu pesadelo tinha a ver com as notícias. Será que durante o sonho, ele tinha sido pego também?

    Mesmo durante todo esse tempo, ninguém tinha visto o culpado, por mais que muitos diziam que ele vestia uma cabeça de porco como máscara. Adão sabia que isso era mentira, afinal, nenhum desaparecimento apresentou testemunhas. As pessoas simplesmente desapareciam do dia para noite, e nunca mais eram vistas.

    O jovem deitou-se novamente. Mesmo sabendo que não conseguiria dormir novamente tão rápido, ele estava cansado demais para levantar esse horário da cama. Adormeceu novamente poucos minutos depois, algo que não imaginava.

    Adão era um rapaz magro, por volta dos 1.70 de altura, algo que o incomodava, considerando que já tinha quase 20 anos. Seu físico era considerado por muitos, raquítico. Seus cabelos eram negros e encaracolados, mas na maior parte do tempo estavam bagunçados. Sua pele parda realçava seus olhos cor de mel. Apesar de ser pouco vaidoso, era um homem bonito.

    O despertador tocou. Adão abriu os olhos, dessa vez, mais calmamente. A música que escutava toda a manhã vinda do despertador de seu celular parecia feita para acabar com o humor do jovem.

    Respirou fundo, desligou o celular e se levantou da cama. O relógio marcava quatro da manhã, o horário que acordava todos os dias para o trabalho de jornalista em uma pequena emissora.

     O sujeito sempre sonhou em ser jornalista. Gostava de ir em busca de informações, e se esforçava ao máximo para descobrir tudo o que podia. Porém, diferente do que imaginava na infância, seu emprego atual era diferente. A emissora dava pouquíssimos recursos para irem atrás de reportagens, além de que, o Jornal da Cidade eram muito maior em questão de público e informações, fazendo com que o trabalho de Adão pudesse ser considerado, pelo próprio, inútil.

    Após tomar um banho rápido para tirar o suor do corpo, o jornalista foi preparar um café, um de seus principais vícios, e se preparar para mais um tediante dia de trabalho.

    Enquanto preparava o líquido, algumas dúvidas passaram por sua mente. Por que estava tão suado hoje de manhã? E por que tinha a sensação de que algo ruim havia acontecido durante a noite?

    Seus pensamentos foram interrompidos pelo cheiro do café, trazendo o rapaz de volta a realidade, e, sem querer, fazendo-o perceber que estava atrasado.

     Sua rotina era a mesma praticamente todos os dias. Acordava, se preparava, saia para o serviço a pé, afinal, a cidade era pequena, e a emissora ficava a cerca de dois quarteirões do pequeno apartamento de Adão; caminhava, chegava ao serviço e buscava algo minimamente interessante que já não tivesse sido publicado pelo Jornal da Cidade.

    Durante o trajeto, ainda com o dia escuro, Adão sempre prestava atenção a sua volta. Se conseguisse captar algo ao vivo e postar antes de outras emissoras, poderia crescer na vida, e quem sabe até ser contratado pelo tão sonhado Jornal da Cidade.

    Entretanto, hoje as coisas pareciam diferentes. O jornalista mal prestava atenção a sua volta, pois algo martelava em sua cabeça. O que tinha acontecido durante a noite? Ele caminhava e, a cada passo, uma nova sugestão surgia. Talvez tivesse feito calor durante a noite? Ele dormiu com a televisão ligada e acordou para desligar? Ou talvez tivesse tido um pesadelo?

     Era isso. Da mesma forma que as ruas da cidade se iluminavam aos poucos com o nascer do Sol, a mente de Adão se iluminou. Ele tinha tido um pesadelo envolvendo os desaparecimentos. Ele acordara e olhara o celular. Uma pedra no sapato que o incomodava desde o momento que o despertador tocou finalmente tinha saído. Mas por que se sentia tão alegre com isso?

    Algumas memórias quebradas do pesadelo vieram a sua mente, e o brilho em seu rosto desapareceu na mesma hora.

    Ele tinha sido capturado por uma criatura metade homem metade porco. O lugar que estava parecia antigo e destruído, e algo de ruim aconteceu com seu eu do sonho, disso ele tinha certeza.

    Percebendo que se perdeu novamente nos pensamentos, Adão piscou forte e limpou a mente, afinal, foi apenas um pesadelo, e ele não podia se distrair, se não as coisas ficariam piores no serviço do que já estavam. Junto do foco, veio na mente do jovem uma bronca. Esquecera de ligar o gravador de áudio que sempre carregava consigo.

    Na mesma hora, ligou o gravador e o colocou no bolso. Era uma técnica que tinha aprendido em um podcast sobre jornalismo. Ele precisava estar preparado para captar qualquer coisa importante a sua volta, e deixar o gravador ligado facilitaria muito seu trabalho caso algo acontecesse. Só com esse simples gesto, ele já tinha conseguido gravar um lindo cantar de pássaros da manhã, um de seus vídeos que mais trouxe público para a pequena emissora que trabalhava.

    Faltava pouco para chegar ao trabalho. O dia já estava levemente mais claro, os sons da cidade surgiam ao longe, mas uma coisa não mudava. O medo.

    Nas últimas duas semanas de desaparecimentos, era quase palpável o medo no ar que rondava a cidade. Parecia que tudo em volta estava... morto.

    Mesmo com medo, Adão nunca deixou de ir ao serviço, e junto dele, mais diversas pessoas andavam pela cidade durante aquela manhã. Talvez um pensamento coletivo transitasse pelo cérebro de cada um: o sequestrador não agirá durante o dia, em um lugar público. Pelo menos, era o que todos esperavam.

    Em uma rua grande na avenida principal, estava uma pequena emissora, e, em frente dela, sentado na calçada, estava o jornalista alto de cabelos bagunçados, pronto para, o que imaginava ele, mais um dia chato e fracassado.

    Mas as coisas não precisavam ser assim. Se Adão descobrisse uma coisa, uma mísera coisa, talvez tudo mudasse. E se ele fosse atrás do sequestrador? Não, era uma ideia idiota, e muito perigosa. Sentado ali, esperando seu chefe atrasado chegar, o jovem olhava a sua volta, em busca de algo que pudesse despertar a chama que faltava em si.

    Foi então que ele viu algo. Algo que o fez ter calafrios. Algo que, por algum motivo, parecia familiar dentro da cabeça de Adão. Uma estrutura velha e destruída, praticamente idêntica à do pesadelo que o fez acordar durante a madrugada. Um sanatório abandonado, na esquina da avenida principal.

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⏰ Última atualização: Aug 06, 2022 ⏰

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