| E D A |
Existem três categorias de anjos da guarda.
1. Anjos que nascem anjos guardiões;
2. Anjos que são promovidos a anjos guardiões;
3.
E, o mais raro de todos:
3. Humanos que foram tão bons para outras pessoas que quando partem recebem a honra de se tornarem anjos guardiões.
Não sei em qual delas me encaixo, nem sei se me encaixo em alguma. O que tenho certeza é que não fui promovida. Ser um anjo guardião é a maior honra que um anjo pode receber, guardar a vida de alguém é um dom único e respeitado por todos.
Não sei se possuo esse dom, então restam duas alternativas. Ou eu nasci anjo ou fui um humano extremamente bondoso, anjos classificados - como chamamos os anjos honrados com o dom da guarda - não possuem memórias, assim também não sabem de onde vieram até que deixem o treinamento, mas, anjos que nascem anjos guardiões também não possuem. Assim como eu.
Não sei quem fui, ou se fui alguém um dia. E também não acredito que tenha sido honrada como anjo classificado. Sou atrapalhada demais para isso, eu provavelmente nasci um anjo guardião porque mesmo sem possuir memória sinto que cuidar das pessoas é a coisa certa para mim. Ainda assim, também sinto que falta algo aqui dentro.
Seyfi diz que esse sentimento irá desaparecer quando ganhar minhas asas, mas não tenho certeza.
Sabe quando humanos sentem dor de cabeça e tomam um remédio para que a dor passe? Ela passa por um tempo, mas você sabe, sente que ela ainda está ali.
Não estão tratando a causa, apenas cobrindo o foco.
É assim que me sinto na maior parte das vezes, como se estivesse entorpecida, tentando esquecer de algo que sequer lembro.
Faz sentido? Não sei. O que sei é que meu objetivo é me tornar um anjo da guarda em tempo integral. Deixar o crachá de anjo em treinamento para sempre na mesa de Leyla. O problema é que não tem sido nada fácil para mim.
Sei que muitos dos meus colegas não acreditam na minha capacidade angelical de guardar uma pessoa, eu também desconfio às vezes, mas essa incerteza sempre desaparece quando estou em missão. Mesmo que raramente dê certo.
Entretanto, é como sempre digo, tudo o que preciso é que minha bússola aponte para a direção correta. E sabe de uma coisa? Estou sentindo que dessa vez dará certo.
Tudo bem que comecei um pouco confusa. Não era para eu ser "atropelada", mas quem poderia imaginar que um carro apareceria bem ali, no meio da estrada?
Para minha sorte – chamem como quiser – a minha própria missão acabou por me resgatar. Se isto não é um sinal, então não sei o que é divindade. Até mesmo Seyfi interferiu para me ajudar. E eu achando que ele não gostava de mim.
Convencer Serkan Bolat a me levar para casa foi uma jogada divina. E agora tudo o que preciso fazer é torná-los felizes novamente e parar de pensar em como este humano pode ser a pessoa mais bonita que já vi na minha existência.
E, não estou falando apenas de olhos muito verdes e cabelos acobreados. Não estou.
Estou falando da mistura de cores que a aura dele possui. Ele é uma bagunça, e essa sensação de familiaridade pode ser porque eu também sou. Amo coisas imperfeitas, esse homem precisa encontrar um equilíbrio e estou muito feliz em ser eu a ajudá-lo.
Mesmo que para isso eu perca alguns segundos o admirando. Os olhos dele possuem o tom de verde mais bonito que já vi, de verdade. Anjos nunca mentem.
E anjos também não possuem sentimentos humanos, sendo assim eu deveria parar de pensar sobre isso.
— Tome cuidado, a escada pode estar escorregadia por conta da chuva.
Seu comentário acaba por me tirar do meu devaneio, ele está no topo da pequena escada que leva a varanda da casa enorme diante de mim. — Sua casa é muito bonita.
Digo um pouco abobalhada, com todo o verde ao redor.
— Obrigado, é agradável quando não está completamente coberta de neve.
Me apresso, pulando um dos degraus. Meu pé escorrega e me agarro no corrimão deslizando novamente os três degraus para baixo.
Meu corpo recebe o apoio firme das mãos do homem que me encara com um misto de diversão e preocupação em seus olhos.
— Acabei de dizer para tomar cuidado. — me adverte em um tom rígido.
Sorrio sem graça quando ele me ajuda a firmar os pés. — Desculpe, é que fiquei empolgada quando falou sobre a neve. O inverno é minha estação favorita, de onde venho é sempre tudo tão ameno.
Seus olhos se estreitam e seus dedos enroscam um pouco mais no meu braço, não incomoda só se torna perceptível.
— De onde veio? — Ele pisca — Achei que não se lembrasse de onde é, ou seu nome.
Sorrio e ele parece recuar um pouco. — Nunca disse isso. Me chamo Eda Christmas e vim de cima…
Ele olha para os lados. — Quer dizer do norte?
Dou de ombros, ele se prostra na minha frente e cruza os braços. Ele é um cara bem grande. — Ontem a noite você estava por perto, quero dizer a estrada em que quase te atropelei fica a poucos quilômetros daqui. Estava indo a algum lugar nas proximidades? Alguém estava te seguindo, por isso estava perambulando pela estrada no meio daquela chuva?
— Deus, eu não estava perambulando pela estrada. — ele se aproxima de mim — estava no bosque…
Digo entre um meio sorriso. Sua boca se abre, provavelmente em contestação. Não tenho culpa de ter caído no meio daquele matagal. Não ter asas dificulta muito a aterrissagem. Atrás dele avisto um vaso abarrotado de flores amarelas, flores que desabrocham perfeitamente no inverno. Flores as quais só me lembro de ter visto de longe.
Passo por ele direto para os arranjos que se perdem em tons de amarelo luz-do-sol e gema-de-ovo. — São crisântemos.
Ele se vira, intrigado pela minha animação, é que as flores são tão incrivelmente bonitas.
Seu rosto se contorce, uma sombra se instala em seus olhos, sua aura muda instantaneamente para cinza. — São minhas flores favoritas, sabia que no Japão elas são tão apreciadas que possuem até um festival?
Pauso, ele se volta para a porta dando-me as costas. — Se chama festival da…
Me interrompe. — Felicidade, é eu sei.
— Sabe? Poxa, achei que ninguém soubesse disso.
Abrindo a porta ele deixa os sapatos em uma sapateira rebaixada de madeira, e abre espaço para que eu o siga.
— Alguém me disse isso uma vez, você se lembra de um festival do outro lado do mundo, deveria tentar lembrar para onde estava indo. Vai ser mais fácil te ajudar.
— Sei para onde estava indo.
Mais uma vez ele se aproxima, os olhos se estreitam e seu rosto fica muito perto do meu. Ele tem um cheiro confuso que não consigo assimilar.
— Papai!
Uma voz doce me faz olhar além dos ombros dele. Uma menina linda de cabelos escuros corre em nossa direção e o agarra pelas pernas, atrás dela outras duas mulheres prendem a atenção em mim. A garotinha se acanha escondendo-se nas costas dele, os olhos amendoados se arregalam quando sorrio para ela. Poxa, só estou sendo gentil. Será que minha cara está suja? Ou tenho algo preso nos dentes?
Comidas terrenas são tão... comestíveis.
— Então, essa é a garota?
Pergunta a mais baixa, os cabelos batendo nos ombros. A outra de cachos escuros me analisa dos pés à cabeça.
Serkan Bolat se afasta de mim, agarra a menina e a ergue nos braços, ela é tão mais bonita que na fotografia que observei dela. Suas bochechas são rosadas e a timidez dá a ela um certo charme inocente.
— Sim. — diz com um pedido silencioso para que o siga. O cômodo em questão possui uma lareira e um sofá enorme, mas algo não parece correto.
É dezembro, no caminho para cá dezenas de luzes, e árvores, e adornos natalinos encheram meus olhos. A casa, no entanto, apesar de linda, não possui sequer um enfeite. Nada.
Nem mesmo uma luzinha piscando em vermelho e verde na entrada. Isso é muito desanimador. É isso que falta, falta cor, provavelmente um pouco de vida também.
— Melek, Ayfer… esta é a senhorita Christmas, vai ficar conosco por um tempo.
— Senhoria o que?
Diz a mais baixinha, Melek se não estou enganada. Dou um passo em sua direção e lhe estico a mão. — Christmas, Eda Christmas. — hesitante ela segura minha mão, sorrio enquanto a balanço. — É um enorme prazer conhecê-la, Melo… — balanço a cabeça, confusa por um instante. — Desculpe… quis dizer Melek.
Seu rosto se torna branco como papel e ela se afasta rapidamente.☃️🦌🔔🎄🎁🌟
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Um anjo chamado Natal
Hayran KurguÁs vezes nosso coração se parte em tantos pequenos pedaços que reconstrui-lo se torna cansativo ao ponto que o melhor pode ser deixar para lá. Isolar-se e deixar que o mundo gire sem que você participe dele. Mas, por mais doloroso que pareça resist...