Senhor Salvatore

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Ao ser informado por Cherry que Mirela e Paulina estavam no prédio, Simon as deixou entrar em seu escritório.

— Bom dia, bebê! — cumprimentou Mirela abraçando-o.

Odiava quando sua mãe o chamava assim, mas reclamar não adiantaria de nada.

— É bom vê-la também, mãe. — Afastou o corpo, colocando fim ao abraço. — Precisava mesmo conversar com você.

— Sobre o que?

Simon olhou em direção a governanta. Ela permanecia muda ao lado da porta, as mãos unidas em frente ao corpo e os olhos abaixados. A submissão em pessoa.

— Perez, faça um café para mim. — Paulina ergueu o olhar surpresa. — Peça para Cherry mostrar a copa.

Ela assentiu e saiu apressada.

Quando a porta se fechou, com uma delicadeza que contrastava com a rapidez que a jovem saíra, Mirela se voltou para o filho.

— Paulina não é funcionaria da sua empresa.

Simon deu de ombros, caminhou com passos decididos até sua mesa e sentou, indicando com a mão a cadeira a sua frente para que sua mãe sentasse.

Notando a expressão compenetrada do filho, Mirela sentou e aguardou. Estava ali para falar, mas podia perceber que o caçula também tinha algo a dizer.

— Carlos me enviou os papéis da contratação da Paulina. — Deslizou o documento sobre a mesa até chegar às mãos de Mirela.

Sem compreender, ela olhou para o papel e depois para o filho.

— Algo errado?

Percebendo que ela não notara a falha em seu plano, Simon riu internamente. Amava Mirela, mas as artimanhas dela sempre o irritava. Pegou o contrato, abriu na parte de assinaturas e recolocou em frente a ela.

— Como vê, precisa da minha assinatura para ser válido.

Mirela agarrou o contrato, olhando para o espaço vazio.

— Sempre contratei os empregados da mansão e nunca tive problema...

— Contratou no nome do papai, que deixou uma procuração para Carlos representa-lo. Porém, esse contrato está em meu nome.

Mirela levou a mão à fronte. Em sua ansiedade esquecera-se de pegar a assinatura de Simon. Se tivesse feito isso Simon assinaria sem pensar, mas agora...

— Não pode demitir a pobrezinha — disse erguendo os olhos suplicantes. — Ela é uma boa garota e lhe fará bem.

O silêncio de Simon a preocupou.

~*~

Levada por Cherry a pequena copa, Paulina pegou tudo o que precisava para fazer o café, enquanto respondia distraída às indagações da secretária.

— Você morava na mansão Salvatore?

— Nasci e fui criada na mansão. Meu pai é motorista deles e minha mãe... — Deixou a colher de café suspensa acima do coador ao recordar da mãe. Com um suspiro despejou o pó ao continuar: — Minha falecida mãe era a melhor amiga da dona Mirela e também trabalhava como governanta na mansão.

— Melhor amiga?

Paulina assentiu enquanto ligava a cafeteira.

— Elas se conheceram em um orfanato de freiras. Anos depois, elas trabalharam na mansão Salvatore — resumiu, sorrindo ao completar: — Foi assim que meus pais se conheceram.

— E agora você é governanta do senhor Salvatore. — Cherry riu. — Juro que pensei que Mirela contrataria uma velha para controlar o filho... — calou-se. Os olhos esverdeados analisaram Paulina de cima a baixo. Reparou pela primeira vez no cabelo longo, preso por uma fita, e na franja espessa quase cobrindo os olhos. As roupas, camisa branca de gola alta, saia longa e terninho, ambos acinzentados, eram austeros para alguém que parecia ser mais nova que ela. Cherry não se considerava uma pessoa alta, mas, mesmo Paulina usando lustrosos sapatos pretos de salto baixo, tinha que abaixar os olhos para olha-la. Pequena, de feições delicadas e roupas fora de moda, não era velha, mas a aparência combinava com o que imaginara quando Simon dissera que Mirela contrataria a governanta.

— Controlar o senhor Simon não é minha função. — Ouviu Paulina murmurar enquanto despejava o café em uma xícara e a ajeitava no centro da bandeja pequena de madeira.

— Posso levar — ofereceu Cherry.

— Não precisa — Paulina proferiu com um sorriso trêmulo, com medo que Simon se irritasse caso outra pessoa levasse o pedido.

Foi acompanhada por Cherry de volta ao escritório, deixando que ela abrisse a porta para que entrassem.

— Finalmente! Pela demora pensei que se perdera.

Ignorou a bronca, segurou a vontade de contestar que tivera de fazer outro, por ter certeza que o que estava na cafeteira antes não o agradaria, e pousou a xícara em frente ao Salvatore. Ainda teve de aguentar o olhar desconfiado dele ao pegar a xícara e beber seu conteúdo. Parecia que lhe servira veneno em vez de uma simples xícara de café.

— Hum! — Ele desviou a atenção para um ponto atrás dela. — Deveria aprender a fazer café com a Paulina.

Paulina ouviu o resmungo de Cherry atrás de si. Só não ficava feliz pelo "elogio" porque fora à custa de outra pessoa. Simon tinha um sério problema de arrogância em excesso.

— Bem, tenho de voltar à mansão e Paulina ao trabalho — lembrou Mirela levantando. — Te vejo em breve filho!

Paulina acompanhou Mirela e Cherry até a porta. Ao saírem viu Nathaniel conversando com Gabriel. Com o coração pulando de felicidade, pensou em saudá-lo, mas Mirela a impediu ao se voltar para ela e dizer:

— Ah, querida, esqueci-me de falar sobre a diarista. Melhor voltar e resolver essa situação — recomendou. — Te espero aqui.

Paulina ainda lançou um olhar esperançoso em direção ao noivo, porém ele estava entretido na conversa e não notara sua presença.

Com um suspiro resignado retornou.

Assim que entrou, fechando com cuidado a porta para não fazer barulho, Simon levantou o olhar do computador e a fitou intrigado.

— Que foi agora?

— É... Be-bem, eu que-queri-ria fa-falar...

— Respire antes de falar — ele ordenou com irritação. — Com essa gagueira insuportável só consegue me estressar.

Paulina fez o que ele mandou e tentou novamente.

— Dona Mirela disse que você tem uma diarista, mas ela não apareceu ho...

Ele a interrompeu para informar frio:

— De hoje em diante, você é a única responsável pelo apartamento.

Paulina o observou abrir uma gaveta, retirar algo e estender em sua direção. De onde estava lhe parecia um cartão.

— Não tenho o dia todo, Perez.

Apressou-se a pegar o objeto com mãos trêmulas. Realmente era um cartão de crédito, com a senha escrita em um post-it grudado nele.

— Qualquer coisa que precise é só usar o cartão, não necessita me pedir. Recebo um extrato no fim do mês.

Ela assentiu.

— Antes de voltar ao apartamento compre algo para o jantar, o suficiente para duas pessoas.

Ela movimentou a cabeça em sinal afirmativo.

— Esqueceu como se fala, Perez?

Ela balançou a cabeça em negativa, mas ao notar a expressão azeda do Salvatore falou:

— Não, senhor Salvatore. — Apertou uma mão na outra com nervosismo. — A que horas o senhor e sua visita chegarão?

— Tenha tudo pronto às oito.

— Sim, senhor Salvatore!

O olhar dele ficou levemente sombrio.

— Paulina.

— Sim, senhor Salvatore!

— Esse "senhor Salvatore" me irrita, parece que sou um idoso. Pode me chamar só de Simon.

— Sim, senhor Simon — retificou, ouvindo-o grunhir e voltar à atenção para o computador. — Mais algum pedido?

— Não.

— Com sua licença.

Tensa, saiu o mais rápido que a educação permitia. Naquele ambiente Simon ficava mais ameaçador.

Ensina-me ~ DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora