Capítulo 28

52 12 1
                                    

— Acorda seu porra! — Dei um tapa na cara do Ricardo. O Sargento despertou assustado. — Você está bem?

— Não. — Ficou sentado. Coçou a cabeça e limpou a poeira dos fios do couro cabeludo. — Consumi sangue demais.

— Jamais imaginaria que tua magia lhe causa sono. Isso te faz um otário.

Nos encaramos em silêncio. Ricardo não tinha contestação para o deboche que ele alimentou em meu peito ao longo dos treinos. O sargento sorriu.

— Você cresceu. — Respondeu. — Qual é a situação?

— Lhe trouxe a um local seguro. Um dos causadores do ataque está em combate com um dos aliados de Ivan. Estou indo ajudá-lo a deter o terrorista. — me virei para ir a caminho de Oblívio.

— Me leva.

Travei os passos. — Não posso. Você preci-

— É uma ordem, soldado. — Nos encaramos. O olhar dele era severo. Não recuaria. — Me leva.

— Ricardo! Você vai morrer se voltar nesse estado!

— Como se eu fosse aceitar um parceiro meu, sacrificar a vida por mim. — Ficou de pé. Cambaleante. Respirava pesado e dava para ver que sentia a dor no corpo por conta dos machucados. Estava sem camisa. Os Slaafs sofreram na mão dele.

Fomos para fora do beco para que pudesse recriar as asas e voar até o epicentro da missão. Segurei Ricardo pelo braço e o carreguei comigo. Quando próximos pude assistir as brasas azuis se alastraram pelos céus. A potência do fogo era majestosa tanto quanto preocupante.

"Ele deve estar usando tudo para ficar vivo." Imaginei. Acelerei o bater das asas. Precisávamos chegar logo. — Me deixe escondido! — Ricardo gritou. — No alto de algum edifício baixo! Ele não precisa saber contra quantos está lutando! — Assenti. O sargento tinha razão. Seria bom ter uma arma escondida.

Próximo do conflito enxerguei Bruno com as roupas rasgadas. A máscara de caveira permanecia intacta, e o rosto carrancudo esboçava a irritação da batalha. A nuvem negra percebeu minha movimentação, e rapidamente voou para cima de mim. Tive de mergulhar, desviei dela por meio dos becos. Tudo que tocava destruía em questão de segundos, atravessava as paredes para encurtar o caminho até meu corpo.

Alcei os ares outra vez. Busquei me afastar dela. "Ela precisa ter uma distância máxima." Fechei os olhos. O sol ardia sob as pálpebras fechadas. "Que seja blasfêmia, mas por Deus que isso tenha parado de me seguir." Olhei para baixo. A nuvem recuava muito antes do meu ápice de voo. A magia de Oblívio estava mais preocupada com Bruno do que em me perseguir.

Por um momento fiquei sem tomar nenhuma ação. Os instintos me faziam assistir o talento de combate de Bruno. Óbvio que devia ajudá-lo, mas algo não me permitia fazê-lo. "Se afaste dele por enquanto." Era como se ele me pedisse inconscientemente para ter espaço.

O favelado tocou a ponta do mindinho uma com a outra. Virou as mãos em sentidos alternados. — Não está completo! Mas vou enfiar meio quilo de fogo no teu cu! — Berrou. — Ativação de complexidade, Chamas Impuras! — O fogo o consumiu por completo. Criou uma barreira tão calorosa que nem mesmo a nuvem de desintegração de Oblívio era capaz de tocar. "Calma... a magia dele não consegue tocar na de Bruno..." Havia algo ali.

Quando emergiu do fogo, chamas moldavam caninos no maxilar inferior. Esferas azuis o rodeavam como se ele fosse o sol. A magia de Oblívio parecia ter consciência. Ela não queria atacá-lo e ser punida. Bruno começou a ganhar confiança. "Preciso achar uma abertura." Alcei o máximo de voo possível. Num ponto que Oblívio não perceberia minha presença. Bruno só precisaria me dar a abertura.

A nuvem desintegradora voou na direção dele. O favelado movimentou as mãos e duas bolas se desprenderam dele. Voaram contra o ataque do cientista, e causaram uma explosão feroz. O fogo azul se alastrava com facilidade "Parece o poder de Ares." Devia ter tanta expansão quanto. Mesmo não parecendo uma magia expansiva.

— Você está fraco! — Oblívio gritou. — Só está adiando sua derrota!

— Talvez. — Bruno rebateu. — Mas estou pronto para morrer. — Ele tocou os mindinhos. — Explosão nuclear!

Todas as esferas voaram na direção do cientista. Oblívio escondeu-se no meio da nuvem. As bolas sumiram dentro do escuro. Enquanto Bruno via-se frustrado, Oblívio sorria. — Consuma-o. — O nível de poder lançado pelo favelado o fez cair no chão. Ele não conseguia mover o corpo, tão pouco desviar do ataque.

Apenas assistia a magia de Oblívio indo devorá-lo. Quando ela chegou próximo de tocar o corpo dele algo a desviou. Melhor. Sugou. Como um aspirador, ela começou a invadir as bocas de Ricardo.

— Vocês nos estudaram! — Do alto dos escombros, o sargento falava com o cientista. — Só que não o suficiente. — Ele sorriu, mas dos dentes culmina o sangue abarrotado na boca, o próprio. — Não é só sangue que eu consigo absorver. Agora Gael!

Oblívio notou minha presença no topo do céu. Ele não havia percebido a sombra que se formou. Uma esfera de energia amarela, presente de Ose. — Morra! — Joguei para cima dele.

O impacto da explosão fez um clarão imersivo que não deixava nada ser visto. O flash branco me cegou. Ele demorou longos segundos para retomar vida e cor ao ambiente. "Essa energia..." Oblívio ainda estava de pé. Machucado e cansado, mas vivo com poucos arranhões.

— Se o Sargento ali não tivesse sugado tanta magia. Eu não teria me exposto tanto. — Oblívio apontou para Ricardo. Quando olhei o militar, ele desabou nos escombros devido a exaustão.

— Ricardo!

— Ei! — Bruno chamou a atenção dele. — Seu braço.

Quando olhou para o braço o viu queimado. Outras partes do corpo criavam queimaduras intensas. Oblívio berrava pela ardência. — Que porra é essa! — Recolhia o corpo devido à dor.

— Ivan me deu uma aula de magia há muito tempo. "Não há magia que se desfaça ou se extinga sem efeitos." Na época não entendia porcaria nenhuma. Mas agora, te vendo. Sua magia não desintegra a dos outros. Ela absorve e reduz o dano a níveis mínimos. — Bingo! Ele olhou para mim. Baixou a máscara e sorriu — Nossos ataques fizeram efeito. — Bruno caiu ajoelhado pelo cansaço.

O desgraçado estava correto. Nossas magias arderam na pele. Oblívio sentia cada centelha do corpo rasgar e arder. — Faz isso parar! — A nuvem sumiu. Ele não tinha mais forças.

Pousei perto dele. Conjurei uma espada demoníaca de lâmina fina. — Acabou.

— Opa! — Um soco.

Por reflexo, pude defender com a asa. Só não estava preparado para o chute em sequência. O rival me afastou do cientista.

— Quem? — A olhei. De cabelo rosado e corpo musculoso.

— Vice! — Ela olhou para Bruno. — Que gatinho... — Vice colocou Oblívio no colo e saltou de modo sobre humano para fora da arena.

Por um momento, quis ir atrás dela, mas logo interrompi meus pensamentos. Salvar as vidas ali eram prioridade.

— Você está bem? — Ofertei a mão a Bruno. — Venha.

Ele deu um tapa afobado. — Está achando que somos amigos agora? — Ofegou. — Ainda vou te matar.

Deuses de Sangue [VENCEDOR WATTYS 2022]Onde histórias criam vida. Descubra agora