Hoje é dia vinte e quatro de dezembro e minha casa está um caos. A mamãe segue correndo de um lado para o outro da casa, gritando comigo e com Film para que ajudemos nos preparativos para a ceia de natal. O que eu habitualmente não me importaria em fazer, mas esse ano tudo está diferente. Mesmo que eu more na mesma casa desde que nasci, frequente os mesmos lugares e coma as mesmas coisas, não posso dizer que ando com as mesmas pessoas, porque Santa não está mais aqui.
E não é como se eu fosse uma pessoa que sofre por todas as pessoas que se distanciam de mim - na verdade, eu sou, sim-, mas a presença de Santa sempre foi uma das coisas que eu nunca achei que perderia. Nossas mães são amigas há milênios e nós dois crescemos com a certeza de que nunca - nunca, mesmo - iriamos nos separar.
Ainda me lembro como se fosse ontem - porque a dor ainda permanece em meu coraçãozinho frágil -, do momento em que ele anunciou que se mudaria para os Estados Unidos para estudar. Nós sempre íamos á uma vendinha perto de casa para comprar sorvete nos dias mais quentes, então corríamos para casa, tomavamos banho e nos jogavamos no chão até anoitecer, quando eu o obrigava a fazer a lição de casa para não levar bronca da professora. Mas naquele fatídico noite e quatro de novembro - sim, eu me lembro do dia, porque mamãe estava prestes a montar a árvore de natal e queria que eu a ajudasse -, Santa pediu para que comprássemos o sorvete e comecemos em sua casa, como se aquela atitude fosse algo comum em um dia de verão, com os termômetros marcando quarenta graus.
Enfim, me lembro de chegar na sala dele e tomar - sim, tomar o sorvete no copo como se bebesse água - enquanto ele andava pela sala de estar como uma barata tonta. Suas mãos suavam e sua testa parecia uma réplica perfeita das cataratas do Iguaçu e eu sabia que o calor não era o causador de todo aquele suador. Santa queria me dizer alguma coisa, mas estava enrolando.
Eu sempre soube desvendar os segredos de Santa, aquele par de olhos grandes e expressivos nunca foram tão bons em esconder as coisas e eu sempre fui muito bom em descobri-las. Mas naquele dia, eu não queria ter aquela habilidade, queria ser capaz de apagar mentes, para nunca me lembrar do quanto meu coraçãozinho doeu no momento em que ele me contou que iria embora por quatro anos.
Para adultos formandos, quatro anos não significam muita coisa, mas nós estávamos no quinto ano do ensino fundamental naquele momento. Eu não tinha estrutura física e mental para aguentar o resto daquele inferno sem o Santa. Ele era o meu protetor, o meu amuleto, o meu oxigênio.
Okay, talvez eu esteja exagerando um pouco. Obviamente eu conseguiria seguir em frente sem o Santa, mas a questão é que eu não queria. Eu conseguia vislumbrar os dias tristes que se arrastariam e as horas passando em passos de tartaruga enquanto ele estivesse do outro lado do mundo.
Era difícil demais imaginar a minha vida sem o Santa, porque eu nunca vivi um momento sem ele.
Hoje, dia vinte e quatro de dezembro, véspera de natal, fazem exatos quatro anos que ele foi embora - porque nada poderia ser pior do que vê-lo partindo na véspera de natal-. E mesmo que eu tenha sobrevivido bem - talvez eu esteja exagerando - ao ensino fundamental, ainda tenho todo o ensino médio pela frente e é impossível não desejar que Santa voltasse para a Tailândia, para que pudéssemos passar por essa nova fase juntos.
Mas faz tanto tempo que não o vejo. E se ele não puder vir porque não imagina mais como seria sua vida na Tailândia; e se ele já tem novos amigos e sequer lembra que um dia conheceu um garoto tímido chamado Earth; e se ele esqueceu o Tailandês porque nunca mais usou o seu idioma nativo?
Ah, são muitas possibilidades, e todas elas ficarão sem resposta.
Antes que eu ficasse louco, perdido em pensamentos sobre situações que não aconteceriam, desci as escadas e atendi aos chamados da mamãe para ajudá-la na cozinha. Esse ano, o natal será celebrado apenas com minha família, então não havia motivos para que mamãe estivesse tão atarefada, mas nós temos o costume de presentear os vizinhos com alguns alimentos, para que todos tenham iguais condições de celebrar essa data tão especial.

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Dear, Santa | SantaEarth
FanfictionO natal é uma data magica em que pessoas no mundo inteiro se prostram a realizar pedidos ao bom velhinho, intuindo que ele ira realizar seus maiores desejos. Nesse cenário, encontramos Earth, um garoto que sonha com o reencontro com seu melhor amigo...