Falta

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Minhas lágrimas estão pesadas e cansadas, não sinto minhas mãos, meu corpo amoleceu, quase não paro em pé.

Não sei como viemos parar aqui, não sei o que fazer, o que sentir e o que falar, pois são tantas coisas que me perco. Muitos de vocês devem pensar que estou sozinha, abandonada ou perdida, mas estou ao redor de muitas pessoas, vivas e mortas, posso estar sozinha e abandonada, mas não literalmente.

- Anna vai se despedir. Pode vim. - Meu pai me chamou na frente de todos.

- Bom, não sei bem por onde começar. Passei os últimos anos vendo ele morrer, morte lenta e triste. O câncer não é só uma doença, é um demônio horrendo que se instalou nos pulmões de Billy. - comecei a chorar.- vocês estão tristes e chorando, mas com certeza em menos de um mês vão estar sorrindo e vivendo suas vidas, mas vou viver cada dia do resto da minha vida sem ele, sem seu abraço, seu cheiro, suas idiotices, sua pele, seu modo de falar. Vou ficar sem meu irmão, sem ele não sou nada, sei que aquele garotão queria um enterro animado e quero dar isso a ele, infelizmente não será possível, pois minha força de vontade morreu com Billy. - parei um pouco, precisava respirar, pensar e absorver o que tinha dito. - Billy foi forte, foi feliz, foi incrível mesmo morrendo. Esse garoto orava todos os dias e me dizia que boas pessoas vão ao paraíso, nunca liguei pra isso, porém espero que seja verdade.

Sei que não disse tudo que sentia e nem o que queria dizer, sei que estava nervosa e triste, mas poderia ter sido bem melhor.

O celular toca e tenho medo de ver quem me liga, todos que conheço estavam ali, não tenho muitos amigos e muito menos colegas.
Ao pegar o celular bem devagar, vi que era um número desconhecido, nesse caso nunca atendo, mas eu queria sair desse mundo que meu irmão se foi e falar com alguém diferente, mesmo que eu não faça ideia de quem seja.

- Me ajuda- uma voz fraca e seca falava no outro lado da linha.

- Desculpa, mas quem fala? - pergunto insegura.

- Danny, seu namorado. Preciso de ajuda, eu não estou mas conseguindo. - gritou desesperado.

- Danny, você está aqui no enterro. Pelo amor de Deus, o que houve?

- Enterro? Que enterro? - me preocupei - Vem me ajudar, me ajuda agora.

- Como? Onde? Não estou entend... - fui interrompida pela ligação que foi desligada.

"O que está havendo? Será que é o Danny? Preciso ir até ele, mas não sei onde está." - penso até perceber que não estou mais no enterro, meu irmão se foi a muito tempo, estou no quarto dos meu quarto as 23:52. Tudo isso pode ser um sonho, mas e o Danny?

- Anna! Vai dormir agora, não vou falar de novo. - Meu pai disse pra mim quando entrou no meu quarto sem bater.

- Pai, mas... O que está acontecendo?

Então sem que eu terminasse, ele bateu a porta com força ao sair dali. Não sei o que me resta, não sei se retorno a ligação, se grito socorro, se chamo meus pais, se pulo a janela do quarto que é no quinto andar andar do prédio ou se apenas durmo e espero isso acabar.

Sem ver muito bem, meio atordoada, sei que já amanheceu, a luz forte bate na janela do quarto azul onde eu mesmo pintei.

Levanto rápido que fico tonta, o telefone toca sem parar, ainda estou confusa e muito triste. "Mas um dia sem meu pequeno Billy" - pensei.

Choro alto vem dos quartos dos meus pais, corro pra lá, mas com certeza deve ser da morte do meu irmão. Nunca vamos superar essa grande perda.

Meu pai com o telefone no ouvido, minha mãe com lágrimas nos olhos olha pra mim e corre pra me abraçar. Um abraço apertado, sem esperança, com medo e insegurança.

Julia BlunkOnde histórias criam vida. Descubra agora