boys like boys like girls do

1.

CHAPTER 1

Sabe aquele sentimento de que alguma coisa está fora do lugar?
É complicado explicar. Começar nunca foi meu forte.
Eu tenho uma namorada que parece gostar muito de mim e eu gosto dela também (não é amor, mas já é alguma coisa). Estou no auge da minha carreira como jogador de futebol para um time internacional, tenho meus 25 anos e muita saúde. Mas alguma coisa parece estar fora do lugar.

Passo a maior parte do meu tempo em campo fazendo os treinamentos, não tenho muito mais o que fazer já que não tenho muitos amigos por aqui e meu melhor amigo Son está agindo um tanto diferente comigo. Não sei o que aconteceu mas já faz mais de um mês que não saímos juntos, não passamos tempo sozinhos para ver um filme e comer as besteiras que somos proibidos consumir para manter a saúde.

Tudo bem, eu sei que parte dessa culpa é minha... Desde que comecei a namorar tenho tido menos tempo com ele e ela ODEIA meu melhor amigo. Mas eu preciso admitir que sinto falta das nossas risadas, das piadas ruins, de olhar nos olhos dele e sentir meu estômago revirar de fofura quando ele sorri com os olhinhos puxadinhos de forma adorável. Sinto falta também do cheiro que ele tem. É uma mistura cítrica e amadeirada com um toque de hortelã que trás uma sensação de limpeza. Estar perto dele é um sentimento de estar em casa. E eu sinto muita falta de casa.

Amanhã teremos treino apenas na parte da manhã. Vou tentar tirar um tempo para mim e entender o que está acontecendo comigo.

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Acordo às cinco da manhã com meu celular tocando, era Júlia, minha namorada.

— Oi – atendo secamente a ligação indesejada.
— Nossa, que grosseiro! Não ficou feliz com a minha ligação? Deve estar com seu amiguinho Son, não está?
— Cê tá louca? São cinco da manhã, Julia! Eu estava dormindo e você me acordou. Aliás, o que faz acordada a essa hora? E segundo, se eu tivesse com meu melhor amigo não teria problema algum. Nós somos amigos desde muito antes de você chegar.
— Estou ligando para avisar que vou te buscar no seu apartamento hoje para passear depois do seu treino. Não aceito não como resposta, use algo bonito pois vamos ao shopping. – e desliga antes que eu possa responder alguma coisa

Essa menina só pode estar brincando com a minha cara. Eu tenho cara de quem gosta de passar o dia no shopping? Tenho cara de quem aguenta essas gracinhas por causa de mulher? Ainda mais se tenho esse turbilhão de sentimentos desconhecidos tentando me engolir. Se ela acha que vou perder um minuto do meu dia em um lugar daqueles ela está bem enganada. Já estou cansado de ter que aguentar as loucuras dela e preciso me focar nas minhas próprias esquisitices.

Outro dia me peguei pensando se isso que eu sinto não seria apenas parte de uma pequena crise dos anos. Muitos já possuem sua vida estabelecida, relacionamentos sólidos e etc. Quando tinha meus 15 anos eu tinha essa ilusão de ser um jogador caro, famoso e reconhecido pelo meu esforço. Achei que já teria uma esposa que me ama pelo que eu sou e não pelo que eu tenho e que teríamos um filho e uma filha. Sempre me vi como pai de menina, mas um menino vai ser legal pra manter o equilíbrio na casa e eu não levar as broncas sozinho. Eu não tenho nada disso. Eu tenho um lugar bom pra morar, mas passo a maior parte do tempo sozinho. Eu tenho dinheiro e reconhecimento, mas não tenho com quem compartilhar. A solidão é traiçoeira demais. Durante muito tempo me apeguei às migalhas que recebi de pessoas aleatórias e confiei a minha vida ao meu melhor amigo e hoje estamos afastados.

Deve ser isso mesmo, apenas uma crise dos 20 anos.

Será que devo marcar um horário com a psicóloga do time? Ela parece ser bem divertida. É comum ouvir comentários dos meus colegas dizendo que estão muito satisfeitos com as consultas e que ela tem uma abordagem muito dinâmica. Não sei o que isso significa mas deve ser bom, certo? Não sou especialista em nada mas sei que dinâmico significa adaptação. Acho que podemos fazer isso dar certo. Vou ver como funciona essa coisa de consulta e onde é o consultório dela. Agora deixa eu levantar e cuidar da minha vida.