CAP TRÊS - Tudo com o que é preciso lidar

223 23 12
                                    


A primeira coisa que Katsuki estranhou ao acordar foi a gentileza do despertar. Não haviam gritos estridentes, palavras cruéis ou batidas incessantes na porta de seu quarto. Só um chacoalhar levinho no ombro e um cheirinho de algo sendo preparado.

O Senhor Hizashi o acordou de maneira gentil, o que foi surpreendente visto que tinha uma visão muito diferente do homem na escola e como herói. Ele era sempre muito enérgico e falava alto, alguma parte de si esperava que fosse assim em casa também, mas ele era apenas gentil. Não que ele acreditasse que merecia tal gentileza.

- Shouta e Hitoshi, já foram para o colégio, não precisa se preocupar, ele não sabe de nada sobre o que aconteceu, e acredito que mesmo que soubesse ele não falaria nada e Shouta foi conversar com Nezu, para chamar seus responsáveis. - Comentou no mesmo tom gentil enquanto lhe entregava uma caneca de chocolate quente. - É chocolate... Ajuda em dias ruins.

Quando ia entregar a caneca Hizashi iria retirar a colher que usara para misturar a bebida, mas o menino o impediu, um gesto inconsciente que o adulto acatou com delicadeza.

- Não é comigo que deveriam se preocupar. - Aquela alegação dolorida do menino atingiu Mic com mais força do que era esperado. Não é o tipo de coisa que ele esperava ouvir de seu aluno que sempre é tão cheio de si. Mic pensou com certa razão, que aqueles eventos deixariam marcas que o menino levaria para sempre. - Mas obrigado.

- Todos cometem erros, Bakugou. - Tentou dizer algo melhor do que aquilo, mas sabia que seria como pisar em ovos. Observou atentamente enquanto o menino pegava colher e a movia de um lado a outro, como quem não sabe o que fazer com ela, mas sem de fato tirá-la dali.

- Os meus erros quase mataram uma pessoa boa. - Os olhos de íris vermelhas refletiam o pesar daquelas palavras e ficaram perigosamente marejados. - Grande aspirante de herói...

Ahhh as palavras ásperas e humor ácido, uma arma bem forte de auto defesa, as depreciativas eram realmente algo que Mic já estava acostumado a lidar, quis suspirar mas não o fez. Ele amava alguém que não era capaz de ver as coisas boas que fazia. Reconheceria esse traço com facilidade. Ver um trauma ser recalcado diante de seus olhos era quase tortuoso. Queria ter algo a dizer mas sabia que nada seria escutado naquele momento. Apenas dirigiu ao menino um sorriso calmo.

- Vamos estar aqui para ajudar vocês, sabe disso, não sabe Bakugou? - A frase de Hizashi o desconcertou. Ele queria perguntar tantas coisas, a principal delas era por que? Não fazia sentido. Não fazia a porra de sentido algum aquilo. Mas não conseguiu, apenas bebeu um pequeno gole de chocolate quente e com ele o nó em sua garganta, era impressionante o quanto tudo doía.

A culpa podia mesmo ser corrosiva.

****************

Para Izuku a manhã seguinte foi o próprio inferno.

O sol que adentrava a janela de seu quarto o despertou, ele nem ao menos se lembrava de como estava ali. Mas seu raciocínio era bom e rápido, Katsuki o deveria ter trago. E aquilo foi o suficiente para nausear seu estômago, fazer sua cabeça latejar, se levantou tão rápido que se não estivesse tão imensamente preocupado com Inko, teria tido uma tontura. Mas naquele momento apenas a possibilidade de Inko saber sobre o que tinha tentado fazer. O que ele teria feito se Katsuki não tivesse aparecido.

Enquanto descia as escadas que levavam para o piso inferior da casa, Izuku tinha completa consciência de todo o seu corpo. As partes doloridas talvez pelo impacto de seu corpo contra o de Bakugo quando ele o salvou, os cortes repuxantes em seus tornozelos, sua cabeça que poderia explodir a qualquer segundo, seu coração batendo de maneira acelerada, podia sentir o sangue pulsando em suas veias, ele sentia seus cabelos roçando sua testa e sua nuca, e sentia o medo comendo suas entranhas de maneira dolorosa. Inko estaria destruída se Bakugou tivesse contado. No fundo Izuku estava preparado para isso e para toda a merda que seguiria depois. Não era como se sua vida fosse realmente um mar de flores. Mas não estava preparado para encontrar Inko cozinhando de maneira animada e amorosa como em tantas outras vezes. Não teve tempo de se preparar, pois os olhos verdes e calorosos de sua mãe o alcançaram de imediato, ela limpou as mãos em seu avental, enquanto sua cabeça rodava em torno de vários pensamentos doloridos.

Sob a peleOnde histórias criam vida. Descubra agora