• I' II put a flower in your hair •

2K 191 222
                                    


"Você consegue me escutar? Estou falando com você

Através das águas, do outro lado do profundo oceano azul

Sob o céu aberto, oh, nossa, meu bem, estou tentando"

– Lucky - Jason Mraz feat Colbie Caillat.

Quando o pugilista com aparentemente dois metros e cento e tantos quilos desaba no chão do ringue, Harry tem a sensação de que a terra treme. O homem é tão imenso que não seria surpresa caso uma cratera se abrisse exatamente onde ele caiu desacordado.

O golpe foi doloroso.

Ele pôde ouvir o som dos ossos quebrando e isso inevitavelmente refletiu em si próprio, embora não fosse necessário algo tão forte para quebrá-lo. Harry era um tipo raro de pessoa, ele não exigia esforço, por ser assim, tão facilmente destrutível.

Foi só ao nascer que descobriram o que havia de errado com ele. Portador de uma doença delicada chamada osteogênese imperfeita, o que afeta a condução do colágeno que nada mais é do que uma proteína que ajuda a fortalecer os ossos, conclusão, Harry tinha ossos tão frágeis que se quebram como vidro. Isso naturalmente lhe acarretou uma vida cheia de limitações, desde a infância e se propagando pela vida adulta. É claro que nos primeiros anos fizeram todo o possível para que ele levasse uma vida o mais próxima do normal, mas a escola era inviável, uma vez que só de andar nos corredores durante as trocas de aula era puro suicídio para o garoto. Ele tentou, mas no instante em que a primeira fratura aconteceu, Anne não resistiu em tirá-lo de lá, Harry estudou em casa, toda vez que se metia em qualquer passeio levemente "arriscado" acabava mal, com o tempo ficou evidente que ele era incompatível com os demais garotos da sua idade. Coisas simples como ir a um pub ou um passeio de bicicleta significava a morte para Harry.

E foi após tantas tentativas frustradas, em conjunto com outras tantas fraturas e meses, até anos, com idas desesperadas ao hospital com seus membros sendo literalmente torcidos e retorcidos. Sem contar a dor, depois de um tempo ele começou a temê-la e evitá-la a todo custo.

Sabendo que esta seria sua condição e não adiantando quantos tratamentos experimentais ou remédios caríssimos ingerisse na tentativa vã de achar uma cura, nada funcionava e ele teria de lidar com isso pelo resto da sua vida. A única coisa que lhe restava era tentar fazer com que passasse mais tempo dela inteiro do que repartido em pedaços.

Foi com esse objetivo em mente que ele guiou sua vida, no lugar de seguir o sonho de se tornar um chefe de cozinha, o que iria requerer aulas práticas, numa universidade de verdade, e trabalhar em uma cozinha de restaurante, agitada, com pessoas para todo lado, correndo e se batendo – o que consequentemente quebraria os ossos de Styles – , acabou abraçando seu amor pelos lírios e girassóis e quando se mudou com sua irmã para Londres abriu uma pequena floricultura que era sua maior e mais apaixonante realização. Lá não havia correria, todos sempre andavam com vagarosidade por entre as prateleiras com vasos coloridos e o principal, as rosas não podiam feri-lo, aquele deveria ser o único lugar que Harry não se sentia como um menino de cristal, mas sim alguém normal. Como qualquer outro, ele dizia a si mesmo toda vez que pisava em seu paraíso particular.

Quando não estava no trabalho ele gostava de ler, cuidar do jardim, meditar, praticar yoga no nível mais leve possível, fazer cursos online e seu único passeio era até o lugar onde ele sabia que não era o único que não podia se machucar. Os idosos recebiam Harry de braços abertos durante todas as quintas que ele surgia para jogarem cartas, xadrez, dominó, ou bingo.

Em todas as vezes as senhoras diziam a mesma coisa: não tenha medo de aproveitar a vida, se machucar é natural. O problema é que ele já havia se machucado demais e estava cansado disso.

LUCKYOnde histórias criam vida. Descubra agora