Ele finalmente tinha conseguido.
Tinha finalmente ido para a cama com a mulher perfeita. Ela não era a mulher ideal: era a mulher perfeita. Para ele, ela era perfeita. Ele olhou para o lado, enquanto ela descansava, os olhos fechados, os cabelos ruivos caindo pelo pescoço, a respiração tranquila... Ela era linda. Inacreditavelmente linda.
Não tinha certeza nem como conseguiu esse feito, como ela estava lá. Depois de anos, conseguiu ir pra cama com a mulher dos seus sonhos. Ele havia sido apaixonado por ela durante anos, e até chegaram a namorar por algumas semanas, até que por conta de um rumor, se separaram. E, por muitos anos, ele foi atrás de outras coisas, certo de que a mulher perfeita não era alcançável: se casou - e se separou -, teve dois filhos incríveis, se formou, trabalhou, comprou seu primeiro carro, e enquanto isso, ele acompanhava de longe a vida dela. Ela também havia se casado, duas vezes, mas não havia tido filhos, ela também tinha se formado, não tinha comprado carro, não gostava de dirigir, mas tinha comprado um apê de dois quartos.
O reencontro aconteceu depois de muitos anos, em uma festa de Ano Novo, que ele foi convidado e não sabia nem se ia, mas mudou de ideia quando os filhos foram passar o ano em Porto de Galinhas com a mãe. Bom, ficar em casa sozinho pra quê, né. Ele chegou e não sabia que ela estava lá. Na verdade, ele não sabia nem quando ela chegou, mas ele foi pra fora da casa, e sentada em uma cadeira de metal, ela se virou rapidamente. E sorriu. O sorriso mais lindo. E se levantou e foi cumprimentar ele, um abraço de um braço só, o cigarro aceso na outra mão. Um abraço apertado, aconchegante, longo.
- Oi, tudo bem com você? - Ele perguntou, seu coração acelerado.
- Tudo! - Ela respondeu e ficou em silêncio. Ele admirava ela, usando um vestido cinza, decotado, que valorizava suas formas. O fato de ela ser gorda só a deixava mais linda - E com você? Quanto tempo... Gostei da barba!
- Eu estou bem. Saudades de você!
- E eu de você...
Aquilo foi tudo o que ele precisava, aquela palavra preciosa. Saudade. Passaram o resto da noite conversando, quase como se estivessem em seu próprio mundo. A meia-noite não demorou para chegar. E, ao mesmo tempo, demorou muito tempo. Era um misto de felicidade, ansiedade, carinho e tesão. Era o fim de um ciclo que se encerrava com novas promessas, de tempos melhores. Se beijaram longamente, com ânsia, com vontade, com desejo. Se beijaram apaixonadamente. Se abraçaram, em silêncio, o som ao redor abafado entre os braços do abraço. Ela cheirava a perfume de pitanga, suor, cigarros e cerveja, uma combinação que, por algum motivo, fazia sentido na cabeça dele.
- Você é lindo, sabia. - Ela sussurrou enquanto eles se embalavam em música nenhuma.
- Você é mais linda ainda.
Havia um silêncio naquele momento, naquela cacofonia de sons ao redor deles, dos gritos, comemoração, música e fogos de artifício. Ele não se lembrou de muita coisa depois disso, só do sorriso dela. De segurar na mão dela durante a noite, sentados nas cadeiras de metal, enquanto ela fumava. Eles trocaram copos, beijos, abraços e carinhos.
Já era mais de meio-dia quando ele acordou e olhou para o lado e viu a mulher perfeita olhando para ele, os olhos inchados de quem não dormiu direito, os cabelos longos e ruivos embaraçados. O corpo nu, seu cobertor por cima.
- Bom dia... - Ele sussurrou.
- Bom dia. - Ela respondeu, sorrindo, um sorriso ainda cansado. Se abraçaram, ele sem acreditar que estava sentindo o corpo nu e quente dela. - Eu acordei com tesão... - Ela disse enquanto mordiscava o ouvido dele.
Ela era a mulher perfeita. Ela não era a mulher ideal. Não tinha o corpo ideal. Não era nem mesmo uma boa pessoa metade do tempo, palavras dela. Estava acima do peso. Muitas vezes era arrogante e estúpida. Era bonita, sim, mas havia outras. Não sabia o que queria do futuro. Ela era tão imperfeita quanto qualquer outra pessoa. E ele nunca mais queria estar com outra mulher na vida dele.
