até os doze anos de idade me senti bonita
foi quando meu corpo amadureceu como fruta
e de repente
os homens olhavam meu quadril recém-nascido com água na boca
os meninos no recreio não queriam mais brincar de pega-pega
queriam passar a mão em todas
as minhas partes novas e desconhecidas
as partes que eu não sabia usar
não sabia carregar
e queria esconder nas costelas
peitos
eles falavam
e eu odiava essa palavra
odiava ficar sem graça ao dizê-la
porque mesmo que se referisse ao meu corpo
não me pertencia
pertencia a eles
e eles repetiam como se
meditassem a respeito
peitos
ele disse
deixa eu ver os seus
aqui não tem nada para ver além de vergonha e culpa
quero apodrecer e me juntar à terra onde piso
mas continuo de pé a um só passo
de seus dedos em garra
e quando ele avança para apalpar as esferas
mordo seu braço e decido que odeio meu corpo
devo ter feito alguma coisa horrível para merecê-lo
em casa eu conto para minha mãe
os homens lá fora estão mortos de fome
ela me diz
que não devo sair por aí com os seios aparecendo
que os meninos quando veem a fruta ficam com vontade
diz que preciso sentar com a perna fechada
como toda mulher precisa
ou os homens ficam loucos e perdem o controle
diz que posso evitar essa dor de cabeça
é só aprender a me portar como uma moça
mas o único porém
é que não faz sentido nenhum
não consigo conceber a ideia
de que é preciso convencer metade da população mundial
de que meu corpo não é uma cama
me ocupo aprendendo que ser mulher tem consequências
enquanto devia aprender matemática e ciência
gosto de acrobacias e ginástica então nem imagino
como vou andar por aí com as coxas grudadas
como quem esconde um segredo
como se a aceitação do meu próprio corpo
atraísse a luxúria de seus pensamentos
não vou me sujeitar a essa ideologia
porque o slut-shaming é cultura do estupro
o culto à virgindade é cultura do estupro
não sou um manequim na vitrine
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O Que O Sol Faz Com as Flores
PuisiAviso! Essa historia não é de minha autoria, apenas estou a disponibilizando no site. -the sun and her flowers