Deuses de Sangue [VENCEDOR WATTYS 2022]

Capítulo 15

Acreditem ou não, mas desde que fomos designados por Pavlov para entrarmos em sessões de treinamento acabamos por nunca se encontrar no batalhão. Os horários não batiam e o cansaço impedia qualquer momento de afeto.

Após três meses de treino, e próximo ao evento de comício do prefeito, fomos finalmente soltos das amarras dos superiores. Podemos nos encontrar no bar. — Finalmente! — Brindamos à mesa. — A tão esperada cerveja prometida da Luana. — Bebemos. Nunca se recusa à cerveja brindada, pois traz má sorte. Assim como nunca se bebe sem brindar, pois são sete anos sem sexo.

— 3 meses Luana! Pensei que fosse rica! — Gael debochou. A cerveja havia deixado nele um bigode de espuma.

— Quer calar a boca, Gael? — Ela contestou. — Esqueceu que a gente ficou praticamente num reformatório por 3 meses?

— Inclusive, como foi para vocês? — Questionei.

— Um inferno. — disseram em uníssono.

Eu acabei rindo das caretas de tristeza deles, mas compartilhava da sensação. Foi um período de esforço massivo e dava para ver o reflexo dele neles. A mana dos dois banhava as próprias cadeiras. Haviam ficado melhores.

— O governador não recuou nessa ideia estúpida de comício. — Luana reclamou. — Políticos são pagos para fazer merda?

— Depois da morte do líder dos Protetores a reeleição dele está ameaçada. — Gael pontuou. — É uma tentativa desesperada de revitalizar a paz ao carioca. — tomou outra golada. — Que, particularmente, é patética.

Lembrei-me dos Protetores. Após tanto tempo sem contato com eles por conta da prisão e da morte de Caleb, havia esquecido que os conhecia. — Quem ficou como líder após a tragédia? — Perguntei para eles.

— Ares. — responderam em uníssono.

— Quer parar de me imitar, escroto!

— Quem tu está chamando de escroto? Devedora!

— Eu já disse o motivo de não pagar antes, pidão!

As testas se encostaram, e duelavam para demonstrar superioridade. Faziam caretas, irritados um com o outro. Gargalhei deles. "Ares." Há quanto tempo não o via. Não me surpreendi pela notícia dele ter se tornado líder. Após o falecimento do Ruan na missão da Candelária, que era o braço direito do meu irmão, Ares era o mais poderoso para assumir.

"Caleb me dizia que Ares era tão poderoso quanto ele."

Não era para menos que ele fosse o líder.

— O que pensa tanto? — Gael me deu um peteleco na testa.

— No dia da tragédia da Candelária. Nenhum dos Protetores apareceu. Se tivessem lá... — Fiquei suspensa em ideias.

— Vamos matar o otário do Ivan. — Ele me cortou. — Confie em nós.

Afirmei com a cabeça. Só havia a eles para quem confiar agora, ainda que com um pé atrás.

— Inclusive. — Retomei. — Por falar em tragédia. Qual foi nosso objetivo na Porta do Inferno?

— Verdade! Nunca falamos sobre isso! — Luana pressionou o pomo contra Gael.

— Na época que estava preso conheci um chefe do tráfico. Ele havia me dito sobre a maga que removia pactos de selo. Só que... — Gael abaixou a cabeça. — Ela não estava lá no bar. — Ele engoliu a saliva, e revitalizou o olhar numa tonalidade séria. — É confidencial, mas há algumas semanas ela operou uma invasão ao complexo prisional de Ary Franco.

Traficantes soltos. Uma notícia que não soava nada bem. O comício do Governador gradativamente tomava uma tonalidade de carnificina que nem deveria ter.

— Ei! — Luana nos tirou do transe ruim. — Temos uns aos outros agora. Vai dar tudo certo.

Sorrimos. Ela conseguia aliviar o ambiente com facilidade. De fato, não precisávamos ter tanto medo. Era o momento oportuno para mostrarmos que não haveria problemas. Os sargentos, o tenente, e até alguns protetores, confirmaram presença na operação de proteção ao discurso do Governador.

Os desastres haviam ocorrido há um ano, e eu não permitiria que a construção de paz que meu irmão fez desabasse em terra em pouco tempo. Éramos capazes de evitar o desastre. Evoluímos o suficiente para isto.

— Se ele aparecer, vamos destruí-lo. — Afirmei.

— Ainda duvida? — sorridentes, questionaram em uníssono.