2| Inimigo próprio

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TEVE CONSCIÊNCIA de que havia se dado muito mal quando sentiu o corpo inteiro doer, os olhos ainda pesavam e não conseguia abri-los, mas ouvia um som muito irritante de um bip próximo a seu ouvido. Tudo era muito calmo o silencioso e aquilo, de certa forma, o alarmou. Sua vida nunca fora calma como daquela maneira, não estava acostumado com a serenidade, no entanto, o colchão macio e os travesseiros postos sob seu corpo o traziam certo conforto e o fazia querer voltar para o limbo que estava antes, porém, ouviu um certo ranger característico e duas vozes distintas conversando.

- Como ele está hoje? - questionava uma mulher.

- Se recuperando bem, os exames deram um resultado positivo e creio que o efeito do sedativo deva passar em breve.

- Hum...e dentro de quanto tempo ele poderá sair?

- Creio que no mínimo uma semana. Ainda quero deixa-lo em observação e possivelmente fazer outros exames para me certificar de que não haverá nenhuma complicação.

- Uma semana?! - bradou a mulher indignada - O processo dele já teve início!

- Eu sei, agente, mas ele precisa de um tratamento adequado. Ele sofreu um acidente não podemos tratar como se não fosse nada.

- Tratamento adequado? Ele é um criminoso!

O homem pareceu perder a paciência e em tom mais rude, respondeu:

- É um criminoso, mas ainda assim é meu paciente. Quando me formei prometi que salvaria vidas independente de quem fosse, não é minha obrigação julgar seu caráter, mas sim cuidar da saúde dele. Então quando digo que o mínimo para eu liberá-lo é uma semana, então ele irá ficar uma semana.

Dorian teria comemorado a fala daquele homem, que agora ele sabia ser seu médico, mas logo tudo voltou a ficar silencioso e ele não pôde ouvir a resposta dada. Quando sua consciência voltou novamente, ainda continuava no silêncio, mas dessa vez conseguia ter um pouco mais de lucidez, sentiu algo gelado e rígido se prender ao seu punho esquerdo, enquanto seu pé direito parecia estar contido em algo também.

As pálpebras estavam um pouco pesadas, mas ainda assim conseguiu abrir uma pequena fenda, e mesmo que sua visão estivesse turva, conseguiu se localizar e compreender que estava em um quarto de hospital. O bip irritante ainda continuava, fazendo a leve dor de cabeça se tornar mais incômoda. Com o passar dos minutos a visão foi se ajustando ao ambiente, notou as cortinas uma de cada lado da cama, dividindo os leitos, a televisão exibia um jogo qualquer de futebol e o ambiente estava incrivelmente silencioso, não saberia dizer se era o único paciente ali.

Tentou erguer os braços, mas apenas o membro direito foi capaz de se afastar da cama, erguendo a cabeça, notou a algema ao redor do punho esquerdo, o prendendo à grade, aquilo explicava a sensação anterior quando sentiu algo gelado sobre a pele. O pé direito estava envolvido por uma bota ortopédica e um acesso fora inserido no braço direito, onde a cânula levava o soro direto à veia.

Dorian não pôde deixar de pensar que fizeram aquilo de propósito, deixando um dos braços presos e o restante com o acesso bem longe do alcance de sua mão, ele não conseguiria alcançar a agulha, nem tira-la de si... nem usá-la para abrir a algema e sair dali.

Aquilo o irritou.

Estava furioso por ter sido pego, e tudo porque não olhou para os lados na hora de atravessar a rua. De qualquer forma, precisava arranjar outra maneira de sair dali, deveria aproveitar enquanto estava sozinho.

Quando começava a elaborar um plano, a porta se abriu, revelando uma loira alta, os cabelos eram curtos e rente à cabeça, enquanto a calça social e a camiseta preta que usava lhe conferiam uma aparência rude e sóbria. O coldre na cintura carregava a arma e assim que se aproximou de Dorian, ela apoiou a mão ali, como se daquela vez quisesse proteger a arma de ser afanada.

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