Prólogo parte II - Ódio a primeira vista

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Era uma segunda-feira e o expediente do hospital estava apenas começando quando um dos pacientes do quarto 331 gritava pelos corredores que a morte lhe cairia bem e que ele esperava uma recepção calorosa da mesma, nada fora do comum. "Eu quero ir, quero voar com os pássaros, me libertar desse peso que me prende a terra", dizia o homem. Todos que trabalhavam na ala psiquiátrica do hospital eram, por natureza, solitários, alguns mais, outros menos, mas todos sem exceção eram pessoas com pouca companhia no final da tarde, esse paciente não se diferenciava dos demais.

Os cuidadores também sofriam com essa realidade, a solidão das pessoas deveria ser considerada o mal do século, com toda a certeza. Entretanto, em meio ao caos e a baderna causada pelo senhor que filosofava com a morte, um homem se destacava, aquele que possuía o olhar brilhante e animador, aquele que acolhia a todos com o maior carinho, Jeon Jeongguk.

Ele era um garoto de ouro, diziam os pacientes daquela ala, o brilho se estendia por onde o mesmo passava, nada nunca o colocava no chão, nada era capaz de mudar suas feições felizes e acolhedoras, pelo menos até este momento.

Quando o relógio da recepção avisou que eram 14 horas, um jovem de cabelos castanhos adentrou o salão, um segurança em cada lado, seu olhar era perturbadoramente atrativo, como se todas as luzes do lugar se apagassem e apenas onde ele olhasse se iluminava. Kim Taehyung andou até a outra ponta do corredor, entrando em uma sala cheia de espectadores prontos para dar-lhe atenção, e assim foi feito. No momento em que todos se calaram, o jovem se apresentou.

- Boa tarde, vocês já devem saber meu nome então irei pular apresentações. Como devem ter sido informados, estou aqui para ler poesia, isso ajudará na recuperação de todos, dando-lhes uma provável nova perspectiva de vida.

Após a leitura, o Kim se dirigiu a saída, sem se despedir ou olhar para os lados. Dessa forma, acabou por "atropelar" um dos cuidadores do hospital.

- Ei? Tome cuidado por onde anda, pirralho.

- Cuidado? Você literalmente se enfiou na minha frente.

Depois de encarar o homem à sua frente e seus dois seguranças, Jeongguk achou melhor acabar com a conversa por ali. Limpou a roupa e se despediu, como se não tivesse sequer cruzado com o moreno, fazendo assim com que o mesmo ficasse verdadeiramente ofendido.

- Quem ele pensa que é para me ignorar assim? Esses seus empregados não são como ultimamente, não respeitam os superiores, Joonie - exclamava o Kim para o diretor do hospital.

- Taehyung, você também é um funcionário daqui agora, também deve respeitá-lo, o garoto é uma boa pessoa, pare de ser mal humorado e o deixe fazer o seu trabalho.

- Esse é um fato que só você sabe, e não me chame de funcionário, soa mal. Estou apenas fazendo um trabalho comunitário obrigatório, Namjoon.

- Certo, mas ainda assim é um funcionário assim como Jeongguk, trate-o com respeito, por gentileza.

- Espero não ter que passar por ele novamente, não tive uma boa impressão.
Jeongguk saía de manhã às cinco horas, ia para o trabalho até o fim de sua hora extra,voltando diretamente para casa, tinha essa rotina de segunda a sábado. Domingo era o único dia que saía com seu irmão Do Yun, geralmente os dois iam ao parque e ficavam até tarde lá, tomando um sorvete, fazendo piquenique e brincando com o cachorro.

Os dois moravam juntos desde sempre, nunca houve ninguém além de Jeongguk e Do Yun. Apenas no passado, há quinze anos, quando a mãe dos dois ainda era viva e os três possuíam a melhor convivência que alguém é capaz de imaginar.

Os irmãos vinham de uma família simples, a mãe de Jeongguk trabalhava dois turnos para poder alimentá-los, mas sempre tirava uma folga no domingo para ficar com seus filhos, independente do quanto precisasse de um dinheiro extra. Eles também iam ao parque, faziam piquenique e passeavam com Dodds, o husky dos olhos azuis da família. A mãe dos meninos sempre fora aquelas mulheres que dá de tudo e um pouco mais pelos filhos, não existia no mundo alguém mais carinhoso que ela, mas infelizmente nem toda história tem o rumo que merece. Uma fatalidade levou a senhora Ha Yun a falecer, o motivo da morte era desconhecido e, infelizmente, só havia uma testemunha. Seu filho Do Yun, um garoto diagnosticado com autismo aos cinco anos, tinha dificuldades de se comunicar, por esse motivo a única coisa que o mesmo declarou no depoimento da morte de sua mãe era a palavra "borboletas", de forma repetitiva e consistente.

Por ser uma pessoa pobre, a polícia local não dava importância suficiente ao caso para analisá-lo mais profundamente, então após alguns meses o arquivo foi arquivado e o caso havia sido dado como encerrado, a desculpa era que não haviam provas suficientes para prosseguir com a busca por respostas.

Seu irmão mais velho, Jeongguk, se transformou no responsável legal pelo pequeno e traumatizado Do Yun, mas isso não significava que o mesmo tinha maturidade o suficiente para criar uma criança, principalmente alguém com necessidades especiais como Do Yun.

Todas as noites o pequeno Jeongguk pensava no porquê de não ter sido ele no lugar de seu irmão, assim tudo estaria resolvido, ele não teria que ter crescido com essa dúvida, ele poderia descansar em paz, poderia ficar em um lugar e chamá-lo de lar, coisa que ele não tinha capacidade para fazer desde que arrumara um emprego.

Suas relações com as pessoas não duravam muito, tudo era motivo para que ele se afastasse das pessoas ao seu redor, menos um amigo e seu irmão, os quais ele ainda assim mantinha certa distância, não falando muito de si e de seus problemas.

Jeongguk era na dele, com um olhar brilhante, chamativo e acolhedor, uma boa companhia e um ótimo ouvinte, conselheiro dos bons, mas nada presente, ele tinha medo de se relacionar com os outros, tinha medo de manter alguém por perto, por isso não o fazia.

Quando esse jovem hospitaleiro bateu os olhos em Kim Taehyung, sequer o conheceu, não fazia ideia de que o mesmo era um renomado escritor e sabia menos ainda o motivo de o mesmo estar ali, naquele hospital público de uma pequena cidade que fazia fronteira com Seul. Ele fora chamado até a sala do diretor do hospital, cheio de dúvidas e preocupações, afinal o que Namjoon precisava falar com ele?

Ao chegar, Jeongguk deu três batidas na porta e esperou que a mesma fosse aberta.

- Bom dia, senhor, o senhor deseja falar comigo?

- Bom dia, Jeon, isso mesmo, sente-se.

O moreno, preocupado com a formalidade, levou alguns segundos para dar seu primeiro passo, logo em seguida se sentou e olhou fixamente para seu chefe, olhares ansiosos foram trocados e logo em seguida a conversa se iniciou:

- Fiquei sabendo que você e Taehyung trocaram algumas palavras no corredor ontem.

- Desculpe, senhor, mas quem é Taehyung?

- Como assim "quem é Kim Taehyung"?

- Eu deveria conhecê-lo?

- ...

- ...

- Enfim, ele é um escritor com renome internacional e está aqui para ajudar com a psicoterapia, eu espero que vocês não tenham problemas daqui para a frente.

- Nós sequer trocamos algumas palavras, mas sim eu entendo, farei o meu trabalho e nada além, me desculpe pelo inconveniente senhor.

Assim, Jeon saiu da sala, o moreno não costumava se meter em confusões, era muito na sua para isso. Então, como sempre, ficaria calado sem fazer reclamações sobre a suposta acusação do tal escritor, apenas engoliu aquela mentira calado e pediu para que os santos lhe dessem a paciência necessária para lidar com ele nos corredores, esperando do fundo do coração que não precisasse passar disso, apenas a ideia de revê-lo era entristecedora.

Taekook - It's okay (not) to be normal Onde histórias criam vida. Descubra agora