Ante seus olhos, ardia frio o astro
E assim vertia dos montes nevados
Imparáveis e lentas lágrimas pelas raízes
Lhe desenhando as cicatrizes
Pois assim foi, e assim se moldou
Inúmeras esculturas afogadas a contemplar
Sob mares de perdida ternura
Testemunhas do passado,
Rompendo feições pelas fendas do solo
Profetas sem futuro,
Lutando contra a sepultura
Do gelado leito sob nébulas
Translúcidas águas, de ventre exposto
Desvelam as lacerações cruentas
Que deceparam suas obras ocultas
Sequelas d'outros tempos que descrevem
Tal murmúrios perdidos nas finas ondas
Acalmaram-se as névoas, intimidadas
E as brumas se abriram sobre o remanso
A lâmina d'água se ondulou em novo sentido
Pois Eras definharam desde seu retorno
Houve o sussurro, de calor, de música
E o trotar de um coração excitado
Revoava flamejante tal uma biga dourada
Cadente e gracioso ao cume frígidoTrilhando em seu rastro os véus da aurora
A inércia dos montes se encolhia
Pois a serenidade e a aura macia
A cada aspecto lhe envolvia
Como expectado, assim seria
A ardência do peito lhe despertouDe onde adormecia há muito esquecido
Além do tangível, na morada dos astros
Para, sempre como última vez, talhar
No cume, rochas se elevaram da neve
Para obedecer aos toques sensíveis
E a cada ângulo fantasiado
Do doce sonho na mente guardado
E a inédita feição se desenhou
Perfeições aos moldes de um sonhador
Delineada forma nas mãos artesãs
Modelou, então, o que sentia
Porém, não lhe falava ou sorria
E pelo puro pulsar do âmago, prosseguiu
Pela paixão que o carregava crédulo
Partilhou da própria essência nos entalhes
Quando a imagem se igualava ao fervorQue na montanha congelada o trouxe
O olhar vazio da estátua não expressava
Sequer uma palavra para confortar
Mudo, o coração rochoso se resfriou
Retornando à gelidez da pedra e da neve
A aurora se dispersou, a chama se abrandouEm crescente desespero de perder o sonhado
Erguera outro pilar de pedra
Dando neste contornos menos precisos
Igualmente falho ao final
A cada nova tentativa, mais se distanciava
Da ardência do peito, da imagem sentida
E o disforme ganhou contornos
A cada nova versão, que se desvelava a feição
Mais e mais hedionda, de pavores
Que se escondiam em memórias
De tentativas d'outros tempos
Enegreceram-se estes horizontes
Ante o abraço que se esfriava
Em torno de sua última criação
E lacrimejou como os céus tempestuosos
Sem que pudesse controlar, esvaindo a euforia,De seu peito contra o peito rochoso
Vislumbraram as esculturas ao seu criadorCaído sobre os calcanhares, de face abatida
E em promessas lacrimejadas,
As mãos do tempo lhes carregaramPara longe do topo do monte
Pelos caminhos profundos ao sopé
Danificados, em fragmentosMergulhando-se às lágrimas de muitas neves
Sem que olhar do viajante se movesse
Ajoelhado ao cume, deixou que a Era findasseAté que o sonhado, enfim, se perdesse
E ele não mais se diferisse da montanha
Cobrindo-se da neve que soprava
Quando as brumas enfim,
Reinavam soberanas por outra Era
O rasteiro voejo de dedos cortando a superfície
De mãos e pés imbuídos da delicadeza e feridasPara flertar com a ameaçadora silhueta
Das imagens submergidas no degelo
Quebradiças e amorfas
Com o estender, mergulhou a mão
Afundou seu peito e o rosto
Para dentro do plano esquecidoE quando tocou nas mãos rochosas
Seu voejo eternal, enfim, cessou
Onde asas não lhe diferiam das estátuas
Afundando ao silente e ao gélido
Para em seu último momento contemplar
O mesmo céu nebuloso além das águas
Que habitou a visão de suas imagens sonhadas
De agora, e d'outros tempos
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Randômicos
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