Amor Sem Esperança

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Uma pequena one shot que fiz a uns meses enquanto não termino o próximo capítulo de OSNA (O Segredo No Acampamento). Ela se passa no começo do episódio nove de Desconjuração.
Espero que gostem S2
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Acordei ofegante com o toque do meu celular. Meu coração batia forte, era como se eu tivesse acabado de despertar de um pesadelo.
Ah, quem me dera a noite passada tivesse sido apenas um sonho.
Me sentei na cama, respirei fundo tentando manter a calma mas não consegui evitar o choro enquanto minha mente me forçava a lembrar do que havia feito.
Não tinha mais volta. Eu estava com os dias contados.
Tudo estava muito confuso e aquele maldito celular não estava ajudando a me concentrar. Peguei para o desligar, mas assim que olhei para a tela, percebi que era Arthur me ligando. Prontamente o atendi.
– Alô?
– Joui, você tá bem? – sua voz soava preocupada.
– Eu tô e você?
– Eu tô bem… – ele parecia inquieto. – Você lembra de alguma coisa?
– Você acordou agora? – perguntei.
– Sim – ele respondeu. – O que estava fazendo antes de…
– Como tá o Kaiser? – o interrompi. – E a Ivete?
– Eles tão bem, estamos todos em casa.
Soltei um longo suspiro aliviado enquanto enxugava as lágrimas.
– E você, Arthur? – perguntei. – Você tá bem de verdade?
– É… eu tô indo, né? – ele respondeu.
– Ok…– encostei as costas contra a parede. – Tentem dormir bem, descansem e amanhã a gente conversa na Ordem, pode ser?
– Tá.
– Boa noite, Arthur – disse antes de desligar.
Eu nunca tive dificuldade para pegar no sono, mas naquela noite foi praticamente impossível, se dormi por duas horas foi muito. Acordei com toque do meu celular novamente como na madrugada, mas dessa vez era uma notificação de um número desconhecido dizendo:
"Investigação Kian, 14:00"
Claramente era a Ordem avisando de uma reunião sobre a missão.
Olhei as horas, ainda eram dez da manhã. Meio tarde para mim que costumava já estar de pé às seis, mas considerando a noite mal dormida, era esperado que não conseguisse acordar mais cedo.
Levantei sem muita cerimônia. Arrumei a cama, tomei um banho, meditei um pouquinho e comi alguma coisa rápida só para não sair de estômago vazio.
Quando cheguei, a equipe praticamente toda já estava reunida na parte de cima da base da Ordem, também conhecido como o bar Suvaco Seco. Logo na entrada, vi Tristan jogando sinuca com Walter (um agente por volta dos quarenta que conhecia apenas de vista).
– E aí, Joui? – Tristan me cumprimentou. – Beleza, mano?
– Tudo certo – respondi enquanto olhava inquieto ao redor.
Meu olhar se fixou em Kaiser, que para minha surpresa, já estava me olhando antes, me segurei para não sair correndo até ele.
– Quer jogar com a gente? – ele propôs. – Para matar o tempo até a reunião.
Meu coração quase parou quando vi que Kaiser começou a se aproximar.
– Não, obrigado – respondi educadamente.
– Cê que sabe – ele deu de ombros e voltou ao jogo.
– Até mais – disse e segui para encontrar o moreno.
Eu precisava falar com ele. Eu sabia que Kaiser não estava nada bem, nenhum de nós estava depois do que aconteceu no Orfanato. Minha mente ainda me forçava a lembrar dos gritos desesperados de Liz, os civis que não conseguimos salvar sendo mortos pela Degolificada e Kaiser sendo jogado para trás e consumido pelas chamas da explosão daquela maldita granada.
Kaiser parou na minha frente e estendeu a mão para me cumprimentar.
– Joui, tá tudo bem?
Ignorei sua pergunta e segurei em seu braço em um ato impulsivo, o passando em volta de meu pescoço e o puxando para mais perto pela cintura. Ele parecia surpreso mas não se afastou, senti sua mão em minha nuca.
Naquele momento nada mais parecia importar além do homem à minha frente, não existia Seita das Máscaras, nem Ordem, nem Kian. Aquelas íris tão escuras quanto pedras de obsidiana pareciam me hipnotizar, me atraindo como um ímã.
Esse era o efeito de César Cohen sobre mim, ele me tinha na palma da mão apenas com um olhar. Meu coração disparou quando nossas respirações se cruzaram, Kaiser me olhava com certa expectativa.
Estávamos tão perto de acabar com qualquer distância entre nós quando cometi o erro de olhar para trás, me lembrando de que nossa equipe estava logo à frente.
Uma onda de vergonha percorreu meu corpo. Onde eu estava com a cabeça? Eu não podia fazer isso, não quando nossos amigos estavam nos olhando.
Rapidamente abracei Kaiser mais apertado do que o normal. Ele demorou um pouco até me corresponder.
– E-eu tô feliz que vocês tão bem – disse tentando disfarçar o ocorrido, meu rosto queimava de vergonha.
– Eu… também tô feliz que você tá bem – disse Kaiser.
– Uhum… – Arthur forçou uma tosse e abriu o braço, entendi o que ele queria.
– Licença – Soltei Kaiser e fui até o mais baixo para lhe abraçar também.
Fernando chegou na base logo em seguida, finalmente completando a equipe, e foi correndo na direção de Tristan para abraçá-lo.
– Eita! – Tristan errou a jogada ao ser quase derrubado pelo amigo. – Cê tá bem aí, mano? – ele o abraçou de volta. – O pessoal tá meio amoroso hoje, isso acontece quando a gente volta de missões mais perigosas mesmo.
– Você não tava lá com a gente – disse Fernando preocupado. – Onde é que você estava?
– Eu estava aqui jogando sinuca – Tristan respondeu confuso. – O que está acontecendo?
Antes que Fernando o respondesse, Beatrice se aproximou e estendeu os braços para que ele a abraçasse.
– Ah, é claro! – Tristan entrou na frente e a abraçou primeiro, Fernando se juntou aos dois logo depois.
Vi Beatrice cochichar algo para Fernando.
– Eles não sabem – Fernando respondeu em voz alta.
Tristan olhou para Walter que deu de ombros sem entender nada quando Erin também se juntou ao abraço em grupo.
– Rapaziada, aconteceu alguma reunião familiar e eu não tô sabendo? – ele franziu as sobrancelhas. – Que vocês tão tudo se abraçando, os outros dois lá quase se beijaram…
– Quem se beijou? – Fernando perguntou.
– Eles só tão bem cansados, Tristan – disse enquanto repreendia Fernando, Beatrice e Erin com o olhar.
Tristan e Walter claramente não se lembravam da invasão à base da Ordem no dia anterior.
– É, isso mesmo – Fernando respondeu, entendendo o que eu queria dizer. – O dia tá muito doido e eu não estava conseguindo me lembrar de algumas coisas que aconteceram ontem.
Depois de muitos abraços, uma conversa com Kaiser e Arthur sobre a invasão da base da Ordem e eu tendo que esconder o que aconteceu comigo quando nos separamos para protegê-los, finalmente o grupo decidiu ir para a parte subterrânea da base.
Algumas vezes durante a reunião percebi que Kaiser me olhava de um jeito estranho, como se estivesse procurando alguma resposta. Pronto, eu tinha deixado um clima muito estranho por causa de um beijo que nem aconteceu. Precisava conversar com ele e me explicar o mais rápido possível.
A equipe acabou se dividindo pela base para cuidar de seus ferimentos e investigar os documentos que Mia, a filha do senhor Veríssimo, nos deu durante a reunião. Vi ali a chance perfeita para me desculpar com César.
– Kaiser? – o chamei enquanto passava pela porta da sala de pesquisa.
O moreno estava sentado em sua mesa, que era decorada com várias fotos polaroid, ele parecia pensativo enquanto olhava para a foto emoldurada que tirei de Cris no sanatório abandonado de Carpazinha.
– Hum? – ele se virou para mim. – Ah, oi Joui. Quer minha ajuda para pesquisar alguma coisa?
– Não, não é sobre a missão – puxei a cadeira ao lado e me sentei próximo dele. – Você… tá bem?
– É… não – ele riu sem graça.
– O que aconteceu?
– Como você consegue ser um líder para equipe? – ele perguntou. – Como você sabe o que fazer para proteger a gente?
– Eu não sou um bom líder, mas eu tenho que tentar. Essa equipe é muito caótica, alguém precisa assumir a liderança – respondi sinceramente. – Você, o Arthur, a Ivete… vocês são a minha família. Eu daria minha vida por vocês.
– Sabe, o Thiago vivia falando que cicatrizes são motivo de orgulho porque significa que você sobreviveu, mas não tem como ter orgulho disso – ele levou a mão ao lado queimado de seu rosto. – Eu tentei ajudar vocês com aquela granada mas só piorei tudo.
– Kai… você não tinha como saber que isso ia acontecer, nenhum de nós tinha – segurei seu queixo para que ele me olhasse nos olhos. – O que importa é que você está aqui, vivo.
Kaiser sorriu pequeno, não parecia muito convencido do que eu tinha falado. Ele segurou minha mão, achei que queria que eu o soltasse, mas me surpreendi quando Kaiser a levou até seu rosto.
– Sobre o que você queria falar comigo?
– Hum?
Ele riu.
– Você não veio aqui só pra perguntar como eu estava – ele afirmou.
– É que eu… – corei. – Eu só queria pedir desculpa por mais cedo.
– Pelo o que? – Ele franziu a testa, confuso.
– Pelo jeito que eu te cumprimentei.
– Ah, tudo bem – ele me desculpou e tirou minha mão de seu rosto. – Eu só queria saber, você ia mesmo me beijar?
Ok, por essa eu não esperava. O que eu deveria responder?
"Sim, na verdade eu estou apaixonado por você, mas tenho medo de te contar e estragar nossa amizade". Não tinha pra onde fugir, alguma hora aquele assunto iria vir à tona. Eu tinha que pensar em alguma resposta e eu não acho que o convenceria do contrário apenas dizendo que não por todas situações anteriores ao quase beijo no meio da base em que eu não consegui esconder meus sentimentos por ele.
– Eu… – pois é, eu travei.
– Eu também queria, se você quer saber – ele riu envergonhado.
– Como é que é?
Ele revirou os olhos com um sorrisinho no rosto, puxou a gola da minha blusa e simplesmente me beijou. Foi simples e afetuoso, eu me sentia nas nuvens com o toque singelo de seus lábios contra os meus.
– Ô Kaiser, você pode… – nos separamos rapidamente ao ouvir alguém se aproximando, mas já era tarde demais.
– Oi, Agatha… o que você quer? – Kaiser respondeu completamente corado.
– Vocês dois… – ela apontou para nós em choque. – Eu vou contar pro Arthur!
E saiu correndo de volta para o corredor.
– A gente vai atrás dela ou…
– Não vai fazer diferença, ela vai contar pro Arthur uma  hora ou outra – Kaiser apoiou a cabeça em meu ombro.
– César?
– Oi.
– Eu gosto de você – ele levantou a cabeça para me olhar. – Eu tô falando sério, eu gosto mesmo de você.
Meu coração parecia querer sair de minha caixa torácica enquanto esperava qualquer reação dele. Ao invés de falar, Kaiser colou nossos lábios novamente em um beijo apaixonado que me tirou o fôlego.
– Eu também gosto de você.
Sorri me sentindo um idiota por não ter percebido antes que era recíproco. Aquele não foi nosso primeiro beijo, nem o segundo, mas essa história eu deixarei para outro dia, o que importa é que aquela era a primeira vez que falamos como nos sentíamos de verdade.
Infelizmente, a nossa realidade não é um conto de fadas onde a história termina com "e eles viveram felizes para sempre", às vezes é preciso se sacrificar por aqueles que ama e eu sei que a nosso história não vai ter um final feliz, mas se é assim que deve ser para garantir que ele sobreviva, que seja.
– Joui, você tá bem?
O abracei com força, não queria que Kaiser me visse naquele estado.
– Você tá chorando?
– Eu só… estou feliz que você sinta o mesmo.
Era tão injusto, quando finalmente consegui me declarar foi porque eu sabia que se não o fizesse agora, talvez nunca mais poderia. Fiquei imaginando o que não poderíamos viver se o destino não tivesse planos contrários. Meu caminho já estava traçado e não havia nada que pudesse fazer para mudá-lo agora.
Meu tempo estava acabando.

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