Querido vazio,
A primeira vez que te encontrei, eu ainda nem sabia amarrar o meu cadarço.
Num dia eu 'tava comendo bolinho de chuva no colo da minha vó, no outro ela estava numa caixa, rodeada de flores e pessoas chorando.
É uma daquelas lembranças que não passam por nada, eu lembro de olhar para cima e perguntar pra minha mãe
"Mãe, por que a vó 'ta numa caixa de vidro?"
Não sei se era de vidro, mas foi assim que eu perguntei.
Minha mãe não disse nada, ela ajoelhou, me abraçou...e até hoje, nunca, eu nunca vi ela chorar tanto. Naquele dia, antes de voltar pra casa, ela passou numa doceria e comprou uma caixa enorme de TORTUGUITAS pra mim, e ela fez questão que eu comesse no caminho.Hoje, em retrospecto, eu acho que minha mãe chorou e me encheu de doces porque ela não sabia COMO responder a minha pergunta...minha vó mal tinha sessenta anos, era uma pessoa doce, gentil, cheia de vida...
Num dia ela 'tava sorrindo, no outro o oculinhos que ela usava para ler a bíblia estava jogado em cima do sofá e ninguém sabia direito o que fazer com ele.
Não tinha porquê a dona Joana estar em uma caixa de vidro e na ausência de um motivo (um bom motivo), a mente humana tem dificuldade de aceitar...
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Carta aberta para o vazio (e pra quem se perdeu nele)
PoetryEssa carta não é de minha autoria (pertence ao Ludoviajante)!!!