VIEUX CARRÉ

3/4

Nova Orleans, EUA, 1947.

  Uma viagem de trem pode passar rápido às vezes, quando a vista da janela distrai ou quando os bancos são confortáveis o suficiente para que o companheiro sono chegue mais perto. Quando se está absorto em pensamentos relativos a um amor indeferido da Carolina do Sul, a viagem passa voando, e o barulho da locomotiva é baixo dentro da cabeça barulhenta de Yoongi.

  Não era o primeiro trem que pegava, com certeza não seria o último, e não estava contando quantos tinham sido desde o número um. Tinha saído do Mississipi recentemente após fazer alguns bicos e conseguir dinheiro suficiente para pagar os dias de sua estadia numa pensão baratinha, desfrutar da cidade na qual tinha desembarcado e comprar a passagem para Louisiana.

  Estava escuro lá fora, mas a paisagem que via era o maior rio de seu país, que nascia em Minnesota e desaguava no Golfo do México. E apenas sabia disso por conta do folheto de viagem que carregava consigo desde o primeiro trem. Conseguiu saber, também, que Nova Orleans já era bem longe de sua casa, mesmo que sua mente parecesse estar lá, revivendo a mesma cena a todo momento de ócio.

  Carregava consigo o mapa de bolso que sabia quase decorado por um motivo parecido pelo qual fugiu da Carolina do Sul: esquecer o grande amor de sua vida, aquele que fazia tanto barulho dentro de si.

· · • • • ✤ • • • · ·

  Quando o trem parou já era tarde da noite. A pequena bagagem que Yoongi levava consigo consistia numa bolsa de tecido com poucas mudas de roupa que revezava durante a semana e lavava em qualquer tanque quando ficavam muito empoeiradas ou suadas. Também carregava, dentro de um saquinho costurado pelas mãos do amor de sua vida, os dois anéis que costumavam usar juntos e sozinhos - um pequeno segredo romântico, e não era o único, nem a única lembrança de momentos felizes.

  No bolso, tinha uma carteira velha com todo o seu dinheiro, um documento e uma linda e única fotografia de seu amor, num dia de genuína felicidade ao seu lado.

  Yoongi verificou se todos aqueles essenciais pertences estavam consigo na hora de sair da locomotiva e, confirmando, conheceu Nova Orleans com os olhos e os pés. Depois de tudo acontecer, tinha se tornado alguém noturno, mesmo que também adorasse os dias.

  No primeiro dia naquela cidade, entrou num pequeno hotel na madrugada, conversou, mercante, com o homem que o atendeu e aparentava ter sua idade, e disse estar disponível e à procura de qualquer emprego de até quatro semanas. Ao acordar no dia seguinte, o rapaz o avisou de uma senhora precisando de ajuda temporária em sua padaria, enquanto seu único funcionário ajudava a esposa com uma criança recém-nascida em casa.

  Não hesitou ao ir se apresentar, não muito longe dali, e começou a trabalhar no mesmo dia. Demorou dois dias para se acostumar com o ritmo do trabalho. Graças a ele, conheceu uma boa parte daquele bairro em cima de uma bicicleta com enormes cestos com pão fresquinho, quando saía para vender na rua, e pode ver todos os bares aos quais já planejava visitar.

  Ele sempre chamava Max, o homem do hotel, para um dos barzinhos mais próximos dali, mas ele nunca ia, justamente por ter que trabalhar durante a noite e madrugada. Max era quase o dono do espaço, então mesmo que não estivesse trabalhando na recepção, estava quase sempre ocupado.

  Passou quase duas semanas indo quase todos os dias ao bar ao qual sempre chamava Max. Não gostava de beber até ficar embriagado, apenas do queimor do álcool o fazendo sentir alguns órgãos quando o colocava na boca - assim como água gelada, ainda que fossem antítese.

  Nova Orleans era uma cidade bonita e iluminada, mesmo que Yoongi estivesse no subúrbio, já que era inteligente o suficiente para saber que o centro custava mais. Via, quando estava anoitecendo, alguns estabelecimentos fecharem as portas e apagarem as luzes enquanto a outra parte, a maioria, fazia o contrário. Hospedagens, casas de show e bares era o que via em maior número naquela parte da cidade.