Não se preocupe, isso passará
E pelo que der e vier, ficarei contigo.
Porém enquanto não passar, ficarei comigo.
Afinal, também enfrento isso, você entende, certo?
Que frio
Dizer sempre que tudo para você tudo vai melhorar,
E no fim, acreditar.
Dizer que tudo irá a mim melhorar,
E melhorar enfim, minha atuação de crente.
E depois, me afirmar que você irá se acabar e acreditar,
E depois, me acabar e confirmar.
Confirmar mais uma vez, depois daquela última vez.
Que mesmo com quem eu vivo para, vivo por e vivo como,
Não sou nada,
Nada além de um esperançoso crente.
Que calor.
Ontem acreditei em mim, hoje em Deus,
Amanhã no diabo e depois de amanhã, nos três.
Nós três.
Os gêmeos contrastados,
Em sangue e lágrimas que gemem,
Gemem em um uníssono agudo.
Creio que melhorarei um dia caso me esforce,
E caso me esforce, creio que irei te fazer melhorar.
Creio também que posso carregar uma montanha,
E como um anjo, sobrevoar os céus.
Que clima ameno.
Creio que sei de tudo.
Creio que não tenho nada
Creio também que não posso nada além de crer
E creio que crer em poder crer, é um esforço.
E então, creio.
Como um espectador, vou assistir.
Assistir você que tanto amo,
Assistir você que tanto odeio,
Assistirei a todos.
Todos que em algum momento cri.
Cri que poderia deixar de crer,
E de assistir
E de crer e de assistir.
Crendo e assistindo,
Crerei na melhora
Enquanto assisto a piora.
Crerei na sua melhora, assistindo a minha morte.
Crerei em tudo, menos no que creio.
Carne e sangue.
A minha carne e o meu sangue.
Assisto a mim mesmo.
Devorando cada pedaço,
Tomando cada gota,
Até que não sobre nada mais.
Nem os dentes que mastiguei.
Nada.
Só assim.
Só assim poderei ser livre.
Eu poderei ser livre.
Creio que assim eu possa ser livre.
Creio que não poderei ser livre
Creio que crer não me fará ser livre.
Creio que...
Está frio.
Mas não se preocupe, isso passará
E pelo que der e vier, ficarei contigo.
Que calor.
- 21/06/22
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Solilóquios
PoetryPequeno emaranhado de textos e meditações. Arte da capa: Título: Christ with Crown of Thorns Artista: Khalil Gibran (1883-1931)