O Internato

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Não é uma época da minha vida que eu fale muito, então poucas pessoas sabem que eu estudei em um internato quando era adolescente

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Não é uma época da minha vida que eu fale muito, então poucas pessoas sabem que eu estudei em um internato quando era adolescente. A primeira vez que isso me deu algum orgulho foi quando coloquei no meu currículo, o que me rendeu bons resultados, já que, o internato em questão é um lugar muito prestigiado e está entre os melhores do país. Foi um tempo duro o que passei lá, mas o mais difícil foi ir embora deixando para trás assuntos não resolvidos. Agora estou voltando para aquele lugar, dessa vez para lecionar.

Estou na estrada desde cedo, primeiro de ônibus, depois peguei um táxi na cidade vizinha e faz uma hora que saímos de lá. O cansaço já está tomando conta de mim, quando vejo o telhado vermelho da torre do internato, logo em seguida o portão. Despois de pagar ao motorista, me identifico e o porteiro do internato me deixa entrar. Sigo andando por uma estrada de terra, com árvores de um lado e do outro, não demora muito até que eu chegue a enorme porta de madeira do internato.

Antes de entrar no lugar respiro um pouco, só então empurro a porta e entro no salão principal. Olho para tudo e percebo que está exatamente como eu me lembro, o amplo salão principal, com os jarros grandes, estátuas e pinturas, logo depois uma escada em espiral que leva para os quartos das garotas, ando mais um pouco e chego a outra escada essa leva para os quartos dos professores, decido subir, tomar um banho e me reunir com os outros professores na sala de reuniões, desfaço minha mala, escolho uma roupa formal e desço pra sala, não antes de ver várias meninas descendo as escadas pelo corrimão, pelo visto nem o diretor mais exigente consegue fazer com que adolescentes se comportem como mini adultos, sorrio com esse pensamento e continuo descendo as escadas, me dirijo para sala de reuniões, passo por dois enormes salões antes do corredor virando a esquerda, que leva para as salas inclusive a que eu estou procurando. Bato na porta e alguém a abre, todos se voltaram para mim menos a diretora que permaneceu analisando uns papeis.

_ Você deve ser a nova professora de literatura e história_ ela disse, ainda sem me olhar_ está atrasada.

_ Eu peguei trânsito vindo para cá e minha contratação só foi confirmada há pouco tempo.

_ Sente-se_ e só então ela me olhou, piscou algumas vezes sem acreditar no que via, nenhuma palavra saiu da minha boca ou da dela, ficamos congeladas naquele momento e nas milhões de lembranças que tínhamos uma da outra. Eu pensei várias vezes em como seria reencontrá-la, como seria ver seus olhos castanhos e seu batom vermelho me atraindo até a sua boca, nenhuma vez seria assim, nenhuma das vezes eu sentava na minha cadeira ao lado de um homem mais velho enquanto ela permanecia imóvel, seu lábio tremendo pensando no que falar.

_ Bom...é... onde estávamos?

_ Discutindo a carga horária_ falou uma mulher sorridente.

_ Ah, obrigada Glória.

_Bom, acho que agora é melhor nos apresentar-nos para a nova professora_ disse o homem ao meu lado.

_Claro, claro eu já estava pensando nisso _ Meila disse, levemente desconcertada. _Essa é a Glória professora de arte e teatro. O homem sentado ao seu lado é o Joseph professor de Filosofia e sociologia, ele dividirá o departamento de Ciências humanas com você. Ana Clara, ciências biológicas, Guilherme, professor de física, química e matemática. E aquele perdido em outra terra é um dos professores de línguas, Gustavo. Temos outros professores, mas essa reunião é exclusiva para os chefes de departamento, assim como você. Professores, essa é a senhorita Valentina Duvall.

_Prazer em conhecer a todos.

_Não vai apresentar-se? _Glória perguntou a diretora.

_Sim, sim claro...

_Não precisa, eu já conheço a senhora diretora _disse fazendo-a ficar ainda mais desconcertada e levantando dúvidas para os colegas.

Ela pigarreou e continuou a falar da carga horária. Terminada a reunião, nós duas fomos as últimas a sair da sala. Meila levantou os olhos dos papéis que estava olhando e me encarou.

_Deseja alguma coisa professora?

Me aproximei da mesa dela com passos lentos.

_Queria saber como você está.

_Não.

_Não? _ franzi as sobrancelhas, confusa.

_Nós não fazemos isso, eu nem sabia sobre a sua contratação, pedi pra antiga chefe de departamento contratar a sua substituta, um erro que não irá mais se repetir.

_Eu não acredito nas suas palavras de desdenha.

_Senhorita Duvall por favor não me faça me arrepender ainda mais da sua contratação, seja profissional.

_Como você quiser.

Sai de lá rapidamente, mas minha vontade era outra, eu sei que eu devia ter raiva dela depois de tudo, mas eu...eu não posso vê-la, eu não sou eu mesma perto da Meila. Fui direto para o quarto olhar meus horários de aula e o conteúdo programático das disciplinas que irei ministrar, principalmente as obras que irei trabalhar em sala. Ouvi uma batida na minha porta, abri.

_Boa noite professora Duvall.

_Ah não, me chame de Valentina por favor.

_Bom, então, Glória... _ela sorriu _ desculpe incomodá-la, mas é hora do jantar, devemos descer.

_Esqueci que esse lugar é rígido com horários.

_Já trabalhou aqui antes?

_Na verdade eu estudei no Monsenhor Olegaries.

_Nossa! Eu queria muito, mas não consegui uma bolsa de estudos.

Descemos as escadas enquanto íamos conversando.

_Sabe Glória, esse lugar é ótimo no quesito ensino, mas quando se é jovem é como uma verdadeira prisão, menos a sala das refeições, sempre me lembrou Harry Potter.

_Não é? Vivo dizendo isso.

Entramos no salão e nos dirigimos ao púlpito onde Meila iria fazer as apresentações. Ela me apresentou a mais alguns professores, depois disso sentei no meu lugar a mesa sobre olhares e risadinhas das alunas.

Caso eu não tenha comentado o Monsenhor Olegaries é um internato para meninas, imagine adolescentes dos 12 aos 18 anos, com os hormônios em ebulição e muitas com TPM num só período, um verdadeiro pandemônio.

Sentei a mesa e comecei a me servir, mais salada do que outra coisa.

_Você é daqueles tipos? Como se diz, vegano? _ Joseph perguntou com as sobrancelhas arqueadas.

_Não, queria ser vegetariana, tudo sobre a crueldade com os animais nos abatedouros e teste de cosméticos mexem comigo, mas eu simplesmente não consigo, eu amo carne.

_Você é das minhas, compartilho das ideias dos vegetarianos e veganos, só não consigo aderir.

Comecei a comer, as alunas faziam um burburinho, comentando sobre as férias nas suas casas, ou em um lugar exótico, sobre os meninos que ficaram enquanto eu colocava mais comida no prato.

_Esse tempero...Phine ainda é a chefe?

_Sim _Meila respondeu _ninguém em sã consciência deixaria Delphine partir.

_Você já trabalhou aqui no Olegaries? _Guilherme da matemática, me perguntou.

_Ela estudou aqui_ Glória disse dando uma garfada na comida logo em seguida.

_Verdade?! _alguns outros perguntaram em uníssono.

_Sim e posso dizer que não mudou quase nada.

Meila limpou a boca com o guardanapo e falou de forma seca.

_Talvez a estrutura do internato seja a mesma, a disciplina, mas ao longo do seu período aqui irá perceber professora Duvall que a minha administração é diferente das anteriores, desse modo o Monsenhor Olegaries está bastante diferente do que você se recorda.

Quando ela terminou de falar ninguém ousou dizer nada que não fosse "me passe os legumes por favor". Meila sempre soube como intimidar as pessoas. Dei um sorriso de canto de boca e continuei a comer.

Se não fosse aquela noiteOnde histórias criam vida. Descubra agora