09 | perception

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QUANDO NARCISSA CHEGOU em sua sala. Sendo sempre a primeira a chegar no local onde dava aula diariamente, pensou com seriedade sobre conversar com você. Como ela abordaria um tema que é muito sensível à ela e muito mais sensível para você? 

Ela não sabia como começar a conversa, até porque não era ela quem vivia isso. Era você. Todos os dias.

Como seria se ela não conseguisse tirar nada de sua fachada fria e sombria? Ela passaria a não olhar mais para os lindos pares de olhos da qual você possuía, por conta da vergonha de se intrometer na sua vida. Mesmo que, no fundo do seu coração, ela sentisse que precisava fazer isso. 

Ela tinha medo não só por ela, mas por você também.

Depois de tudo o que Draco disse sobre você. Sobre sua vida. Sobre como você sobrevive tendo que cuidar de uma criança e de si mesma. Sendo uma adolescente, uma filha, uma irmã e praticamente uma mãe, para o pequeno Billy. Nada do que você faz atualmente se compara com a vida da mulher mais velha.

Narcissa cresceu e viveu a vida que qualquer garota da sua idade gostaria de ter: pais amorosos, mas rígidos; irmãs unidas, que sempre apoiaram umas as outras; um garoto bonito e educado como namorado, logo virando seu marido, qual a presenteou com um belo filho.

Isso tudo ela teve desejando ter outra coisa. Ter alguém quem ela confiasse e amasse de verdade. Alguém quem poderia conversar sem hesitar, uma conversa da qual ela não sentiria tédio. Ela queria alguém que não traísse sua confiança... Lucius pode ter começado como um namorado amoroso, no entanto, Narcissa sempre soube que o amor  que Lucius dava a ela era na verdade possessão. A mulher nunca soube se era medo de perdê-la, ou raiva de que alguém fosse ficar com ela, alguém que não era ele.

Será que você faria algo do tipo? Discutir por ciúmes facilmente ─ que em algum momento a discussão se torna agressiva demais ─ ou então, tratá-la como se fosse um objeto e nada mais. Ela esperava que não. Você era algo tão fofo e inofensivo, pelo menos aos olhos da mais velha.

Narcissa caiu em sua cadeira estofada, sua bolsa com os livros didáticos caíram em um baque forte em cima da mesa. Seu coração batia freneticamente, rápido e forte. Doía de imaginar alguém da qual ela gostava tanto sofrendo nas mãos de outras pessoas. Outras pessoas não, de seu próprio pai. Aquele que deveria te proteger e amar para toda a vida.

Ela sentia raiva e ódio profundo por seu pai.

E ódio dela mesma, pois não percebeu o que você passava. 

Mas ela se pergunta por que se importava com isso. É só porque você é amiga de seu filho, certamente? Não há nada errado em se preocupar com as amizades de seu único filho. A não ser que esse sentimento seja algo mais profundo. Mais íntimo. Era errado. É errado. E Narcissa sabe disso. Mas por algum motivo, ela escolheu você.

Quando o sinal começou a tocar, a mulher mais velha limpou suas bochechas pálidas e molhadas com rapidez e força, antes que algum aluno entrasse pela porta sem ao menos bater. Algumas lágrimas caíram enquanto pensava sobre você, e ela sentiu seu coração disparar mais ainda quando você foi a primeira que passou pela porta da sala, após bater três vezes.

Você caminhou pela sala como se nada tivesse acontecido na sua vida, como se você não morasse na mesma casa que seu pai, um homem abusivo, tóxico, machista & homofóbico ─ você era uma boa mentirosa, isso Narcissa tinha certeza. 

A mulher respirou fundo antes de se levantar lentamente. Você mal olhou para ela, sequer percebeu que havia outra pessoa na sala de aula. Olhando para o chão e ouvindo música alta nos fones de ouvido estéreo de 1994, ─ um presente de Draco no Natal de 95, e Narcissa lembra muito bem de seu rosto quando recebeu ─ você se sentou em sua classe na última fileira e apoiou os braços para poder descansar a cabeça.

Um pouco longe de mim, Narcissa pensou.

─ Srta. S/n! ─ a mulher mais velha pronunciou alto, mas você não respondeu.

Narcissa chegou mais perto de sua carteira, ficando ao seu lado, percebendo o jeito como você respirava. Parecia que você não estava respirando corretamente, devagar e profundo. Ela revistou seu corpo com os olhos, percebendo como os punhos das mãos estavam roxos e arranhados.

Uma última vez, respirou profundamente, tomando coragem de conversar com você.

─ S/n?... ─ ela encostou em seu ombro, suavemente.

─ Oi? Que horas são?! ─ você perguntou subitamente, assustada com a possibilidade de ter dormido na sala de aula em uma única piscada.

─ Mesmo horário, uh, oito e quinze? Eu acho, não sei ─ ela respondeu, vendo você tirar seus fones.

─ A senhora precisa de alguma coisa? Eu sei que passou trabalho semana passada, mas eu irei entregar na próxima aula, espero que não se importe, eu iria entregar hoje mas Billy fez uma bolinha de papel com o meu trabalho. Desculpa. 

Narcissa mordeu o lábio inferior, vendo como você parecia ainda mais pálida desde a última vez que a viu, o que, dois dias atrás? 

─ Querida, não se preocupe, eu só gostaria de conversar com você no final da aula. ─ ela disse, em voz baixa ─ Eu sei que você tem outras aulas para comparecer, então, que tal eu dar uma carona à você hoje? 

─ Bem, uh, se não for um incômodo. Eu vim a pé, sabe, um pouco de exercício físico e essas coisas ─ você deu de ombros, olhando para porta em seguida, o som dos adolescentes entrando tirou sua atenção de Narcissa.

─ Ótimo! Uma última coisa. ─ você a olhou, enquanto ela chegava um pouco mais perto para sussurrar: ─ Eu sinto muito. E espero que me desculpe, a nossa última conversa não foi uma das melhores, e eu não quis presumir nada e foi imprudente de minha parte ter feito qualquer comentário à você, senhorita. 

─ Está tudo bem, sra. Malfoy. Para falar a verdade eu até tinha me esquecido. Mas está tudo bem, de verdade.  

Você deu um pequeno sorriso para ela, vendo-a concordar lentamente e seguir em direção a sua mesa. Cruzando os braços sobre a mesa, você apoiou sua cabeça neles, sem se importar em olhar para a professora, na sua cabeça, ouvi-la explicar a nova matéria bastava.

𝗦𝗘𝗗𝗨𝗖𝗘 𝗔𝗡𝗗 𝗗𝗘𝗦𝗧𝗥𝗢𝗬 ─── narcissa malfoyOnde histórias criam vida. Descubra agora