Confusão

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— Vá embora!

— Acalme-se! Isso não te fará bem.

— Sabe o que me faria bem? Corta-lo em pedacinhos e joga-los aos porcos.

Surpreso com os gritos da secretária, Simon saiu do elevador observando Cherry, em pé atrás de sua escrivaninha, encarar furiosa o Muller. Lançou um olhar para os departamentos financeiro e administrativo, as portas estavam abertas e os poucos funcionários que chegaram acompanhavam a confusão com diferentes graus de interesse e diversão estampados nos rostos.

— Cherry, precisamos conversar — suplicou o Muller.

— Não preciso de nada vindo de você. — Ela agarrou um enorme buque de rosas vermelhas de cima da mesa e tacou em Nathaniel. — Quero que vá para o inferno e enfie suas rosas no mei...

— Cherry! — alertou Gabriel.

A secretaria parou numa pose ereta e tensa, os olhos verdes arregalados ao dar-se conta da plateia.

— Senhor Gabriel, senhor Simon, bom dia!

Simon acenou com a cabeça, sério por fora e rindo por dentro. Paulina tinha muito a aprender com Cherry sobre como tratar Nathaniel.

Os outros funcionários se apressaram em voltar ao trabalho, embora desejassem o contrário, se fechando em seus respectivos departamentos e fingindo que nada demais acontecera. Na hora do almoço aquela discussão acalorada seria o assunto do dia.

— Os dois na minha sala — Gabriel comandou em sua melhor postura de comandante. Nathaniel seguiu Cherry, que o olhou feio quando se aproximou. — Você também — resmungou para Simon.

Simon deu de ombros e o seguiu. Teria ido de qualquer maneira, queria ver e escutar mais um pouco daquela briga.

— O que houve? — Gabriel questionou após fechar a porta.

— Vim conversar com a Cherry...

— Não — Cherry cortou irada — Veio me ameaçar no meu local de trabalho.

— Você entendeu tudo errado.

— Entendi certinho — revidou cruzando os braços com irritação. — Ou me caso ou você tira o meu filho de mim.

— Nosso filho — ele corrigiu.

— Filho? — Simon murmurou, recebendo um olhar cáustico de Gabriel.

— Jamais tiraria a criança de você — Nathaniel garantiu. — Só quero que nasça em um lar estável.

— Lar estável? — Cherry riu desdenhosa. — O que um canalha mentiroso sabe sobre lar estável?

— Nunca menti para você.

— Omitir, mentir, é tudo a mesma merda.

Simon estava cada vez mais confuso com o bate boca, enquanto Gabriel ao seu lado parecia a par da confusão. De repente lembrou-se de Paulina. O noivado rompido, o choro e os argumentos gaguejados. Ela sabia sobre aquilo?

— Pedi desculpas por isso.

— De que me adianta suas malditas desculpas? Estou grávida — gritou histérica. — Grávida de um cafajeste que se esqueceu de mencionar a noiva antes de me arrastar para a cama.

— Estou livre agora e quero me casar com você.

— Ao inferno com seu pedido de casamento. — Respirando fundo, Cherry fechou os olhos por alguns segundos, buscando acalmar-se antes de perguntar para Gabriel e Simon. — Serei demitida?

— Não. — Simon respondeu de pronto, ainda assimilando os fatos.

— Isso não passou pelas nossas cabeças — garantiu Gabriel. — Não se preocupe.

Nathaniel estendeu a mão para tocar o braço de Cherry, que o afastou com um safanão.

— Mantenha suas mãos longe de mim!

— Cherry, por favor! Quero o melhor para você e o bebê.

— Não. Está pensando somente no seu maldito traseiro. — retrucou e, erguendo a cabeça com altivez, declarou com desdém: — Tenho muito trabalho a fazer. Não posso e nem quero perder tempo com você.

Cherry passou por eles quase correndo. Quando a porta se fechou com um baque o silêncio pesado baixou na sala.

Nathaniel sentou em uma das duas cadeiras reservadas para os clientes. Simon o imitou sentando na outra e Gabriel contornou a mesa para ocupar sua poltrona.

Nathaniel coçava a nuca, visivelmente desconfortável. Gabriel observava tudo com sua melhor expressão de tédio. Chocado com todas aquelas informações, Simon não conteve a pergunta:

— Paulina sabe sobre Cherry? Sobre a gravidez?

— Contei ontem. Não podia levar o casamento adiante com Cherry esperando um filho meu. — suspirou deixando os braços caírem no colo. — Creio que não foi boa ideia procura-la aqui. Mas ela se nega a atender meus telefonemas e barrou minha passagem no apartamento dela. Não sei o que fazer ou dizer para me perdoar por ser um completo imbecil.

Nathaniel admitindo o óbvio surpreendeu Simon, mas não tanto quanto o fato do Muller saber onde Cherry morava. Embora não devesse uma vez que ele a engravidara.

Nathaniel namorava Paulina desde que ela era uma adolescente sonhadora e romântica e fizera um bom trabalho no controle de natalidade – provavelmente porque, presumia, jamais a tocara intimamente. No entanto, em poucos meses engravidara Cherry. Definitivamente, Nathaniel era mais idiota do que imaginara.

— Tem certeza que é seu? — perguntou, recebendo dois pares de olhares ofendidos.

— É meu.

— Lógico que é dele.

— Não precisa casar para reconhecer a criança — argumentou, acrescentando com um dar de ombros: — E, obviamente, Cherry não quer casar.

— Ela está com raiva ha meses. Desde que cometi a burrada de me deixar levar pelos instintos. — Soltou um riso sufocado. — Uma única noite e destruo toda a minha vida planejada em detalhes. Cherry me odeia, Paulina me odeia e a minha mãe está zangada.

— Vocês não continuaram juntos? Foi uma noite mesmo?

— Me arrependi na manhã seguinte. Falei que tinha uma noiva e ela me expulsou, exigindo que nunca mais cruzasse seu caminho. Até ontem cumpri seu desejo.

Tinha reparado que Nathaniel evitava a SaaTore e, quando era inevitável sua presença, ele e Cherry se evitavam.

— O que aconteceu ontem afinal?

— Cherry desmaiou e eu a levei para o hospital. Lá recebemos a notícia — respondeu com cansaço. — Pensei que pedi-la em casamento fosse a melhor solução. Mas, aparentemente, não é.

— Satisfeito com a confusão que causou? — Gabriel questionou Simon. — Seu conselho estúpido nos colocou nessa situação.

— Não empurrei ninguém para a cama errada — defendeu-se.

— Simon está certo — disse Nathaniel levantando e sendo copiado pelos outros dois. — Por meses culpei a Paulina, a Cherry, até mesmo o Simon — admitiu. — Mas a culpa é minha. Fiquei cego e errei com as duas. — Passou os dedos pelo cabelo, bagunçando-o, a frustação marcada em seu rosto. — Tenho que consertar as coisas pelo bem do meu filho. 

Ensina-me ~ DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora