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Thalita

-Entra logo que o bagulho é sério!

-Vish, já vi que tu num tá pra brincadeira!- entro na salinha e vejo o Terror em uma das cadeiras fumando um- Eae cara, tá mec?

-Eae Perigosa, tô só na verdinha! Como tá o moleke? Toda vez que pergunto pro teu pai ele num sabe nem dizer!

-Alguém aqui tem que trabalhar né Terror?!- meu pai olha pro Terror com uma cara de ódio- Enfim, não tamo aqui pra fofocar. Thalita, tu sabe que tô tentando fazer negócio com um fornecedor de armas de grande porte, né?!- confirmo com a cabeça- Essa semana eu vou ter que me encontrar com ele.

-Eu já imaginava que tu teria que ir mesmo, mas onde eu entro?- pergunto tentando não ficar ansiosa com a possibilidade de tomar conta do PPG enquanto ele estiver fora.

Nunca que meu pai me pediu pra tomar conta do PPG, ele sempre colocava o Terror e o Lc no comando. Antes eu ficava revoltada, pois queria ao menos ter a oportunidade de cuidar do que um dia será meu, mas depois de um tempo, entendi que não tava preparada pra cuidar de tudo.

-Tu vai tomar conta do PPG nesses dias que eu tiver fora.- eu arregalo os olhos assim que ouço sua frase. Meu pai me olha, esperando uma resposta, enquanto meu cérebro repete a frase que eu tanto esperei ouvir.

No tráfico, a prioridade sempre é o homem, e quase nunca colocam mulheres no comando. Então chegar aqui está sendo a maior realização que uma mulher que viveu e conviveu com o tráfico desde que se entende por gente pode ter. Eu sei que não sou um exemplo correto sobre isso, mas, para uma galera que vive em um morro ou em um complexo, isso aqui é uma raridade!

-Thalita, antes que tu saia comemorando, eu tenho algumas regras que tu vai ter que seguir se quiser que isso se repita!- respiro fundo pra acalmar minha mente, olho nos olhos de meu pai e digo:

-Certo, pode dizer.

-Antes que você assuma tudo enquanto eu tiver fora, vou comunicar os vapores e quero que marque presença. Se for preciso dar um susto neles para que te respeitem, faça isso. Vou deixar uma lista com as coisas que precisam ser arrumadas por aqui. Sempre confira a contabilidade certinho, veja os carregamentos também, chame o Lc pra te ajudar a ir cobrar quem tá devendo e não se esqueça de procurar alguém pra cuidar do Yago nesses dias. Pode chamar a filha do Seu Maurício pra cuidar dele. Ouvi dizer que ela tá fazendo uns bicos por aqui.

-Certo chefia, mais alguma coisa?- debocho e Terror dá risada enquanto meu pai me olha de cara fechada

-Se continuar de gracinha, vai perder a chance.

-Tô brincando paizinho lindo do meu coração- me levanto e aperto as bochechas dele, que dá um tapinha nas minhas mãos e se afasta.

-Bem, já que está tudo explicado, pode começar a me ajudar a organizar as coisas do baile de sexta.

{...}

Passamos as últimas horas arrumando as coisas do baile, quando o radinho do meu pai apita.

Radinho on:

-Chefe tem uma mina aqui querendo falar contigo. - KL fala e eu olho pro meu pai.

-Qual o nome dela?- ele pergunta, e paro de prestar atenção no que tava fazendo pra ouvir.

-Fernanda. Ela disse que quer tratar de um assunto particular.

-Vou descer aí pra falar com ela.- meu pai se levanta da cadeira e vai em direção da porta.

-Ixi chefe, dá mais não, a mina já tá subindo com o Lc.

-Esse filho da puta tem autoridade alguma no meu morro pra decidir se ela sobe ou não?

-Lc tá querendo pegar ela, aí fez isso pra agradar a vítima.

-Passando por cima das minhas ordens? - meu pai esfrega a mão no rosto e continua- Mas o que tá feito, tá feito. O que me resta é esperar esse pau no cu chegar com a mina.

-Pois é chefe, fica mec ae.

Radinho off

Como sou uma ótima filha, não perco a oportunidade de falar:

-Ixi lá vem suas putas do asfalto querendo ser fiel- dou risada da careta que meu pai faz

-Cuida da tua vida pirralha, vai atrás do cara que te deu carona depois do pagode e me esquece!

Fico em choque ao ouvir que ele já sabe do Kaique. Olho pra sua cara de deboche, e antes que eu tente inventar desculpas ou qualquer outra coisa, ele diz:

-O que foi? Acha que não sei das coisas que acontecem no meu próprio morro? Nem na minha própria casa?

-Seus vapores são uns fofoqueiros!

-Fofoqueiros não, eles são meus informantes. Entenda filhinha querida, eu sei tudo o que acontece aqui, e nada nem ninguém consegue me enganar!

-Veremos se é tão bom assim! - digo o desafiando.

Ouvimos um barulho de moto, indicando que Lc chegou com a tal Fernanda. Espero que não seja nenhuma puta do asfalto querendo dar uma de fiel ou até mesmo dizendo estar grávida do meu pai. Já basta as daqui me chamando de enteada e querendo fingir que gosta do meu maninho.

Lc bate na porta e meu pai autoriza a entrada dele.

-Licença chefia, KL te passou o recado?

-Passou sim, Lc. E assim que conversar com a mina, quero bater um papo contigo sobre passar por cima das minhas ordens.

Lc engole em seco, e olha pra porta, onde uma mina tá encostada, com duas mochilas enormes, e diz:

-Essa é a Fernanda. A mina que quer falar contigo. Fernanda, esse é o Caveira, meu chefe.

A mina olha pro meu pai, depois olha na minha direção. Encaro seus olhos castanhos escuros, sua pele bronzeada, como se passasse bastante tempo no sol. Seus cabelos castanhos, estão trançados de lado, suas roupas são simples, uma regata azul com uma calça jeans clara. Ela está com um tênis branco surrado, que tem alguns detalhes pretos nas laterais.

-Satisfação Fernanda, essa é a minha filha Thalita. - meu pai a cumprimenta- Bem, pode me contar, o que te trouxe aqui?

-Boa tarde Seu Caveira, Dona Thalita, eu vim de muito longe pra cá, pois preciso de uma ajuda.

-E qual seria essa ajuda?- pergunto desconfiada das intenções dessa mina.

-Eu queria saber se o senhor conhece uma pessoa, alguém muito especial que precisa de ajuda.

-Vamos direto ao ponto, Fernanda.

-Há uns vinte e um anos, mais ou menos, uma conhecida minha veio morar aqui no Rio, mais especificamente aqui no PPG. Nesses últimos anos, ela esteve casada com um homem que agredia ela, e fazia coisas horríveis a ela - Fernanda estremece, como se lembrasse de algo, e sinto vontade de acabar com esse desgraçado. - Mas a pior de todas com certeza foi a última, em que ele quase a matou. Ela está em estado de vida ou morte, e precisei procurar ajuda.

-E como chegou até aqui? - meu pai pergunta, querendo saber onde ela quer chegar com essa história.

-Eu soube que ela passou algum tempo por aqui, e achei que talvez o senhor a conhecesse.

-Qual o nome dela? Você tem alguma foto da época em que ela veio aqui? - pergunto curiosa demais para saber se meu pai a conheceu.

-O nome dela é Suzanne Gomes- Fernanda fala, pegando uma de suas mochilas e abrindo o bolso da frente, tirando uma foto antiga de lá.- Essa é uma foto dela, quando estava saindo de nossa cidade.

Meu pai pega a foto, analisando com uma cara de espanto. Me aproximo para observar também, vendo uma moça muito bonita, com longos cabelos castanhos, vestindo um vestido florido, sorrindo como se aquilo fosse a melhor coisa da vida dela. Estar vindo para o Rio de Janeiro.

-O que vocês são uma da outra? - meu pai pergunta, olhando nos olhos de Fernanda. Ele parece desesperado com algo, como se soubesse que tinha um segredo ali, uma pequena ponta solta em uma história e que precisava apenas da resposta de Fernanda para completar seja lá o que isso for.

Ela se aproxima, o encara e diz:

-Ela é minha mãe.

Amor ProibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora